segunda-feira, 3 de julho de 2017

Aposentadoria: Aposentadoria tranquila? Com regras complexas, previdência privada aberta confunde investidores e acaba por favorecer mais os bancos


Dentre as reformas propostas pelo governo, a que mais gerou polêmica e discussão foi a da Previdência. E, independentemente dos desfechos da votação do projeto, há muito tempo os analistas de investimento reforçam a ideia da contratação de um plano complementar como forma de garantir uma aposentadoria mais tranquila.

O incentivo ao investimento para fins de aposentadoria é legítimo, mas o grande problema é que as condições dos planos são complexas. Na verdade, na esmagadora maioria das vezes, o investidor faz uma escolha ruim ao aderir a uma previdência privada.

Para começar, o investidor deve decidir entre dois produtos de previdência privada: o Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) e o Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL). Além de escolher entre esses nomes que não dizem muita coisa, é preciso optar entre a tabela progressiva ou regressiva na hora da aplicação.

Os benefícios são difíceis — quase impossíveis para alguém que não seja um especialista — de serem estimados. Junto a esses potenciais ganhos, surgem as taxas cobradas pelos bancos, as quais também incidem de uma forma complexa. Essa complexidade faz com que as pessoas tenham a falsa impressão de que estão fazendo um bom investimento.

Os custos variam de acordo com a instituição, mas comumente abarcam taxa de administração e taxas de carregamento de entrada e de saída. Estas são tão altas que os investidores fariam melhor negócio se optassem por outro investimento, como Tesouro Direto ou até um Certificado de Depósito Bancário (CDB), desde que bem negociado com o banco.

Ainda que a análise dependa de uma série de fatores, como regra, pode-se dizer que não vale a pena contratar planos que tenham taxa de carregamento, seja na entrada ou na saída. Em relação à taxa de administração, o limite máximo que deve ser aceito é de 0,7% ao ano.

Existe uma forte publicidade das instituições financeiras para vender esse produto. Entre elas está o modelo de tabela regressiva, em que a alíquota do Imposto de Renda chega a 10% para aportes aplicados por mais de dez anos. Os produtos tradicionais de renda fixa, em regra, atingem sua menor alíquota — que é de 15% — após dois anos.

Outro benefício comumente divulgado pelas instituições financeiras é a possibilidade de deduzir até 12% da renda anual bruta do Imposto de Renda no caso do PGBL. O que não é anunciado na hora de fazer propaganda, no entanto, é que o contribuinte adia o pagamento do imposto. No resgate, o tributo é calculado em cima do valor total, e não apenas sobre os juros, como em produtos de renda fixa tradicionais e até no VGBL.

Ainda assim, o investidor tem um potencial benefício fiscal. Por exemplo, se ele estiver na faixa mais alta do Imposto de Renda no ajuste anual, deixa de pagar 27,5% naquele ano, para pagar 10% — caso opte pela tabela regressiva e fique ao menos dez anos com o dinheiro aplicado. Os benefícios fiscais existem, mas a complexidade de estimá-los faz com que, na prática, eles fiquem com os bancos que vendem o produto.

Uma maneira de contornar essa apropriação do benefício fiscal pelo banco é uma mudança na legislação — que já deveria ter acontecido faz tempo. Os benefícios fiscais deveriam ser aplicáveis a todos os investimentos de longo prazo, independentemente de levarem ou não o nome de previdência privada. Uma pessoa que ficou 15 anos em um CDB ou título público nitidamente possui um objetivo previdenciário, e faz todo sentido que desfrute de uma tabela do IR diferenciada.

Incentivar as pessoas a investirem pensando em aposentadoria é positivo, mas falta clareza para que os investidores possam comparar os benefícios de cada produto disponível. Do jeito que é feito hoje, com as altas taxas praticadas, a vantagem fiscal se traduz em receita para o banco, não para o investidor.

Fonte: O Globo (03/07/2017)



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