sexta-feira, 31 de agosto de 2012

TIC: Cenário adverso não é permanente para teles


O investidor que apostou nas empresas de telecomunicações neste ano pode estar se arrependendo de ter adicionado as ações em seu portfólio. Com um ambiente regulatório mais rigoroso desde o mês passado e o setor atingindo a maturidade também nos serviços de voz móvel, apenas o papel da Oi tem desempenho positivo em 2012. A bolsa acumula alta de 0,9% no ano.
A telefonia fixa já atingiu a saturação há algum tempo e, com a base de celulares ultrapassando um aparelho para cada habitante no Brasil, as companhias têm de adotar uma nova estratégia para crescer nesse ambiente. Há meses, o volume de adições líquidas de usuários se enfraquece e o mercado parece dar sinais de estabilidade.
Mas analistas ouvidos pelo Valor dizem acreditar que, apesar do aperto na fiscalização e nas regras da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) em julho, e do menor ritmo de adições de clientes, ainda há para onde se expandir. Passada essa tempestade, as perspectivas de longo prazo para as operadoras se mostram boas e contrariam o movimento de seus papéis na BM&FBovespa.
Em relação à operação do setor de telefonia, o pior desempenho está com o segmento empresarial. Roger Oey, analista-chefe da BES Securities, corretora do Banco Espírito Santo, lembra que o consumidor pessoa física não mudou seus hábitos de usar o telefone, mesmo com o menor ritmo da economia, mas as empresas passaram a cortar custos nessa área. "Essa divisão [empresarial] tem afetado os resultados das companhias", disse.
Isso, aliado à competição mais ferrenha entre as teles - que resulta em preços mais baixos e, portanto, menor receita e pouco espaço para crescimento -, fez com que várias casas de análise rebaixassem o preço-alvo ou recomendação para ações do setor. "Mas nada mudou nos investimentos das companhias, que continuam em valores altos, e as empresas continuam a pagar bons dividendos", explicou Oey.
Desde o começo do ano até o pregão de ontem, a Telefônica Brasil, que opera sob a marca Vivo, acumulou queda de 11,5%, e a TIM, de 15,2%. A Oi, ao contrário, teve alta de 7,3%. O analista do BES avaliou que o principal motivo para o declínio é a recente fuga de estrangeiros dos papéis, repercutindo as notícias negativas para o setor.
"Houve um aperto regulatório e o mercado sempre interpreta isso negativamente, como a mão do governo na economia", disse William Alves, da XP Investimentos. Em 18 de julho, a Anatel suspendeu as vendas de novos chips para Claro, Oi e TIM em diferentes Estados, um movimento que durou até o começo de agosto.
Mas isso não indica exatamente que haverá uma pressão constante sobre as companhias. "A Anatel passou um 'pente fino' em um mercado que estava crescendo muito", lembrou Alves. "Agora, o setor deve ser acompanhado mais de perto, mas se elas cumprirem as metas de melhoria vai haver uma estabilização."
Na opinião dos analistas, o órgão começou agora a olhar mais atentamente para um mercado em que havia uma monitoração mais branda. "A Anatel está apenas fazendo o seu trabalho, que é fiscalizar e regular esse setor. Não há risco regulatório, isso acontece quando há quebra de contratos", opinou Alex Pardellas, da CGD Securties, ex-Banif Investimentos.
Os analistas do BTG Pactual, ao contrário, se mostram mais pessimistas. Em relatório que circulou ontem no mercado, a corretora do banco prevê uma nova rodada de corte nas taxas de interconexão cobradas entre as operadoras de telefonia móvel (VU-M), ou seja, quanto cada empresa recebe da concorrente pela utilização de sua rede. Em março, a agência reduziu essas taxas em 13,7% e a previsão é de diminuir mais 9,3% no ano que vem.
Depois de encontrar-se com autoridades da agência reguladora, o analista Carlos Sequeira, do BTG, disse que considera muito provável que haja uma nova redução das tarifas ainda neste ano. Para especialistas, após estimular a expansão das empresas, a Anatel começa a acreditar que a grande base de clientes conquistada tão rapidamente pode ter sido um dos motivos da deterioração dos serviços.
Mas não há consenso sobre esse ponto. "Não é tradição da Anatel ser tão dura assim", ponderou Alves, da XP. A redução das taxas de interconexão já afetou a receita das operadoras, que dependem em grande parte desses valores para incrementar seu faturamento. Nos resultados do segundo trimestre, os três grupos de telefonia do setor, que têm capital aberto, informaram que sofreram impacto com a menor taxa de interconexão.
A Oi, por exemplo, teve queda anual de 2,4% em sua receita líquida, considerando a participação da antiga Tele Norte Leste em demonstrações anteriores, enquanto a Telefônica apresentou redução de 0,2% na mesma linha do balanço. A TIM, por sua vez, avançou 7% no mesmo indicador.
Porém, a saturação é menor do que parece, além de ser normal no amadurecimento do setor no Brasil. O analista da XP lembra que agora, em vez de adições líquidas, o desafio é convencer os usuários de que falar mais não custa tão caro. Tradicionalmente, os consumidores no país evitam falar ao celular, por conta dos altos preços que eram praticados no passado.
Além disso, o segmento de transmissão de dados continua engatinhando por aqui e se mostra uma boa alternativa para as teles capturarem ganhos. Oey, da BES Securities, vê pressão sobre as margens e o faturamento, ao menos até o fim do ano, enquanto as companhias também preocupam-se com investimentos em melhoria.
"Temos ainda alguns pontos positivos, como um crescimento em potencial de banda larga, de TV paga", diz Pardellas, da CGD. "Não acho que o setor está nas trevas." José Francisco Cataldo, da Ágora Corretora, também vê no longo prazo uma melhora no cenário, passado o susto regulatório e encontrada uma estratégia para o setor continuar se expandindo. Resta agora convencer os investidores do mesmo.
Fonte: Valor (31/08/2012)

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