terça-feira, 2 de setembro de 2014

Fundos de Pensão: O papel das fundações no desenvolvimento socioeconômico

Um dos projetos do governo é incentivar o BNDES a criar fundos de investimento ao alcance das pequenas e médias entidades

O sistema de Previdência Complementar desempenha um relevante papel sob o ponto de vista social e da economia de mercado. Os fundos de pensão, por serem investidores institucionais e fornecedores de recursos para projetos de maturação de longo prazo, são, em todo mundo, um dos maiores mecanismos de acumulação de poupança, condição fundamental para oxigenar o mercado financeiro e de capitais e alavancar investimentos produtivos. O crescimento do sistema é uma forma de democratização do capital, além de instrumento de justiça social, à medida que permite aos trabalhadores planejar seu futuro e ter uma vida digna na aposentadoria, com segurança e ganhos compatíveis aos que recebiam na ativa.

O histórico dos fundos de pensão no Brasil é recente. Na dissertação, “Gestão do Risco de Liquidez para as Entidades Fechadas de Previdência Complementar”, apresentada ao curso de Mestrado Profissional da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Ciência da Informação da Universidade de Brasília, Antônio Bráulio de Carvalho, diretor de Controladoria e Planejamento da Fundação dos Economiários Federais (Funcef), afirma que a edição da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977, “que sumarizou a previdência privada no Brasil”, surgiu para embalar os interesses do governo Ernesto Geisel em “retirar da União os gastos com a aposentadoria dos empregados públicos, que eram, por força legal, suportados pelas estatais”. Carvalho mostra ainda que outra pretensão não menos importante foi engendrada pelo então ministro da Fazenda Mario Henrique Simonsen, que visava estimular o mercado de capitais “transferindo recursos a baixo custo para as companhias de capital aberto”. A partir de sua institucionalização, o Sistema de Previdência Complementar assume um novo patamar de desenvolvimento.

Na última década, os fundos de pensão saíram de um total de ativos de R$ 235,9 bilhões, em 2003, para cerca de R$ 640 bilhões atuais, o que demonstra um crescimento da ordem de 271%. Desse montante, mais de 90% estão alocados em investimentos que representam cerca de 14% do PIB brasileiro. De acordo com dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), sob a ótica do patrimônio de fundos de pensão, o Brasil ocupa a 8ª posição em termos de ativos.

A simbiose entre o sistema de Previdência Complementar e os mercados financeiro e de capitais contempla interesses de ambos os lados. Ainda segundo Carvalho, por administrarem recursos comprometidos com o pagamento de aposentadorias e pensões e, portanto, diferidos no tempo, os fundos de pensão podem planejar suas aplicações no longo prazo, de acordo com uma política de investimentos determinada e que apresente o desempenho esperado. Essa realidade permite que as instituições direcionem seus ativos para todas as modalidades de aplicações, mesmo aquelas de maturação em horizontes mais distantes, de acordo com as estratégias de alocações deliberadas em suas instâncias. O desafio, nesse caso, é procurar garantir que esses investimentos tenham taxas de retorno, solvência e liquidez compatíveis com a necessidade dos compromissos atuarias e administrativos, presentes e futuros.

Atento às mudanças da economia
Para o secretário de Políticas de Previdência Complementar do Ministério da Previdência Social, Jaime Mariz, o regime de Previdência Complementar, em especial o segmento das entidades fechadas, traz três importantes efeitos para os mercados financeiro e de capitais. O primeiro diz respeito ao volume de recursos investidos nas diversas modalidades de ativos, permitindo uma fonte de financiamento para os diversos agentes econômicos. O segundo efeito é proporcionar ao mercado maior liquidez, pois sempre haverá investidores em diferentes fases de maturação de seu passivo atuarial. O terceiro efeito diz respeito à prática dos preceitos de investimentos socialmente responsáveis, por meio dos quais as EFPC procuram investimentos em ativos originários de empresas que se preocupam e agem em favor da não degradação do meio ambiente, das relações trabalhistas decentes, das relações sociais não preconceituosas, enfim, em prol de relações e de uma sociedade justa e responsável.
O secretário observa que as mudanças na política econômica do governo forçaram a queda nas taxas de juros e os fundos de pensão foram obrigados a buscar novas alternativas. “Uma mudança absolutamente natural. Trata-se de uma alteração ocorrida ao longo dos últimos anos. Mostra, no entanto, que o sistema está atento aos indicadores e à evolução econômica do país, e que se preparou para isso”. As entidades têm um perfil de compromissos de longo prazo e suas carteiras devem estar organizadas e estruturadas para atender aos seus interesses e não flutuar ao sabor do mercado especulador, afinal, são investidores institucionais.

Para as EFPC, essa mudança sinaliza uma nova postura como investidores, onde o risco oriundo das próprias aplicações e da economia se faz muito mais presente. A procura por ativos mais rentáveis, líquidos e seguros os move a buscar novas oportunidades, em especial, em investimentos no mercado produtivo, na economia real, onde o desempenho está ligado diretamente à evolução econômica do país e não apenas do mercado financeiro e de capitais. “Isso é muito bom para o país e para as próprias instituições”, afirmou o secretário.

Fundos para pequenas e médias entidades
Outra opção, em sintonia com o perfil e o fluxo financeiro do plano de benefícios, são os investimentos em infraestrutura. “Creio que sejam fontes de bons rendimentos e certamente ajudam a economia do país, ou seja, mais uma contribuição das entidades fechadas”, salienta. “Acredito que aqueles que não venham a aproveitar as benesses desse tipo de investimento perdem excelente oportunidade”. Mariz lembrou que a SPPC manteve os primeiros contatos com técnicos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para conversar sobre a possibilidade de criação de fundos de infraestrutura para investidores institucionais, o que possibilitaria que as médias e pequenas entidades participassem desses investimentos, beneficiando-se de seus efeitos salutares e, ao mesmo tempo, ajudando o país com capital bom, barato e de longo prazo. “Não desistimos dessa ideia e real possibilidade”.
O importante é que esse volume de reservas dos planos de benefícios seja ampliado e, para tanto, é preciso adotar medidas que tragam maior atratividade aos produtos das EFPCs. “Na minha percepção, seria adequando alguns ajustes no modelo tributário e a permissão do resgate parcial. Com isso poderia haver uma maior atratividade aos nossos produtos”.

Segurança jurídica
Para o diretor superintendente da Fundação Coelba de Previdência Complementar (Faelba), fundo de pensão dos empregados da Companhia de Energia do Estado da Bahia, Augusto Reis, os fundos de pensão desempenham um papel fundamental no processo de alavancagem do desenvolvimento econômico e social do país. “A missão de garantir aos participantes uma aposentadoria digna e com qualidade de vida vem sendo cumprida com rigor” afirmou.
Ele reconhece que será preciso buscar, cada vez mais, novas alternativas de investimentos para suprir a queda da taxa de juros, e o caminho passa pelo mercado de capitais e investimentos alternativos. Nesses casos, Reis enfoca a necessidade de se buscar opções que garantam um retorno compatível às necessidades de cada instituição, além de regras claras, definidas e com segurança jurídica.
Mauricio Wanderley, diretor de Investimentos e Finanças da Valia, fundo de pensão dos empregados da Cia. Vale do Rio Doce, vê a possibilidade de investimentos em infraestrutura com cautela, mas reconhece que o sistema necessita diversificar sua carteira de investimento. “Temos que buscar oportunidades. Nos Estados Unidos e Europa, os fundos de pensão têm um leque de possibilidades de investimentos maior que no Brasil”.

Caminho sem volta
Do outro lado do balcão encontra-se o sistema financeiro e o mercado de capitais. Leonardo Deeke Boguszewski, diretor presidente da JMalucelli Investimentos, acredita que o crescimento esperado para a economia do país nas próximas décadas depende do mercado de capitais. “O sistema de Previdência Complementar, por sua vez, é extremamente importante para o desenvolvimento deste mercado”, afirmou. Com recursos em crescimento e horizonte de longo prazo, as entidades podem alocar ativos para financiar as necessidades do governo e fomentar os investimentos do setor privado.
O executivo lembra a relevância dos maiores fundos de pensão na capitalização de empresas listadas - desde as privatizações até as mais recentes aberturas de capital. “A importância do sistema será ainda maior à medida que os fundos menores também diversificarem as aplicações e aumentarem suas alocações nestes ativos, principalmente em ações”.
Ele acredita que a busca das EFPCs por novas alternativas de investimento é um caminho sem volta e que a diversificação das carteiras é uma medida necessária para a superação da meta atuarial, bem como para mitigar o risco de reinvestimento no longo prazo. “Mas isso só acontece com um mercado maduro, capaz de oferecer diferentes alternativas e profissionais de gestão preparados para a tomada de decisões, com experiência na avaliação de riscos”.
As entidades que hoje conseguem superar a meta atuarial aplicando somente em títulos públicos indexados à inflação não deveriam se contentar em fazê-lo. Caso contrário, no vencimento destes papéis, não terão desenvolvido suas competências internas de maneira adequada, estando despreparadas para lidar com a necessidade de diversificação quando não houver outra opção. “A hora de começar é agora. A experiência internacional mostra isto.”

Políticas públicas adequadas
Boguszewski lembra que os limites impostos para os investimentos das EFPC brasileiras são mais restritivos que os observados em outros países. Em sua opinião, os gargalos existentes no Brasil pela falta de investimentos em infraestrutura tornaram-se uma excelente oportunidade para lidar com a questão. “Com aplicações de longo prazo e perspectivas positivas de crescimento em áreas essenciais para o país, os investimentos do sistema se adequam perfeitamente ao desafio vivenciado pelos gestores, que muitas vezes encontram dificuldades em buscar oportunidades alinhadas às suas necessidades”.
Boguszewski acredita que a ampliação da participação dos fundos de pensão no PIB do país passa por uma regulamentação que permita às entidades, com base em uma diversificação adequada de suas carteiras, auferir rentabilidades reais superiores ao crescimento real do PIB no longo prazo. Ele considera fundamental um trabalho voltado à atração de novos participantes para o setor, desafio que pode e deve ser tratado com políticas públicas adequadas. “É preciso adotar medidas que aumentem o conhecimento da população em relação ao produto, possibilitem o desenvolvimento de novos fundos e incentivem o aumento da adesão aos fundos já constituídos”, conclui.

Fonte: Revista da ABRAPP • ICSS • SINDAPP • Ano XXXIII • Número 393 • Julho/Agosto 2014

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