terça-feira, 12 de abril de 2016

Fundos de Pensao: STJ cancela súmula relativa ao Codigo do Consumidor e beneficia entidades de previdência fechadas


As entidades de previdência complementar privadas (fundos de pensão) ganharam um reforço na argumentação das milhares de ações ajuizadas contra elas por participantes. Por unanimidade, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu no fim de fevereiro cancelar a Súmula nº 321, que determinava a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) na relação jurídica entre as partes.  

Agora, a nova Súmula nº 563 estabelece que "o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às entidades abertas de previdência complementar, não incidindo nos contratos previdenciários celebrados com entidades fechadas".  

Ao deixar de aplicar o CDC, a relação jurídica entre participantes e fundos de pensão fica mais igualitária e os contratos deverão ser analisados com menos interferência do Judiciário, segundo advogados da área.  

De acordo com Ana Paula Oriola de Raeffray, sócia do escritório Raeffray Brugioni Advogados e professora da PUC-SP, ao aplicar o Código de Defesa do Consumidor o fundo de pensão já tinha como parte contrária na ação uma pessoa considerada hipossuficiente. "Isso agora modifica muito a situação", afirma. Até porque, segundo a advogada, será utilizada nesses casos a legislação civil e a relação passa a ser contratual, com equilíbrio entre as partes.  

O advogado Cauã Resende, do JCMB Advogados, que defendeu a Fundação Vale do Rio Doce de Seguridade Social (Valia) no processo que desencadeou o cancelamento da Súmula nº 321, afirma que as vantagens obtidas com o cancelamento são inúmeras. Primeiro pelo fato de os participantes do fundo não serem mais vistos como vulneráveis pelo juiz, já que não se aplica o CDC. "Há uma tendência de que esses contratos sejam analisados como contratos civis, que, portanto, deverá ser respeitado em toda a sua integralidade", diz o advogado.  

Além disso, quando se aplicava o Código de Defesa do Consumidor poderia haver o que se chama de "inversão do ônus da prova", ou seja, o fundo, acusado de não cumprir determinadas exigências, poderia ser obrigado pelo juiz a apresentar provas que comprovassem a sua defesa. Agora, com o processo civil, não acontecerá mais, e o participante será obrigado a demonstrar com provas que o fundo descumpriu o que estava determinado.  

Essa mudança acaba também com a possibilidade de o participante entrar com essas ações em sua cidade, como permite o Código de Defesa do Consumidor. "Isso era muito dispendioso para os fundos que tinham que arcar com despesa de transporte e toda a logística para atuar em ações propostas, as vezes, em todo o país", afirma Resende.  

Para alterar a súmula, a defesa dos fundos de pensão argumentou no processo que não caberia a utilização do CDC para tratar de previdência complementar privada porque essas entidades não são voltadas para o mercado de consumo e não tem caráter lucrativo, como as entidades abertas.  

Nos fundos de pensão, segundo Cauã Resende, há a reunião de pessoas físicas, com identidade de grupo - trabalhista ou associativo -, que optaram por aderir a um plano de benefícios de previdência privada. "Nesse, caso, não há aferição de lucro ou qualquer vantagem financeira, pois os valores administrados são destinados a pagar os benefícios contratualmente previstos e os benefícios não podem ser comercializados no mercado", diz.  

Para o advogado Edson Martins, do Manucci Advogados, o cancelamento da súmula já era há muito buscado pelas entidades fechadas de previdência complementar e já encontrava respaldo em julgados recentes do próprio STJ. "Se as entidades fechadas de previdência complementar não podem oferecer seus serviços ao mercado de consumo, não podem, por consequência, ser enquadradas no conceito de fornecedor, não havendo o que se falar em aplicação do Código de Defesa do Consumidor."  

A decisão do STJ, que determinou o cancelamento da súmula, envolve a Valia e um ex-trabalhador da Vale. Ele entrou com reclamação trabalhista contra a empresa e a Valia afirmando que o fundo de pensão não cumpriu a regra prevista em seu regulamento que assegura ao benefício pago, os mesmos reajustes aplicados pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).  

Em um primeiro momento, o relator no STJ, ministro Luís Felipe Salomão, tinha negado seguimento ao recurso da Valia contra decisão do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Minas Gerais. O TRT tinha aplicado a Súmula nº 321 do STJ que estabelecia o Código de Defesa do Consumidor para tratar da relação jurídica entre participantes e fundos de pensão. Assim, tinha remetido o processo para a vara onde o consumidor, no caso, estaria domiciliado, no município de Vila Velha, ainda que a Vale e a Valia estejam no Rio de Janeiro.  

Porém, o ministro reconsiderou seu posicionamento ao perceber que haviam divergências entre as turmas do STJ sobre a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Assim, por decisão da 4ª Turma, o recurso foi encaminhado para a 2ª Seção, responsável por uniformizar o tema, que foi unânime ao decidir a favor dos fundos de pensão.

Fonte: Valor (12/04/2016)

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