quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

TIC: Para evitar competição, Teles voltam a recitar seu velho mantra "comprar, fatiar e eliminar"

A luta das operadoras de telecomunicações para evitar o aumento da competição e preservar o status quo encontra eco na história brasileira recente do setor, quando concorrentes se uniram na tentativa de comprar a Embratel e fatiá-la, para que ela não ficasse integralmente nas mãos de uma rival.

Desde o segundo semestre do ano passado, pessoas ligadas às operadoras de telefonia falavam sobre conversas em andamento para que Oi, América Móvil (dona da Claro, Embratel e Net) e Telefônica / Vivo formassem um tipo de consórcio para comprar a TIM, controlada pela Telecom Italia, dividindo depois a companhia em três partes.

Com as informações extrapolando as fronteiras do Brasil até a Europa, na primeira semana de janeiro a Telefónica de España teve de se explicar à reguladora do mercado de capitais da Itália (Consob, na sigla em italiano). A companhia negou que haja algo concreto sobre o assunto.

A venda da TIM pode ser uma alternativa para a Telefónica exercer, de janeiro de 2014 a 2015, a opção de aumentar para até 64,9% sua fatia na Telco, holding que controla a Telecom Italia e, assim, assumir o controle desta, sem ferir as regras competitivas no Brasil. O problema é que ao dar as cartas na Telecom Italia, a Telefónica passaria a ser dona da TIM e da Vivo. A atual regulamentação brasileira não permite o acúmulo de licenças do mesmo serviço.

A princípio, a Telefónica teria de fazer uma "escolha de Sofia", para lembrar o romance de Willian Styron, em que uma mãe polonesa tem de escolher entre um de seus dois filhos para ser morto no campo de concentração durante a Segunda Guerra. No caso da Telefónica, a decisão seria desistir da TIM ou da Vivo. Embora pareça evidente que o "filho" preferido é a Vivo, os acionistas resistem em optar porque o outro também tem grande valor. Daí, a busca de saídas.

Vender a Vivo não parece ser uma opção colocada à mesa. A empresa é líder no mercado de serviços móveis, com 28,7% do mercado e 76,6 milhões de clientes de um total nacional de 270,5 milhões em novembro, segundo a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).

Em segundo lugar está a TIM, com 27% e 73 milhões de usuários, seguida pela Claro, com 25% (68,2 milhões), e a Oi, com 18,5% (50 milhões). O restante é dividido entre operadoras menores como CTBC (0,36%), Nextel (0,09%), Sercomtel (0,02%) e outras.

A alternativa, então, seria vender a TIM. Mas o grupo italiano tem repetido que a empresa é estratégica. Analistas italianos diziam, nos últimos dias, que a TIM não poderia valer menos de € 15 bilhões. Sua venda poderia ser acertada com uma companhia que ainda não opera serviços móveis no Brasil. Essa solução é vista com simpatia pela Anatel e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que preferem a entrada de um novo competidor, o que manteria quatro grandes operadoras no jogo.

Mas essa visão não é compartilhada pelas companhias. Se a Telefónica tiver de se desfazer da TIM, por que não manter uma parcela do negócio para si e dividir o restante com os atuais concorrentes, acalmando os ânimos? É uma conversa de bastidores. Ao mesmo tempo em que atenderia à questão regulatória, o grupo espanhol não abriria mão completamente do segundo maior negócio de telefonia móvel do país, que seria extinto, mas reabsorvido. Para o órgão antitruste, essa partilha é possível e preocupante.

Os principais ativos da TIM que poderiam ser divididos são: os clientes, a faixa de frequência, os equipamentos e a infraestrutura. Como todas as teles já têm redes e equipamentos, esse ponto seria o menos problemático. Mas a faixa de frequência requer estudos e algumas mudanças nas regras. Cada empresa pode deter uma quantidade predeterminada de espectro (medido em blocos de megahertz) para operar seus serviços, e todas já estão próximas ao limite. Uma análise por área geográfica pode indicar onde poderiam ser somados mais blocos de frequência por empresa, aliando a isso o interesse estratégico de cada uma delas.

A divisão da base de clientes também não é fácil. Ninguém pode obrigar o usuário a ir para uma operadora que ele não quer. E mesmo que sejam oferecidas vantagens inicialmente, elas tendem a desaparecer depois que as empresas forem integradas em busca de sinergias. Terminado o prazo de fidelidade de contrato e sem vantagens relevantes, os clientes legados também poderiam desaparecer.

Mas, enquanto isso não acontece, o que está na mesa de negociação é a divisão de quase 73 milhões de clientes entre três grupos. Se a partilha fosse por igual - o que não é possível, porque depende das regiões que caberiam a cada empresa e da concentração de usuários nelas - seriam adicionados mais de 24 milhões de clientes às bases de Vivo, Claro e Oi. Eliminando-se a segunda maior operadora, o alto do ranking seria recomposto, com a Vivo ainda no topo, com mais de 100 milhões de clientes, seguida pela Claro e Oi.

Os espanhóis já estiveram no Cade, em dezembro, tentando convencer o órgão antitruste que, mesmo sem a TIM, haveria disputa entre Claro, Vivo e Oi. O Proteste, de proteção aos consumidores, não pensa assim. Para o instituto, o acordo diminuiria a competição, reforçando a queda de qualidade dos serviços e mantendo as tarifas em alta.

A união de rivais para tentar eliminar um concorrente no Brasil ganhou destaque em 2004, quando representantes das três concessionárias de telefonia fixa da época (Brasil Telecom, Telefônica e Telemar) se uniram ao grupo Geodex e criaram o consórcio Calais. A Geodex era controlada pelo Goldman Sachs, Credit Suisse e Unibanco. O objetivo da aliança era comprar a Embratel e fatiá-la. A Geodex ficaria com as outorgas de longa distância e com a Vésper, que era a empresa-espelho de telefonia fixa da Telefônica, no Estado de São Paulo, e da Telemar, em 16 Estados. As três teles do consórcio ficariam com a parte de dados e satélite da Embratel.

Após muito debate no Congresso Nacional, no Ministério das Comunicações e até na Justiça dos Estados Unidos, o consórcio perdeu o negócio. A Telmex, do megainvestidor mexicano Carlos Slim Helú, adquiriu a Embratel em julho de 2004 da americana MCI. Em 2007, a Embratel passou a fazer parte da Telmex Internacional, que foi incorporada pela América Móvil, também de Slim, em 2010.

Fórmula semelhante de acordo entre rivais para comprar, fatiar e eliminar um concorrente volta a ser ensaiada pelas mesmas empresas da década passada, embora algumas tenham mudado de nome devido a aquisições e integrações. Só que agora o alvo são os serviços móveis.

O resultado de uma equação como essa, se seguir adiante, seria bem diferente do que a Anatel vinha defendendo até o segundo semestre de 2013. Em vez de três operadoras, a agência reguladora vinha repetindo que o melhor seriam quatro ou cinco grandes teles oferecendo serviços no país, o que pressupõe a permanência da TIM como uma empresa integral.
Fonte: Valor (15/01/2014)

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