sexta-feira, 12 de abril de 2013

Fundos de Pensão: Oito mil aposentados da Varig podem ficar sem pensão a partir de junho. Fundo Aerus está sob intervenção desde 2006


O Aerus (fundo de pensão de empresas do setor aéreo, entre elas a Varig) completa hoje sete anos de intervenção judicial. São 22 mil pessoas que contribuíram com o fundo para ter um futuro digno e que desde 2006, quando foi decretada a intervenção, não recebem o que lhes é devido. A pior situação é a dos 8.170 participantes do chamado plano 1 da Varig, que só têm asseguradas suas aposentadorias até junho. Muitos contraíram dívidas para pagar contas básicas, como telefone e luz, e dependem de parentes e amigos para custearem tratamentos de saúde.
A esperança para essa legião de aposentados e pensionistas é que duas ações que correm na Justiça tenham decisões favoráveis a eles. Uma delas está com o presidente do Superior Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, desde fevereiro. Nela, sindicatos e associações do setor pedem que a União assuma o pagamento das aposentadorias.
A ação foi ajuizada em 2004 e teve o seu pedido de tutela antecipada reconhecido dois anos depois. Após longa discussão jurídica, o STF condicionou, em 2010, a aplicação da tutela à decisão de primeira instância. Isso aconteceu em julho de 2012, quando o juiz Jamil Oliveira, da 14ª Vara Federal de Brasília, proferiu sentença favorável aos aposentados, mas a Advocacia Geral da União (AGU) derrubou a decisão em outubro, o que fez o caso voltar ao STF.
A outra ação tem como autor o próprio Aerus. O fundo pede que o governo federal assuma o pagamento ao fundo de pensão da taxa de 3% que incidia sobre a venda de passagens domésticas nacionais. Essa taxa era uma das fontes de recursos do Aerus quando ele foi criado, em 1982. As outras eram os trabalhadores e as empresas patrocinadoras, das quais Varig e Transbrasil eram as principais.
A taxa, que seria válida até 2012, foi revogada nos anos 90 pelo antigo Departamento de Aviação Civil (DAC) — hoje o setor é regulado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Estima-se que o pagamento retroativo some R$ 7 bilhões. A ação foi indeferida em primeira instância e está no Tribunal Federal Regional de Brasília. Os aposentados fazem hoje protesto na Cinelândia, no Rio, para chamar atenção para sua causa.
— Quando o fundo foi criado, a base atuarial considerava a taxa de 3%. De uma hora para outra, isso nos foi retirado. Estamos cada vez mais longe de tudo o que construímos — diz Thomaz Raposo, presidente da Associação dos Participantes e Pensionistas do Aerus (Aprus).
Protesto na Cinelândia
Além da extinção da taxa, as contribuições da Varig escassearam. Até que, em 2005, a aérea entrou em recuperação judicial e foi dividida em duas. A parte boa foi vendida em 2006 à sua ex-subsidiária VarigLog — então controlada pelo fundo americano Matlin Patterson — e, no ano seguinte, à Gol.
A parte podre, rebatizada de Flex, teve a falência decretada em 2010, deixando dívida com o Aerus de R$ 3 bilhões. Nesse meio tempo, a Varig fez 21 renegociações de dívida com o fundo. Todas aprovadas pela antiga Secretaria de Previdência Complementar, hoje Previc, ligada ao governo federal. Por isso, o juiz Jamil Oliveira entendeu que a União deve assumir os benefícios.
— Em 12 de abril de 2006 começou o drama, foi o dia fatídico. Passei a receber 70% do que recebia, e hoje recebo pouco mais de 10%. É uma tragédia silenciosa — lamenta o ex-comissário da Varig Paulo Resende, de 64 anos, que contribui com o Aerus desde 1983.
Casado e pai de dois filhos que ainda vivem com ele, Resende recebe R$ 592 mensais, mas deveria receber R$ 4.716. Do INSS ganha ainda R$ 3.400 por mês, mas quase R$ 1 mil estão comprometidos com empréstimos consignados (com desconto em folha). Tem também dívidas com o Banco do Brasil e com o Itaú-Unibanco, contraídas para quitar contas atrasadas.
Para dar sobrevida ao Aerus, seus interventores reduziram o pagamento devido aos participantes a partir de 2006. Dos 22 mil, 17 mil são ex-funcionários da Varig, herdeiros ou cônjuges. Quem está no plano 1 da Varig recebe, em média, 10% do valor que deveria receber. Os aposentados do plano 2 recebem cerca de 60%, segundo José Pereira, interventor do fundo. Se todos os participantes recebessem o que lhes é devido, a folha atingiria o patamar de R$ 23 milhões mensais.
O desdobramento em dois planos foi feito em meados dos anos 90. A diferença é que, no plano 1, o contribuinte sabia quanto ia receber no futuro. No plano 2, o benefício poderia variar de acordo com o rendimento das aplicações. Apesar de mais arriscado, as 9.190 pessoas do plano 2 estão em melhor situação. Há garantia de pagamento até 2015.
Liquidação do fundo à vista
Segundo Pereira, a previsão de fim de pagamento para o plano 1 era abril, mas ele conseguiu vender algumas ações e dar fôlego aos participantes por mais dois meses. O interventor tem mais algumas ações e dois imóveis que, se forem vendidos, poderiam ampliar a sobrevida do plano 1 até o fim de 2013, e a do plano 2, até 2016. Depois disso, o pinga-pinga cessa de vez.
— Já estamos avaliando liberar o dinheiro de uma só vez e liquidar alguns planos.
O ex-comissário da Varig José Carlos Bolognese, de 65 anos, é outra vítima da derrocada da aérea. Ele contribuiu com o Aerus por 20 anos, até 2002, quando se aposentou. Deveria receber R$ 4.800 mensais, mas apenas R$ 930 são depositados em sua conta a cada mês. Do INSS, recebe ainda R$ 1.600 por mês, insuficientes para pagar o plano de saúde. Sua mulher se acidentou e rompeu o ligamento de um dos joelhos. Só consegue ir às sessões de fisioterapia porque amigos se dispuseram a arcar com os custos.
— A Varig quebrou, e os trabalhadores é que pagam o pato — queixa-se Bolognese.
Fonte: O Globo (12/04/2013)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

"Este blog não se responsabiliza pelos comentários emitidos pelos leitores, mesmo anônimos, e DESTACAMOS que os IPs de origem dos possíveis comentários OFENSIVOS ficam disponíveis nos servidores do Google/ Blogger para eventuais demandas judiciais ou policiais".