sábado, 22 de novembro de 2014

Fundos de Pensão: Blogueiro e assistido da Previ (BB) contesta parecer da Previc que rejeitou Ação Cível Pública (ACP) proclamando a Reversão de Valores ilegal - XI


A CONTESTAÇÃO da PREVIC à ACP - XI (continuação)

A CONTESTAÇÃO induz a que se pense que ela empresta valor tal aos argumentos expostos pelo Juízo Federal da 8ª Vara da Seção do Distrito Federal, que os adota por achar que comprovam definitivamente a legalidade da Reversão de Valores.

O primeiro argumento é apresentado pelo citado Juízo da seguinte forma: “Por outro lado, quanto ao artigo 20 da Resolução, também não me pareceu ter havido ilegalidade. As hipóteses de revisão do superávit não constam de rol fechado da LC 109/01. Há apenas menção exemplificativa à redução de contribuições. No entanto, não há como negar outras espécies de redução poderão ser adotadas. O objetivo da lei não foi o de cerrar o leque de opções para a regulamentação (a lei não veda outras formas). O importante é que se faça a revisão, seja pela redução (total ou parcial) das contribuições, seja pela melhoria dos benefícios (hipótese também não prevista na LC nº 109/01), seja pela hipótese impugnada neste writ, qual seja, a reversão de valores de forma parcelada aos participantes, assistidos e patrocinador. No fundo, são todas elas espécies do gênero revisão do superávit.”

Minha opinião
Sei que o Juízo Federal tem exímio conhecimento de Direito e de Hermenêutica Jurídica e o respeito. Quero, todavia, de início, esclarecer que entendo haver nesse argumento clara transgressão de uma norma da Hermenêutica Jurídica: “Interpretação da prescrição clara. ...in claris cessat interpretatio... No exame do texto, verifique a sua compreensão, alcançando-a, desista do processo do conhecimento e aceite-o como tal.” (Curso de Direito Previdenciário, de Wladimir N. Martinez, Capítulo CLXXXIV, pg. 1289).

Onde o Juízo Federal encontrou esse “elenco exemplificativo e aberto de hipóteses de revisão do superávit”? No artigo 21 da LC 109/01:

“ Art. 21. O RESULTADO DEFICITÁRIO nos planos ou nas entidades fechadas será equacionado por patrocinadores, participantes e assistidos, na proporção existente entre as suas contribuições, sem prejuízo de ação regressiva contra dirigentes ou terceiros que deram causa a dano ou prejuízo à entidade de previdência complementar.

        § 1o O EQUACIONAMENTO REFERIDO NO CAPUT PODERÁ SER FEITO, DENTRE OUTRAS FORMAS, por meio do aumento do valor das contribuições, instituição de contribuição adicional ou redução do valor dos benefícios a conceder, observadas as normas estabelecidas pelo órgão regulador e fiscalizador.

        § 2o A redução dos valores dos benefícios não se aplica aos assistidos, sendo cabível, nesse caso, a instituição de contribuição adicional para cobertura do acréscimo ocorrido em razão da revisão do plano.

        § 3o Na hipótese de retorno à entidade dos recursos equivalentes ao déficit previsto no caput deste artigo, em conseqüência de apuração de responsabilidade mediante ação judicial ou administrativa, os respectivos valores deverão ser aplicados necessariamente na redução proporcional das contribuições devidas ao plano ou em melhoria dos benefícios.”

 Ele diz que o encontrou no §1º desse artigo 21 que manda: “O EQUACIONAMENTO REFERIDO NO CAPUT poderá ser feito, DENTRE OUTRAS FORMAS,...” Então é CLARÍSSIMA A RESTRIÇÃO: esse elenco exemplificativo só se aplica ao EQUACIONAMENTO DO RESULTADO DEFICITÁRIO (in claris cessat interpretatio), não se aplica ao EQUACIONAMENTO DO RESULTADO SUPERAVITÁRIO; só se aplica ao ARTIGO 21, não se aplica ao ARTIGO 20. E essa restrição ainda fica mais clara, se reforça, com o mandamento contido no §3º desse artigo 21: “Na hipótese de retorno à entidade dos recursos equivalentes ao déficit previsto no caput deste artigo... OS RESPECTIVOS VALORES DEVERÃO SER APLICADOS NECESSARIAMENTE NA REDUÇÃO PROPORCIONAL DAS CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS AO PLANO OU EM MELHORIA DOS BENEFÍCIOS.” Isto é, só existem duas hipóteses de eliminação de EXCESSO DE RESERVAS, a saber, ou redução da contribuição ou melhoria dos benefícios! Pode haver mandamento mais claro?! In claris cessat interpretatio!

 O eminentíssimo Juízo Federal sabe, é claro, da especificidade do equacionamento do déficit. Ele sabe que um Plano de Benefícios desequilibrado por déficit pode ser reequilibrado por aumento das Contribuições, por redução do valor do benefício futuro do Participante, por EMPRÉSTIMO (de diversos tipos) e até por DOAÇÕES. É a este elenco de hipóteses de equacionamento de desequilíbrio deficitário que a Lei está se referindo. Aqui no Brasil essas doações são raras. Mas, na Europa e, sobretudo, nos Estados Unidos da América, elas são muito frequentes. O casal Bill Gates recentemente instituiu uma fundação, com os recursos de um terço de sua fabulosa fortuna, para proporcionar benefícios sociais aos cidadãos dos países subdesenvolvidos. Outro bilionário norte-americano, noticiaram os jornais, deixou recentemente, ao falecer, toda sua fortuna para um grupo de financistas brasileiros que administravam seu patrimônio. Nada impede, pois, que algum abastado brasileiro possa querer fazer doação para determinada EFPC nacional!...

Há, porém, outro lamentável e mais importante aspecto nesse argumento do “elenco exemplificativo de hipóteses de revisão do superávit”, a saber, indica que não se entende o fato financeiro e contábil do superávit, que não se entendeu a arquitetura da LC 109/01 ou, até mesmo, que não se leu a própria LC 109/01! 

Atente-se para a arquitetura da LC 109/01:
O artigo 7º manda que os Planos de Benefícios (inclusive os de benefícios definidos) sejam administrados de tal forma que sempre estejam garantidos transparência, solvência, liquidez e equilíbrio econômico-financeiro e atuarial.

Isto é, permanentemente o ativo do Plano de Benefícios deve ser de valor tal que garanta que se iguale  ao valor do passivo dos benefícios contratados, e esse valor deve ser avaliado por cálculo econômico-financeiro e atuarial.

Os artigos 18, 19, 20 e 21 da LC 109/01 dizem que esse ativo se forma mediante Contribuições do Patrocinador, ou do Participante ou de ambos. Já o §1º do artigo 9º manda que se faça a aplicação desse ativo no mercado de dinheiro. O artigo 31 diz que EFPC é sociedade civil ou fundação sem fins lucrativos e o artigo 32 restringe a atividade da EFPC exclusivamente à prestação de benefícios previdenciários.

Assim, segundo a arquitetura da LC 109/01, tem-se, de um lado, o PASSIVO do Plano de Benefícios Previdenciários, a saber, o valor dos Benefícios Previdenciários Contratados, segundo cálculo econômico-financeiro e atuarial; e, do outro, o ATIVO do Plano de Benefícios Previdenciários, alimentado pelas CONTRIBUIÇÕES e pela RENDA DAS APLICAÇÕES FINANCEIRAS. E tem-se o mandamento legal da LC 109/01: É PRECISO QUE A IGUALDADE ENTRE ESSE ATIVO e ESSE PASSIVO ESTEJA SEMPRE, PERMANENTEMENTE, ASSEGURADA.

Aí entra o artigo 18 da LC 109/01 que amplia a exigência de equilíbrio econômico-financeiro e atuarial para o ATIVO TOTAL do Plano de Benefícios com relação ao seu PASSIVO TOTAL. E o artigo 22 manda que esse equilíbrio seja conferido anualmente ao fim do exercício. É que ao PASSIVO ESTRITAMENTE PREVIDENCIÁRIO do Plano de Benefícios agregam-se outras obrigações, como obrigações trabalhistas, obrigações administrativas, obrigações contratuais para com terceiros e até obrigações judiciais:

“Art. 18. O plano de custeio, com periodicidade mínima anual, estabelecerá o nível de contribuição necessário à constituição das reservas garantidoras de benefícios, fundos, provisões e à cobertura das demais despesas, em conformidade com os critérios fixados pelo órgão regulador e fiscalizador.

        § 1o O regime financeiro de capitalização é obrigatório para os benefícios de pagamento em prestações que sejam programadas e continuadas.

        § 2o Observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, o cálculo das reservas técnicas atenderá às peculiaridades de cada plano de benefícios e deverá estar expresso em nota técnica atuarial, de apresentação obrigatória, incluindo as hipóteses utilizadas, que deverão guardar relação com as características da massa e da atividade desenvolvida pelo patrocinador ou instituidor.

        § 3o As reservas técnicas, provisões e fundos de cada plano de benefícios e os exigíveis a qualquer título deverão atender permanentemente à cobertura integral dos compromissos assumidos pelo plano de benefícios, ressalvadas excepcionalidades definidas pelo órgão regulador e fiscalizador.”

Então, temos aí no artigo 18 como se deve conseguir o equilíbrio econômico-financeiro e atuarial do Plano de Benefícios na sua totalidade: flexibilizando a CONTRIBUIÇÃO, ajustando o valor da CONTRIBUIÇÃO de modo que permanentemente se obtenha ATIVO TOTAL IGUAL A PASSIVO TOTAL do Plano de Benefícios.

Atente-se bem. Nenhum desses valores, ATIVO e PASSIVO, calculados financeira e atuarialmente, são ABSOLUTAMENTE PRECISOS. Eles são MERAMENTE PROVÁVEIS, diria até, VALORES MAIS OU MENOS APROXIMADOS DO QUE DE FATO OCORRERÁ NA REALIDADE. Quem há três anos, há um ano, poderia imaginar que iria ocorrer no mercado brasileiro esse terremoto que está acontecendo com a Petrobras? Quem pode garantir que esse baque já atingiu o fim do poço?

Três hipóteses, portanto, poderão ocorrer, digamos, passado um ano: igualdade (equilíbrio), déficit de ativo ou superávit de ativo. Na minha opinião, O MENOS PROVÁVEL é que ocorra o EQUILÍBRIO. E o MAIS PROVÁVEL É QUE OCORRA O SUPERÁVIT DO ATIVO. O que é IMPORTANTE é o mandamento existente neste artigo 18: HAVENDO DÉFICIT DE ATIVO, aumenta-se a CONTRIBUIÇÃO; havendo superávit de ATIVO, reduz-se a CONTRIBUIÇÃO. O EQUILÍBRIO SE CONSEGUE AUMENTANDO OU REDUZINDO A CONTRIBUIÇÃO.

Mas, lá acima, foi dito que o valor do ATIVO é resultado também da RENDA das aplicações dos recursos do Plano de Benefícios. É verdade, mas a Lei supõe que ele está sendo operado competentemente, como deve ser feito, e, portanto, a EFPC está obtendo a taxa de renda do MERCADO. Noutras palavras, a taxa de renda das aplicações não é determinada por decisão da EFPC, ela é determinada pelo MERCADO (a mão invisível do mercado, resultado das incontáveis interações da multidão de operadores de negócios). A EFPC não a determina, ela se submete à taxa do mercado. Logo, a EFPC não pode alterar essa taxa de renda para ajustar o ATIVO ao PASSIVO, para EQUILIBRA-LOS, IGUALÁ-LOS.

Mas, note que, se o ATIVO JÁ EXCEDE O PASSIVO, e mesmo depois de totalmente suspensa a Contribuição, o ATIVO não só continua excedendo como até continua aumentando o próprio EXCESSO, esse EXCESSO SÓ SERÁ ELIMINADO com AUMENTO TAL DAS DESPESAS COM PAGAMENTOS QUE ESTE SUPERE O PRÓPRIO FLUXO DE INGRESSO DE RENDA DE APLICAÇÃO.

É daí que provêm os seguintes artigos 19, 20 e 21, a saber, para determinar como se processa o reequilíbrio de Plano de Benefícios que já se acha DESEQUILIBRADO POR EXCESSO OU DÉFICIT DE RESERVAS PREVIDENCIÁRIAS.

E o artigo 19 incia a legislação desse processo de reequilíbrio de Plano de Benefício desequilibrado, focando na norma legal da RESERVA PREVIDENCIÁRIA, não apenas porque é o mais importante dos diversos tipos de ATIVO, mas também porque, em um Plano de Benefícios bem administrado, as RESERVAS CONSTITUEM A QUASE TOTALIDADE DO ATIVO. Ei-lo: “Art. 19. As contribuições destinadas à constituição de reservas terão como finalidade prover o pagamento de benefícios de caráter previdenciário, observadas as especificidades previstas nesta Lei Complementar.”

É patente que essa norma legal contém um mandamento e uma proibição. Eles ficam evidentes, se dermos a esse artigo, outra forma que reputo replicar fielmente a do artigo, a saber: “Contribuição, que é separada como Reserva, é separada para ser gasta no pagamento de benefícios previdenciários e, por isso, não pode ser gasta no pagamento de outros compromissos, como por exemplo, de Reversão de Valores.” Existirá algum jurista que ouse negar que é esse o conteúdo completo da imposição legal do artigo 19?

Estabelecidos esse mandamento e essa proibição, e tendo presente o mandamento do artigo 18 (obtém-se o equilíbrio do ativo com o passivo flexionando-se o valor da Contribuição), o artigo 20 passa a DETERMINAR COMO QUER QUE SE FAÇA O REEQUILÍBRIO DE UM PLANO DESEQUILIBRADO POR EXCESSO DE RESERVAS:

- Reservas em valor igual ao valor dos benefícios contratados (Plano de Benefícios equilibrado) são RESERVAS MATEMÁTICAS, o valor da Contribuição não precisa ser alterado, nem providência outra precisa ser tomada;

- Reservas excedentes de até 25% o valor das Reservas Matemáticas,  não se faça modificação alguma no valor da Contribuição nem se tome qualquer outra providência e considere-se esse excedente como reforço de garantia do equilíbrio das Reservas Matemáticas com o valor dos benefícios contratos: permanecem no Plano de Benefícios como RESERVA DE CONTINGÊNCIA;

- Reservas excedentes a 25% das Reservas Matemáticas, seja de que valor for, podem permanecer no Plano de Benefícios, desde que o fenômeno superavitário não ocorra por três exercícios consecutivos, e são RESERVA ESPECIAL Ocorrendo excesso por três anos consecutivos, a RESERVA ESPECIAL tem que ser eliminada, o Plano de Benefícios tem         que ser reequilibrado, isto é, tem que voltar ao nível da Reserva de Contingência.

E como se pode processar a eliminação da Reserva Especial, o reequilíbrio do Plano de Benefícios desequilibrado por excesso de reservas?

O artigo l8 e o próprio artigo 20 dizem que se pode operar reduzindo ou até suspendendo a Contribuição. Quando isso é possível? Quando é a Contribuição que provoca o excedente de reserva. Cessado o ingresso excedente de Contribuição, a Reserva Especial desaparece com o gasto da reserva nos pagamentos rotineiros de benefícios previdenciários.  

E quando a simples suspensão do ingresso de Contribuição não elimina a Reserva Especial, porque o ingresso de renda das aplicações supera o gasto de reservas no pagamento rotineiro dos benefícios previdenciários? Só existe um outro recurso para processar a eliminação da Reserva Especial, a saber, aumentar o valor dos benefícios previdenciários.

E por que não é possível eliminar a Reserva Especial (reequilibrar o Plano de Benefícios) pagando a Reversão de Valores? Por que o artigo 19 o proíbe: RESERVA (seja ela qual for: Matemática, de Contingência e Especial) é SEPARADA para ser GASTA no PAGAMENTO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS, NÃO PODE, pois, SER GASTA NO PAGAMENTO DE REVERSÃO DE VALORES.

Aliás, não é exato aquilo que externa a esse respeito o meritíssimo Juízo Federal, a saber: ¨... seja pela melhoria de benefícios (HIPÓTESE TAMBÉM NÃO PREVISTA NA LC Nº 109/01). Ela está, sim, claramente prevista no §3º do artigo 21: “Na hipótese de retorno à entidade dos recursos equivalentes ao déficit previsto no caput deste artigo, em consequência de apuração de responsabilidade mediante ação judicial ou administrativa, os respectivos valores deverão ser aplicados necessariamente NA REDUÇÃO PROPORCIONAL DAS CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS AO PLANO OU EM MELHORIA DOS BENEFÍCIOS.”

Aí está claríssimo, só existem duas maneiras de eliminar a Reserva Especial (reequilibrar Plano de Benefícios desequilibrado por excesso de reservas), a saber, redução das Contribuições ou melhoria dos benefícios.” A Reversão de Valores é, pois, ILEGAL, extrapolação de seu mero poder regulamentador, perpetrada pela Resolução CGPC  26/2008.

E, finalmente, o artigo 21 (ver acima) manda que, em ocorrendo DÉFICIT DE RESERVA, as Reservas Matemáticas sejam reconstituídas por aumento da Contribuição (de Participante, Assistido e Patrocinador) ou por redução do valor do benefício futuro do Participante ou por outra forma (como empréstimo ou doação).

Entendo, portanto, que o citado meritíssimo Juízo Federal não apresentou a interpretação correta da LC 109/01 nem argumentação competente para justificar a legalidade da Reversão de Valores. O argumento do elenco exemplificativo de hipóteses de revisão do Plano de Benefícios é, na minha opinião, evidentemente falso.
(continua)

Fonte: Blog do Ed (21/11/2014)

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