segunda-feira, 3 de maio de 2010

Fundos passam por onda de fusões, cisões e retirada de patrocinadores

Na esteira de negócios entre as empresas patrocinadoras, 62 entidades e planos de previdência complementar se reestruturaram desde 2006
Movimento, que deve se acentuar neste ano, traz incertezas aos participantes dos fundos; governo quer agora regular essas situações
A onda de fusões e cisões de empresas que dominou a economia nos últimos anos também invadiu, sem alarde, a indústria dos fundos de pensão.
Levantamento obtido pela Folha mostra que 62 entidades e planos de previdência complementar foram autorizados a se reestruturar desde 2006, na esteira dos negócios fechados no cenário empresarial.

Com o elevado número de operações envolvendo os fundos, o governo pretende regular esses movimentos do setor, pois hoje a legislação de previdência complementar não trata claramente do assunto.

As situações são resolvidas de forma pontual, e a falta de regras tem gerado insegurança jurídica principalmente entre os trabalhadores que participam do sistema. O setor de fundos de pensão abrange hoje 2,5 milhões de pessoas, entre funcionários ativos e aposentados.

Nos próximos meses, o Conselho Nacional de Previdência Complementar -instância regulatória do sistema- deverá discutir e editar uma resolução para normatizar fusões/incorporações e cisões de fundos de pensão e planos de benefício. Será uma espécie de manual para o setor. "A legislação em vigor é de 1988 e necessita ser revista", afirma o secretário de Políticas de Previdência Complementar, Murilo Barella.

Com a perspectiva de crescimento forte da economia, espera-se um movimento disseminado de reestruturação nos diferentes setores de atividade, causando reflexos no sistema de previdência complementar.

O secretário explica que o efeito colateral que pode (ou não) ocorrer no contexto das fusões e cisões é a retirada do patrocínio por parte das empresas. "Não é um assunto trivial. Imagine: eu, que era funcionário de uma empresa ou já estava aposentado, como fica minha situação? Eu contribuí o tempo inteiro e, de repente, perco o patrocínio da empresa. E aí, como fica?", diz Barella.

Pico
De acordo com o levantamento das operações, entre 2003 e 2005, nove entidades e planos tiveram suas propostas de fusão/incorporação e cisão aprovadas pela então Secretaria de Previdência Complementar. De 2006 a 2009, essas operações pularam para 62.

O pico desse movimento ocorreu em 2008, quando a economia teve expansão de 5,1% do PIB (Produto Interno Bruto). Naquele período, foram registrados 19 casos de reestruturação de fundos e planos. Embora no ano passado tenham sido aprovadas 16 operações, o número de pedidos apresentados ao governo chegou a 32 -16 processos ainda estão em análise.

"O que acontece na economia repercute nos fundos de pensão. Se a gente pegar a fusão da Oi com a Brasil Telecom, a nova empresa optou por não manter duas ou três entidades separadamente [Fundação Atlântico, BrTPrev e Fundação 14]", disse o diretor-superintendente da Previc (Superintendência Nacional de Previdência Complementar), Ricardo Pena. Nesse caso, houve centralização da gestão na Atlântico, que administra hoje cinco planos diferentes.

Barella cita outro exemplo. Em 2008, o Banco do Brasil acertou a compra da Nossa Caixa. Junto com o banco, herdou o Economus, fundo de pensão dos funcionários da instituição.

Embora o BB tenha assumido o papel de patrocinadora do Economus, a situação ainda é indefinida para os mais de 15 mil participantes e assistidos da entidade.
"Ainda é uma situação embrionária", explicou o presidente do Conselho Deliberativo do Economus, Sérgio Iunes.

Mudança em fundo pode afetar projeto de aposentadoria
No caso de fusões, se houver retirada de patrocínio, resta aos participantes reduzir o valor do benefício ou liquidar o fundo.
Ausência de regras para normatizar fusões e cisões no setor tem feito com que muitos casos acabem na Justiça, diz diretor da Previc.
Em 1997, o Banerj (Banco do Estado do Rio de Janeiro) foi privatizado, e a instituição foi incorporada pelo Itaú. A fusão resultou na liquidação do Previ-Banerj, o fundo de pensão dos funcionários do banco estadual, os planos de benefícios foram encerrados e os recursos, devolvidos aos participantes.

O caso serve como exemplo do que pode acontecer com fundos no processo de fusão ou cisão de empresas, quando há retirada do patrocínio.

No sistema de previdência complementar fechado, os trabalhadores contribuem para as entidades com o objetivo de engordar sua aposentadoria. Já as empresas optam por oferecer esse benefício ao funcionário dentro de sua estratégia de RH. Dessa forma, passam também a recolher contribuições, gozando de benefícios tributários.

Mas, com a retirada do patrocínio pela empresa, os trabalhadores passam a levar o fundo nas costas. Sobram a eles poucas alternativas, como aumentar sua contribuição para manter o mesmo valor de benefício no futuro, reduzir o valor de seus benefícios ou liquidar o fundo de pensão (nesse caso, têm direito às contribuições feitas ao longo dos anos).

A saída do patrocinador, no entanto, não ocorre somente nos casos de reestruturação. Também pode ser fruto de dificuldades financeiras do patrocinador ou opção da empresa em sua política de pessoal.

Na avaliação do diretor-superintendente da Previc, Ricardo Pena, a falta de regras para normatizar fusões/cisões de fundos tem feito com que muitos casos acabem na Justiça.

O secretário de Políticas de Previdência Complementar, Murilo Barella, lembra que todos os casos de reestruturação autorizados nos últimos anos tiveram como foco os participantes. "Tudo foi feito de forma pontual, considerando que isso envolve diferentes relações de trabalho, com diferentes impactos previdenciários, com variados níveis de contribuição e características de planos e populações diferentes", disse.

Pena acrescenta que, junto com a regulação do processo de fusão e cisão, o governo deverá rever também as normas para a retirada de patrocínio. "A legislação atual estimula a retirada", disse. Em 2007, ocorreram 82 retiradas de patrocínio. Em 2008, caíram para 61, minguando para 28 no ano passado.

A incorporação de uma instituição, no entanto, não leva necessariamente a uma fusão ou ao fim das entidades de previdência complementar. Apesar de o Besc (Banco do Estado de Santa Catarina) ter sido adquirido pelo BB em 2008, o fundo dos funcionários do antigo banco continuou existindo de forma independente, patrocinado pelo BB e outras empresas.
Fonte: Folha de S.Paulo (02/05/2010)

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