domingo, 24 de setembro de 2017

Aposentadoria: União quer limitar aplicações das entidades de previdência de estados e municípios


Regras apertam investimentos em ativos privados, incentivando entidades regionais a comprar títulos públicos

O governo pretende endurecer as regras para estados e municípios que têm regimes próprios de Previdência e investem os recursos dos participantes no mercado financeiro para financiar aposentadorias e pensões no futuro.
Uma minuta de resolução da Secretaria de Previdência, vinculada ao Ministério da Fazenda, muda a política dos investimentos desses ativos e está causando celeuma no Congresso Nacional. Ela faz uma série de exigências que, na prática, incentivam a aplicação em títulos do Tesouro Nacional, que são remunerados pela Taxa Selic — atualmente em queda.

Por exemplo, estão sendo criados critérios para a compra de ações na Bolsa e de fatias em fundos de participação de empresas (Fipe), de direitos creditórios (Fidc) e imobiliários, entre outros. Aprovada a resolução pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), seriam feitas exigências a respeito da governança das empresas que receberiam os investimentos.

Isso significa que as Previdências de estados e municípios terão um rol menor de oportunidades de investimento, o que tende a fazer com que as entidades regionais aumentem a aquisição de títulos públicos.

Governo teria público cativo
Os 2.107 regimes próprios de Previdência (de municípios e estados) têm R$ 134,4 bilhões aplicados no mercado financeiro, sendo que 64% desse montante já estão investidos em papéis do Tesouro, segundo dados da Secretaria de Previdência. São dez milhões de servidores segurados, incluindo ativos, aposentados e pensionistas.

O governo afirma que a nova norma tem a finalidade de aperfeiçoar a gestão desses ativos, melhorar a qualidade da carteira de investimentos dos regimes previdenciários, assegurando maior liquidez. Mas especialistas e representantes dos entes públicos contestam a medida, alegando que por trás dela existe a intenção da União em manter um público cativo para carregar a dívida pública.

Além disso, essa seria uma maneira de forçar os governos regionais a fazerem um ajuste fiscal. Isso porque a Selic está gerando um retorno real de 4%, o que é insuficiente para assegurar que os regimes próprios terão recursos para pagar os beneficiários no futuro. Para formar este caixa, prefeituras e estados terão que elevar a contribuição patronal e dos próprios trabalhadores.

A medida atinge principalmente os municípios (médias e grandes cidades, com exceção de São Paulo) que instituíram regimes de capitalização para os novos servidores. Há ainda 3.500 municípios que continuam debaixo do INSS. Alguns estados também são afetados e até o Rio, que tem um sistema previdenciário deficitário, criou um fundo separado para os novos funcionários e tem cerca de R$ 100 milhões aplicados no mercado financeiro.

— Os municípios não podem ser obrigados a financiar a dívida da União às custas de terem uma remuneração menor de seus ativos previdenciários e serem obrigados a pagarem alíquotas patronais ainda maiores para compensar os prejuízos — destacou o especialista e integrante da consultoria de Orçamento da Câmara, Leonardo Rolim.

Infraestrutura perde
Segundo Rolim, os regimes dos municípios estão equilibrados ou têm planos de equacionamento do déficit atuarial, pois é uma exigência para a obtenção do Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP), sem o qual não há repasses federais.

O economista Raul Velloso defende que a União reforce a fiscalização, mas aplique aos regimes regionais as mesmas regras dos fundos de pensão das estatais. Estes podem, por exemplo, emprestar dinheiro aos seus participantes.

— A situação financeira dos regimes próprios é muito variada. Mas acho que os superavitários deveriam ter mais liberdade para investir, ainda mais quando a trajetória da Selic é de queda — disse Velloso.

Presidente da Associação das Consultorias de Investimentos em Previdência (Acinprev), Celso Sterenberg diz que a nova resolução restringe ainda mais a participação dos fundos de previdência no financiamento de projetos do setor de infraestrutura:

— Em outros países, 60% da infraestrutura são financiados com Previdência. No Brasil o percentual é de 0,16%.

Para o presidente da Confederação Nacional dos Municípios, Paulo Ziulkoski, a mudança na política de investimentos dos regimes próprios pode sacrificar ainda mais as prefeituras, por causa de possíveis novos aportes nos fundos de previdência municipais, para evitar que fiquem descapitalizados.

Na visão de especialistas, o que o governo deveria fazer é retomar as discussões com o Congresso para aprovar uma reforma da Previdência abrangente. Algumas categorias de servidores, como juízes, desembargadores, professores e policiais, têm um custo previdenciário elevado para os governos regionais.

Norma foi discutida
Muitos regimes ainda estão no modelo de repartição simples, em que os servidores ativos ajudam a pagar os aposentados, sem formação de reserva, como funciona na capitalização. Como a proporção de ativos é cada vez menor que os inativos, a tendência é um déficit explosivo.

A Secretaria de Previdência nega que a nova resolução tenha como objetivo manter os investimentos dos regimes próprios nos títulos do Tesouro. O subsecretário de Previdência, Allex Albert Rodrigues, afirma que a norma foi discutida com todos os representantes do segmento e do mercado:

— A resolução não traz nenhum direcionamento para aplicações em títulos do Tesouro. Ao contrário, ela mantém a estrutura da norma em vigor, apenas garante maior segurança e liquidez aos recursos dos participantes.

Fonte: O Globo (24/09/2017)

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