As novas relações de trabalho, a reforma da Previdência e mudanças no comportamento das novas gerações de jovens profissionais, menos inclinadas a fazer carreira em uma única empresa, estão redesenhando a previdência complementar no país. No lugar do modelo tradicional de fundo de pensão - em que companhias atuam como patrocinadoras ao fazer contribuições em nome do funcionário -, começam a chamar atenção das fundações os planos instituídos e setoriais, inicialmente adotados por associações de classe, sindicatos de trabalhadores e cooperativas para profissionais filiados.
Um exemplo é a Fundação Copel, dos funcionários da estatal paranaense de energia. O conselho deliberativo da entidade aprovou no último dia 4 a formação de um fundo de pensão instituído - ou seja, sem patrocinador -, para atender os familiares dos funcionários da estatal que desejam fazer sua poupança para o período da aposentadoria.
No segmento de previdência complementar fechada, que reúne quase R$ 800 bilhões de patrimônio, os fundos instituídos ainda são pouco representativos, com pouco mais de 1% do total, ou R$ 8,9 bilhões (mas com 10% do número de participantes). Mas são eles que vêm puxando o crescimento do mercado como um todo, que foi de 2,4% ao ano, na média, na última década.
Regulamentados por meio da lei complementar nº 109 de 2001, na esteira da necessidade de se ampliar a proteção social para classes que estavam descobertas, como autônomos, prestadores de serviços e profissionais liberais, os primeiros fundos instituídos só foram criados em 2004. Hoje, são 65 planos de 36 entidades, segundo a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc).
Enquanto os instituídos representam especificamente uma entidade de classe ou sindicato, caso da OABPrev, plano da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) com cerca de 44 mil participantes, os setoriais contemplam um segmento da economia, como a indústria. Atualmente, o único plano setorial em pleno vigor é o IndústriaPrev, da Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc), criado em 2015.
No caso da Fundação Copel, o plano será instituído pela Associação dos Empregados e Participantes da Fundação Copel (AFC). O objetivo, diz o especialista em previdência da Fundação Copel, Glewerson Caron, é garantir a perenidade da fundação diante do menor apelo do modelo tradicional, seja pelo comportamento da nova geração, que não tem apego ao emprego, ou pela falta de interesse da própria companhia de patrocinar os planos - a última vez que um plano tradicional surgiu foi em 2005, com a Toyota. Soma-se ao quadro a constatação de que não será mais possível contar com a previdência oficial como no passado.
O plano em estudo pela Fundação Copel tem público potencial para alcançar 100 mil vidas. "Nos primeiros cinco anos, a expectativa é ter 4.200 participantes", afirma Caron. A instituição tem feito palestras pelo Estado a fim de verificar o interesse dos participantes. Nas apresentações, a taxa de aceitação tem sido de 95%, completou.
Caron conta que o novo plano também será oferecido como alternativa aos planos de previdência aberta para o funcionário que já participa do fundo de pensão patrocinado, como forma de diversificação dos investimentos. "Nossas pesquisas mostram que 43% dos participantes têm um plano VGBL ou PGBL", afirmou o especialista. Depois da aprovação do conselho, o próximo passo é enviar à Previc pedido para sua constituição, com a perspectiva de iniciar a oferta já a partir de janeiro de 2018.
Atualmente, um dos maiores plano instituídos do Brasil nasceu do sistema de cooperativas de crédito, o Unicred. Com 59 mil participantes - diante de um universo de 200 mil pessoas -, o plano soma R$ 2 bilhões em reservas. "A meta é chegar no fim do ano com 70 mil participantes e patrimônio de R$ 2,7 bilhões", diz a diretora de desenvolvimento e investimentos da Quanta Previdência Unicred, Denise Maidanchen. Para o ano que vem, a entidade estima alcançar um patrimônio de R$ 3,5 bilhões e 87 mil adesões.
O presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), Luiz Ricardo Martins, pondera que o setor de previdência complementar fechada tem potencial para crescer, mas precisa encontrar meios para que isso ocorra. "Se nada for feito, pelo fluxo do que se paga, as reservas [dos fundos de pensão] podem sofrer esgotamento a partir de 2034", alerta. O sistema, garante, é sólido, mas precisa de fomento. Entre os pleitos da entidade estão a aprovação do mecanismo de adesão automática e a flexibilização para que familiares de participantes até terceiro grau possam participar de fundos instituídos ou setoriais, o que pode dar mais força ao segmento.
É com um plano setorial da própria entidade que a Abrapp pretende dar uma injeção de ânimo no segmento. A estimativa é que possa alcançar familiares de 2,5 milhões dos fundos de pensão, um potencial que pode torná-lo o maior fundo de pensão do país. "O grande tema ainda é o fundo setorial. Dentro da proposta da Abrapp de apresentar algo novo, de demonstrar que o sistema está buscando um fomento, o fundo setorial se mostra um grande instrumento para isso", afirma.
As tratativas para a criação do fundo estão em compasso de espera. Havia expectativa de que reunião do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC), a ser realizada no dia 13, deliberasse o pleito do sistema para que parentes em até terceiro grau possam participar - hoje a regulação permite apenas o primeiro grau. No entanto, o tema não entrou na pauta da reunião. Sem esta medida aprovada, o fundo tem seu escopo reduzido. O setor busca ainda a aprovação do mecanismo de adesão automática de trabalhadores aos fundos de pensão, mas a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) já emitiu um parecer contrário. O pleito ainda não foi votado. Ainda assim, o potencial dos instituídos e setoriais continua grande. "Acreditamos que estes planos vão impulsionar o crescimento no curto, médio e longo prazos", afirma o diretor da Icatu Fundos de Pensão, Sérgio Egídio. Atualmente, a instituição faz a gestão para cinco planos instituídos, com um total de 45 mil participantes, incluindo o da OABPrev. O total gerido é de R$ 680 milhões. A Icatu faz a administração do ativo, do passivo e das coberturas de morte e invalidez, além de vender os planos. Sem revelar os planos de crescimento, Egídio diz que a Icatu tem recebido algumas demandas de associações, indústrias e varejistas interessadas no modelo. "Nós acreditamos que esta nova perspectiva está bem alinhada com a mobilidade trabalhista da atual geração Y. Muitas empresas existem ou deixam de existir, mas com um fundo setorial há a possibilidade de ter um vínculo mais amplo. Você retém mais estas pessoas [na mesma fundação]", diz o diretor da Previc, Carlos Marne.
A exemplo do que acontece no Reino Unido, a expectativa da Previc é que o plano setorial seja uma oportunidade para o pequeno e médio empregador. "É exatamente este público que queremos", afirmou Marne. O próprio IndústriaPrev, da Fiesc, ainda não atingiu todo seu potencial. O fundo conta atualmente com mil participantes de 23 indústrias, uma fatia pequena diante do universo de 60 mil empresas e 800 mil trabalhadores no Estado. "A gente enxerga este percentual como bastante significativo", afirma a superintendente da Previsc, Regidia Frantz. Na visão de Regidia, trata-se de um modelo bem mais flexível e dinâmico do que o patrocinado. Ao assinar o contrato de adesão, o participante define a periodicidade das contribuições, e tem a prerrogativa de fazer aportes adicionais. Por outro lado, ele tem um prazo mínimo para ficar no plano. "Não há flexibilidade total porque é importante enfatizar que se trata de um plano de previdência e não de investimento, mas há alternativas para saques", afirma a superintendente. Das 23 indústrias que participam do plano, três fazem contribuições para seus funcionários, apesar de não serem consideradas patrocinadoras por não terem essa obrigação.
Fonte: Valor (11/09/2017)
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