Um dos principais argumentos que especialistas usam para indicar que a Previdência é superavitária é o de que na conta do governo não são consideradas as chamadas “contribuições sociais” (Cofins, CSLL e PIS/Pasep), que fazem parte do orçamento da Seguridade Social.
Com a Desvinculação de Receitas da União (DRU) — mecanismo que permite ao governo federal usar livremente 20% de todos os tributos federais vinculados por lei a fundos ou despesas — o uso das contribuições sociais é expandido também para outras áreas. No entanto, o que outros especialistas explicam é que a Seguridade reúne Previdência, Saúde e Assistência. Portanto, mesmo que esses recursos não fossem enviados para outras áreas, eles não poderiam ser destinados integralmente para as pensões e aposentadorias. Senão, as outras duas áreas que compõem a Seguridade ficariam desfalcadas.
Com a Desvinculação de Receitas da União (DRU) — mecanismo que permite ao governo federal usar livremente 20% de todos os tributos federais vinculados por lei a fundos ou despesas — o uso das contribuições sociais é expandido também para outras áreas. No entanto, o que outros especialistas explicam é que a Seguridade reúne Previdência, Saúde e Assistência. Portanto, mesmo que esses recursos não fossem enviados para outras áreas, eles não poderiam ser destinados integralmente para as pensões e aposentadorias. Senão, as outras duas áreas que compõem a Seguridade ficariam desfalcadas.
O que dizem os especialistas:
Denise Gentil
PROFESSORA DA UFRJ
“O governo faz um cálculo baseado apenas na receita sobre a folha de pagamento de salários e de outros contribuintes do INSS, o que está errado, porque existem outras contribuições sociais para entrar nessa conta. Então, um dos motivos que explica o déficit é justamente não incluir todas as fontes da Receita da Seguridade Social — como a Cofins, CSLL, PIS/Pasep. Com isso, ele desobedece o raciocínio dos artigos 194 e 195 da Constituição Federal. Por outro lado, o governo eleva artificialmente as despesas, ao incluir o gasto com aposentadorias dos militares e dos servidores públicos, que possuem um regime próprio e não fazem parte do orçamento da Seguridade Social. Além disso, a DRU ajuda nessa redução das receitas.”
Paulo Tafner
ECONOMISTA E PESQUISADOR DO IPEA
“A Seguridade Social é composta por três subsistemas: Previdência, saúde e assistência. Alguns economistas acham que a receita da seguridade precisa ser jogada para a Previdência, mas ela tem recursos especificamente destinadas a ela. Se jogarmos tudo na Previdência, falta na saúde, e aí o rombo só muda de lugar. Há o argumento de que, como tem a DRU, isso subtrai recursos do orçamento e se esse dinheiro fosse colocado lá, não haveria déficit. E isso não é verdade, porque o recurso não é “desviado da seguridade”, ele deixa de ser carimbado. Quando há aumento da despesa previdenciária, as pessoas são pagas, ou seja, esse dinheiro volta pra lá. Além disso, mesmo considerando essa metodologia pouco rigorosa, os resultados de 2016 mostram-se negativos. Ou seja, não há mais como negar a existência de déficit na Previdência. E repito, mesmo com a metodologia canhestra que alguns poucos utilizam.”
2.Qual o peso das isenções e desonerações fiscais nesta conta?
As isenções e desonerações fiscais são ações do governo para aumentar a geração de emprego e estimular a competitividade entre as empresas. Elas consistem em isentar ou diminuir os impostos pagos por uma companhia. Porém, essa renda que deixa de ser arrecadada seria destinada à Previdência, portanto, esses incentivos acabam contribuindo para o déficit. Com as isenções, em 2016, o Regime Geral de Previdência Social deixou de arrecadar R$ 43,4 bilhões, o que representa 28,9% do déficit registrado no ano. Em 2015, o governo federal abriu mão de R$ 40 bilhões — 46,62% do rombo de R$ 85,8 bilhões registrado naquele ano.
O que dizem os especialistas:
Denise Gentil
PROFESSORA DA UFRJ
“O governo desconsidera o patamar de desonerações tributárias concedidas ao setor privado. O gasto cresce e o governo ignora que sua política de renúncia, em patamares elevadíssimos de receitas de contribuições sociais, prejudica o equilíbrio fiscal do sistema previdenciário. Ele propõe uma reforma da Previdência pelo lado da redução do gasto sem considerar a possibilidade de rever suas políticas que prejudicam a receita do sistema. Fora o problema da gestão ineficiente da elevada sonegação, já que há empresas que descontam a arrecadação do funcionário e não transferem esse valor para a Previdência.”
Paulo Tafner
ECONOMISTA E PESQUISADOR DO IPEA
“De fato, a desoneração fiscal não é uma boa política. Acho que o governo tem de combater, acabar com elas. Entretanto, as desonerações não são responsáveis pelo desequilíbrio estrutural da Previdência. Elas apenas e contingencialmente aumentam ligeiramente o desequilíbrio.”
3.Os trabalhadores rurais são os responsáveis pelo déficit da Previdência?
Como geralmente começam a trabalhar mais cedo que os demais, durante mais horas por dia e, eventualmente, sem descanso semanal e renda fixa, os trabalhadores rurais se enquadram em uma aposentadoria especial: conseguem o benefício mais cedo e não são obrigados a contribuir. No entanto, o que muitas pessoas não sabem é que 2,1% da comercialização da produção desses trabalhadores são descontados no momento da venda de seus produtos e destinados à Previdência. Ou seja: existe uma contribuição compulsória. Pelo fato de não contribuírem com um valor fixo, desde 2009 a Previdência rural era responsável pelo déficit total, já que arrecadação urbana era superavitária. Em 2016, no entanto, como resultado da crise econômica, a Previdência urbana voltou a apresentar déficit, o que alguns especialistas acreditam que seja uma tendência também para os próximos anos.
Saldo da Previdência
FONTE: IBGE
O que dizem os especialistas:
Denise Gentil
PROFESSORA DA UFRJ
“As receitas de Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) são suficientes para cobrir os gastos com as aposentadorias rurais e foram criadas com esse objetivo, de proporcionar uma aposentadoria não contributiva equivalente à dos trabalhadores urbanos. Porém, parte importante dessas duas contribuições são destinadas a outras áreas por causa da Desvinculação de Receitas da União.”
Paulo Tafner
ECONOMISTA E PESQUISADOR DO IPEA
“Todos deveriam cumprir as mesmas regras. Boa parte dos trabalhadores rurais trabalham com carteira assinada na área rural de cidades bastante desenvolvidas. Inclusive, muitos deles moram nos centros urbanos. Há, sim, um problema rural concentrado no Norte e Nordeste, mas eles podem receber benefício especial, se for o caso. Só não pode ser uma contribuição avulsa como é hoje e, sobretudo, os critérios de aposentadoria rural não devem ser tão flexíveis como são atualmente.”
4.O crescimento menos acelerado da população e o aumento da expectativa de vida contribuem para um possível rombo?
Mesmo que um país não tenha um rombo nas contas da Previdência, os fatores demográficos são fundamentais para que um governo analise a necessidade de eventuais reformas. No caso do Brasil, a tendência é de que a população “envelheça”. Isso acontece quando as mulheres passam a ter menos filhos e a população começa a viver mais. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2024 deve ser encerrada essa fase de “bônus demográfico” do Brasil.
Expectativa de vida, em anos
FONTE: IBGE
Taxa de fecundidade, em número de filhos por mulher
FONTE: IBGE
As últimas projeções populacionais do instituto, feitas em 2013, mostram que o número de pessoas com 60 anos ou mais vai saltar de 22 milhões (10% da população) para:
Projeções da população brasileira
FONTE: IBGE
O que dizem os especialistas:
Denise Gentil
PROFESSORA DA UFRJ
“O governo usa a Pnad de 2014 nas projeções populacionais de seu modelo atuarial. Mas, quando se compara a Pnad com a projeção do IBGE, no ano de 2014 a Pnad superestimou a população de idosos em 7 milhões. Essa sobrecobertura vai se acumulando ao longo do tempo até que, em 2060, supostamente haveria uma explosão do gasto com aposentadorias. Para completar, o governo utiliza nas suas projeções um porcentual de correção do salário mínimo real acima do crescimento real do PIB, o que também não corresponde à realidade. Como mais de 60% das aposentadorias equivalem, hoje, a um salário mínimo, o gasto cresce até chegar a 17% do PIB em 2060. As reformas feitas na Europa elevaram a idade de aposentadoria para 65 e 66 anos progressivamente em uma sociedade que vem envelhecendo desde os anos 1980. Nós faremos a elevação da idade e do tempo de contribuição de uma tacada só sem a população ter começado a envelhecer.”
Paulo Tafner
ECONOMISTA E PESQUISADOR DO IPEA
“Mesmo hoje a Previdência já tem uma arrecadação insuficiente. Não enfrentar essa questão seria fazer uma ‘mágica contábil’.”
Próximos passos da reforma
A nova proposta de reformada Previdência do governo (veja os vídeos abaixo), apresentada pelo relator Arthur Oliveira Maia (PPS-BA), tem uma dura jornada no Congresso até ser aprovada. Depois da votação dos destaques da Comissão Especial, a proposta de emenda à Constituição (PEC) segue para o plenário da Câmara, onde precisa da aprovação de três quintos dos 513 deputados (308 votos favoráveis) em dois turnos de votação.
Após passar pela Câmara dos Deputados, o projeto será enviado para a Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Da CCJ, irá para o plenário do Senado, onde também terá de passar por dois turnos de votação. Se for modificado, o texto volta para a Câmara. Caso contrário, seguirá para a sanção do presidente Michel Temer.
Fonte: Estadão (06/05/2017)
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