Considerações acerca da Retirada de Patrocínio e da Minuta de
Resolução do Conselho Nacional de Previdência Complementar ora objeto de
Consulta Pública.
Introdução:
Em
primeiro lugar, cumpre destacar que a retirada de patrocínio é direito
conferido à empresa patrocinadora pela Constituição Federal, artigo 202, e
também pela Lei Complementar nº 109/2001 e consiste na possibilidade, conferida
às empresas patrocinadoras de deixarem de fazer parte do fundo de pensão que
então participavam.
Com
a retirada de patrocínio, a patrocinadora deixa de verter suas contribuições,
outrora opostas em contrapartida as dos participantes. Essa possibilidade
de saída existe desde as primeiras regulamentações da previdência complementar
fechada e está prevista na Resolução CPC nº 06 de 07 de abril de 1988. Até aqui cabe à PREVIC - Superintendência de
Previdência Complementar, como órgão fiscalizador, analisar e aprovar
previamente os processos de retirada de patrocínio, cujos pedidos são
encaminhados pela própria entidade de previdência complementar.
Sabe-se
que a adoção dessa medida pelas patrocinadoras, em conjunto com as entidades de
previdência complementar, é uma tendência dentro do atual contexto dos fundos de pensão. A grande dificuldade
apontada pelas entidades e pelas patrocinadoras, que motiva a política da
retirada de patrocínio, é a manutenção do equilíbrio financeiro e atuarial dos
planos de benefícios definidos.
Porém,
cumpre destacar que em nome desse equilíbrio, muitas vezes, os participantes
são alijados em seus direitos, que lhes são garantidos contratualmente,
mediante vínculo adesivo, em total desrespeito ao princípio da
facultatividade contatual e da boa-fé objetiva.
A
prática da retirada de patrocínio, evidentemente, se presta a atender somente
aos interesses das Reclamadas. O participante, que em tese deveria ser o foco
do sistema de previdência complementar, passa a ser tratado como mero polo de
arrecadação de recursos. A proteção previdenciária perdeu lugar para as
vultuosas somas milionárias e para a constatação de que todo esse dinheiro
teria importância maior que a própria complementação das aposentadorias dos
participantes.
Importante
destacar que a criação dos planos de previdência complementar ocorreu como
política de recursos humanos visando o incentivo e a manutenção de dos
empregados. Evidentemente, a instituição de um plano de benefícios definidos de
previdência complementar é um diferencial importante para atrair e reter
mão-de-obra especializada, tão carente num mercado de trabalho de
inquestionável demanda.
- I -
Assim sendo, ainda que a
retirada de patrocínio seja medida prevista no ordenamento jurídico brasileiro,
não se pode admitir que esse procedimento seja adotado da maneira que melhor
entender as empresas e das entidades, e em absoluto prejuízo dos participantes.
O
prejuízo advindo da retirada de patrocínio é evidenciado pelas possibilidades
que restam ao participante, quando diante da manifestação de vontade da empresa
patrocinadora. Aos participantes se garante apenas o resgate dos valores
aportados (que foge completamente do objetivo de contratação de um plano de
previdência privada, que é o de manter no futuro o padrão de vida existente
durante a vida laboral) e a transferência para um plano de contribuição
definida (CD).
Diante do acima descrito temos que:
1)A rescisão unilateral do contrato
previdenciário pelo patrocinador/instituidor somente poderá se dar na hipótese
da verificação de fato imprevisível e com justa motivação
2)A rescisão unilateral por mera vontade do
patrocinador/instituidor determinará sua responsabilidade pelo pagamento dos
compromissos futuros anteriormente assumidos, além das insuficiências de
reservas eventualmente existentes na data do requerimento da retirada.
Na minuta de Resolução, no Capítulo I, os artigos 3º e 4º
permitem a livre e unilateral retirada de patrocínio (quebra do contrato
previdenciário), sem qualquer ônus ou medida indenizatória, por mero interesse
do patrocinador. Contudo. Tal determinação desconsidera o direito adquirido, da
função social do contrato, dos princípios da probidade e boa-fé do contrato, da
interpretação mais benéfica ao participante/assistido aderente ao contrato, das
cláusulas do Código de Defesa do Consumidor, e, especialmente, da função
institucional protetiva do Estado acerca dos interesses dos participantes e
assistidos. Os princípios citados estão
presentes nos artigos 3º, inciso VI
e 25, da Lei Complementar nº 109/2001 e nos
art. 51, incisos IX, XI e XV, e art. 54, § 2º, do Código de Defesa do
Consumidor.
3) A retirada de patrocínio não poderá autorizar o
patrocinador ou instituidor a apropriar-se das reservas de contingência e
especial previstas na Lei Complementar nº 109/2001, as quais deverão permanecer
no plano de benefícios para serem destinadas de acordo com as previsões legais
e regulamentares que lhe são inerentes.
Na minuta de Resolução, no Capítulo III, o artigo 10
permite a que o patrocinador retirante se aproprie do excedente que compõem a
reserva de contingência e especial do plano de benefícios, entretanto,
considerando a viabilidade da continuidade de funcionamento do plano de
benefícios e as previsões da Lei Complementar 109/2001, assim como da própria
Resolução CGPC nº 26/2008, que estabelecem destinação específica para essas
reservas, os valores devem permanecer no plano de benefícios para garantir os
benefícios contratados A permissão de apropriação desses valores pelo
patrocinador representa incentivo indevido à retirada de patrocínio, uma vez
que permanecendo na condição de patrocinador este não teria acesso diretamente
aos recursos. Nesse ponto encontramos respaldo a nossa tese nos art. 1º, art.
3º, incisos III e VI, art. 19, art. 20, §§ 1º, 2º e 3º; todos da Lei Complementar nº 109/2001; e Resolução
CGPC nº 26/2008, Título III, Da Destinação e da Utilização do Superávit,
artigos do 7º ao 25.
Outro
ponto que merece destaque refere-se a situação dos assistidos uma vez que em
alguns casos o plano de benefícios deixará de existir com a retirada de
patrocínio. Na apuração e individualização dos valores referentes ao plano de
benefícios definido para a formação da reserva matemática, muitos assistidos
não conseguirão lograr êxito na composição de uma reserva individual, sendo
certo que seus benefícios eram garantidos pelo caráter mutualista do plano de
benefícios definido.
Com
a retirada de patrocínio, os assistidos se verão diante de uma situação
absolutamente contrária ao que esperavam quando da adesão ao plano de benefícios:
muitos terão seus benefícios de complementação reduzidos e, até mesmo, deixaram
de usufruir de qualquer benefício previdenciário de previdência privada. E aqui
está se falando de participantes assistidos, já aposentados, que cumpriram
todos os requisitos necessários para fazer jus à complementação postulada, que
já possuíam direito adquirido, devidamente incorporado ao seu patrimônio.
Ainda que a retirada de patrocínio
seja medida legalmente possível, a mesma não pode ser operada de forma a trazer
tamanho prejuízo aos aos assistidos. A patrocinadora deverá assegurar aporte de
recursos, atuarialmente calculados, necessários à cobertura dos compromissos
assumidos com os benefícios concedidos e a conceder ao grupo remanescente.
Diante do acima
descrito temos que:
4) Aos
assistidos deve ser garantida a manutenção da renda complementar que possuíam
antes da efetivação da retirada de patrocínio, por ser direito adquirido e por
ser inquestionável o prejuízo que esses aposentados sofreram.
Na minuta de
Resolução, no Capítulo V, os artigos 14 e 15 não garantem aos assistidos a
manutenção da renda que já auferem e isso viola o direito adquirido, o ato
jurídico perfeito e a função social do contrato, dos princípios da probidade e
boa-fé do contrato, da interpretação mais benéfica ao participante/assistido
aderente ao contrato, das cláusulas do Código de Defesa do Consumidor, e,
especialmente, da função institucional protetiva do Estado acerca dos
interesses dos assistidos. Os princípios citados estão presentes nos artigos
3º, inciso VI e 25, da Lei Complementar nº 109/2001 e nos art. 51, incisos IX, XI e XV, e art. 54, §
2º, do Código de Defesa do Consumidor.
Fonte: Dra. Marcelize Azevedo, Especialista em Direito Previdenciário da Alino & Roberto e Advogados, www.aer.adv.br
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