Na edição de dezembro/2017 de nossa Newsletter, noticiamos a publicação da Instrução nº 15, de 08.12.2017 da Superintendência Nacional de Previdência Complementar-PREVIC (“Instrução PREVIC 15”), que tratou do exercício por essa autarquia federal de seu poder cautelar administrativa através de “medidas prudenciais preventivas destinadas a assegurar a solidez, a estabilidade e o regular funcionamento do Regime de Previdência Complementar (...)”.
Tendo em vista o caráter inovador e a relevância dessa norma para o segmento da previdência complementar fechada, apresentamos, agora, algumas considerações complementares sobre o tema, sem, contudo, pretender esgotar a sua análise.
As medidas prudenciais preventivas estabelecidas pela Instrução PREVIC 15 se inserem no campo do poder geral de cautela da Administração Pública, inerente ao poder decisório do Estado. O art. 45 da Lei nº 9.784, de 29.01.1999 (“Lei de Processo Administrativo Federal”), prevê, de forma genérica, a tutela de urgência nos seguintes termos:
Art. 45. Em caso de risco iminente, a Administração Pública poderá motivadamente adotar providências acauteladoras sem a prévia manifestação do interessado. (Grifou-se.)
Tal dispositivo, em simetria com regras do Código de Processo Civil [1] e do Código de Processo Penal [2], explicita os elementos básicos para a formação do ato administrativo destinado a resguardar, em caráter de urgência, bem jurídico tutelado pelo Estado. Para a edição de atos extremos, há necessidade de três aspectos relevantes: (i) a existência de risco eminente, (ii) a explícita motivação para o ato cautelar; e (iii) a dispensabilidade de prévio contraditório.
Muito embora não reste expresso na Instrução PREVIC 15, a lei federal que lhe dá suporte exige a aferição da existência de risco iminente. Não há no Processo Administrativo a hipótese da adoção de tutelas provisórias apenas fundamentadas na evidência de fatos, como ocorre no âmbito do Processo Civil (art. 311 do CPC).
Assim, a determinação de medidas acauteladoras pela PREVIC deverá se dar na proporção necessária para afastar os riscos iminentes ao bem jurídico tutelado, preferindo-se, sempre, a medida menos gravosa capaz de produzir tal efeito. Deve-se ressaltar, que os destinatários dos atos administrativos são entes privados, gestores da “previdência privada” na dicção do art. 202 da Constituição Federal.
Da mesma forma, a tutela administrativa de urgência só poderá perdurar enquanto subsistirem as condições que levaram à sua adoção, devendo ser revista caso não se verifiquem mais os riscos que a fundamentaram.
O segundo aspecto destacado é que a adoção das providências acauteladoras sempre será motivada, regra reproduzida no art. 1º, parágrafo único da Instrução PREVIC 15. Quanto ao ponto, é importante se ater ao conteúdo do art. 50, § 1º da Lei de Processo Administrativo Federal [3], que explicita os elementos básicos para a motivação dos atos processuais da administração pública (descrição explícita, clara e congruente).
No caso das medidas previstas na Instrução PREVIC 15, é indispensável, ainda, que a motivação contenha os elementos que demonstrem a necessidade e adequação da atuação estatal. Deve ser indicado o bem jurídico ameaçado, os elementos que comprovem a existência de urgência e as razões pelas quais não seriam cabíveis outras medidas menos gravosas.
O terceiro aspecto relevante está relacionado com a determinação de providências acauteladoras sem o prévio contraditório. Trata-se de possibilidade de exceção para garantir a efetividade da contenção de riscos iminentes, devendo ser adotada sempre (e somente quando) a abertura de prazo para manifestação prévia do administrado inviabilize a realização dos efeitos que se pretende com a medida. Deve-se lembrar que a regra é o prévio contraditório, tal como determina o art. 5º, LV da Constituição Federal, ao garantir “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” (grifou-se).
Não significa dizer, entretanto, que estará a Administração Pública dispensada a promover o contraditório e garantir o exercício do direito à ampla defesa pelos afetados. Tratando-se de mera inversão de fases processuais. Após a adoção de qualquer providência acauteladora, deve ser aberta a possibilidade de manifestação e apresentação de recurso, em prazo razoável, pelos administrados.
Tais elementos formam as bases jurídicas para a aplicação da Instrução PREVIC 15, que, em função da complexidade do tema abrangido, continuará a ser objeto de nossas reflexões, especialmente no que tange às hipóteses de cabimento e espécies de cautelares previstas.
[1] Arts. 300 a 310 do CPC.
[2] Art. 282 do CPP.
[3] Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:
I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;
(...)
§ 1º A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato. (Grifou-se.)
(*) Flavio Martins Rodrigues é sócio sênior de Bocater Advogados.
(*) Gabriel Augusto Cintra Leite é advogado de Bocater Advogados.
Fonte: NewsLetter Bocater Advogados (02/2018)
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