terça-feira, 14 de maio de 2019

Fundos de Pensão: Susep e Previc terão sob supervisão R$ 1,9 trilhão




A fusão entre a Superintendência de Seguros Privados (Susep) e a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) criará uma autarquia que supervisionará R$ 1,9 trilhão gerido pelos setores de seguros e previdências aberta e fechada.
O modelo adotado é o mesmo dos outros reguladores do mercado financeiro — Banco Central (BC) e Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Na esteira das mudanças nas regras de aposentadoria no Brasil, uma das pretensões da economista Solange Vieira, que vai comandar o novo órgão, é convergir as regras da previdência. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: Quando haverá definição sobre a fusão entre Susep e Previc?

Solange Vieira: Essa decisão é da Casa Civil junto com o Ministério da Economia. Nossa expectativa é de que em 15 dias, no máximo, [o projeto de Lei ou Medida Provisória] seja encaminhado para a Casa Civil.

Valor: Como será na prática?

Solange: Esperamos um pouco mais de autonomia regulatória e imaginamos que o conselho de recursos [Câmara de Recursos da Previdência Complementar] acabe. Os julgamentos passam para nossa estrutura. O CNSP [Conselho Nacional de Seguros Privados, que se fundirá com o Conselho Nacional de Previdência Complementar] fica como um grande guarda-chuva regulatório. 

Valor: A nova autarquia perde relevância se o regime de capitalização não for aprovado?

Solange: Com ou sem capitalização — e acho que ela vai sair —, o que estamos fazendo é importante para o desenvolvimento do setor. A reforma da Previdência é um fato que está colocado. O modelo atual mostra um sinal de esgotamento grande. Acho que oposição, governo, não importa de que partido as pessoas hoje são, todos concordam que a Previdência tem um déficit e que precisa ser resolvido.

Valor: Qual será a importância dessa nova autarquia?

Solange: Serão R$ 1,9 trilhão de recursos [sob supervisão]. Com a mudança do regime para capitalização, é fundamental que estejamos estruturados e tenhamos um trabalho de educação financeira da população. O Brasil é carente de poupança de longo prazo.

Valor: É possível incentivá-la?

Solange: Eu arriscaria dizer que a maior parte destes R$ 2 trilhões está alocada em renda fixa. Eu acho que temos que incentivar projetos de private equity, operações de project finance estruturadas, em que tradicionalmente estão as maiores rentabilidades no mundo. O setor pode ter seus recursos alocados de fato em projetos de longo prazo.

Valor: Os fundos de pensão tiveram problemas com private equity…

Solange: Sim, e temos que evoluir essa regulação. Os fundos e as SPEs constituídos perderam credibilidade porque ocorreram vários problemas de corrupção, de governança, de má gestão.

Valor: Na sua opinião, a fiscalização da Previc foi eficiente?

Solange: A fiscalização tem que evoluir muito. De modo geral, tem sido muito reativa e tem que evoluir para algo mais preventivo.

Valor: A regulação deve evoluir?

Solange: Quando vários fundos de pensão apresentam déficit, dão problema, com certeza o marco regulatório precisa ser aprimorado.

Valor: Que mudanças poderiam haver na previdência aberta para convergir com a fechada?

Solange: Quando o governo permite isenção tributária no setor de previdência [aberta], ele está focando em investimentos de longo prazo. Hoje a isenção tributária não está associada a carteira dos planos, ao prazo médio dos investimentos. E temos que começar a ligar essas duas coisas.

Valor: Poderia ser uma isenção tributária progressiva?

Solange: Tem que ser algo progressivo, as carteiras mais longas devem ter isenções maiores e carteiras mais curtas, isenções menores. E temos que fazer com que o mercado tenda a evoluir para investimentos de longo prazo.

Valor: E nos fundos de pensão, que mudanças poderiam ser feitas?

Solange: O fundo de pensão já tem uma ‘duration’ alta. A regra de saque é bem mais restritiva do que em um PGBL. A grande transformação nos fundos de pensão é que precisa ser dada mais flexibilidade para os participantes portarem recursos. A Lei 108/109 já fez um avanço grande, mas acho que podemos ousar um pouco mais e trazer concorrência entre os setores.

Valor: Que tipo de ousadia?

Solange: O participante do fundo de pensão deveria ter o direito — de forma programada, para não afetar a liquidez e antes de ficar elegível à aposentadoria — de decidir se quer a renda vitalícia no fundo A, B ou C ou por meio de uma seguradora. Ele deveria poder portar [transferir os recursos].

Valor: Por que ele portaria e não permaneceria no fundo?

Solange: Porque tem custos administrativos diferentes, ofertas de taxas de juros, precificação. Quando você contribui num plano de contribuição definida ou variável, você acumula recursos para receber o benefício com uma renda certa. Para isso acontecer, existe uma taxa de juros pactuada. E essa taxa varia de fundo para fundo.

Valor: Qual é a importância disso para o participante?

Solange: O participante tem que conhecer as opções que tem para saber exercê-las. Isso também é um ponto importante para as fundações voltarem a ter uma dinâmica e ter empresas interessadas em ter fundos de pensão. À medida que você deixa o participante portar recursos pós-emprego, esses participantes não vão fazer mais parte da base de cálculo, não vão mais representar riscos para as empresas. E com isso eliminamos o risco pós-emprego que temos muito grande nos planos de benefício definido, de empresas estatais e todos os planos que se convertem em renda certa pós-aposentadoria.

Valor: Qual será o tratamento dado às insurtechs, startups financeiras voltadas para seguros?

Solange: Esse processo de inovação que estamos passando no mundo todo nos pressiona a evoluir tecnologicamente e evoluir o marco regulatório para permitir maior flexibilidade. Estamos discutindo a possibilidade de fazer uma regulação por segmentação, de acordo com a estrutura da seguradora, de termos faixas de regulamentação de acordo com a estrutura da seguradora.

Valor: Isso funcionaria também para os fundos de pensão?

Solange: Também faz sentido, eu não posso exigir as mesmas regras de um fundo como a Previ [fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil] que tem mais de R$ 180 bilhões de patrimônio e um fundo de pensão que está começando e tem R$ 400 milhões, R$ 500 milhões. Até hoje, nos seguros e fundos de pensão, não pensamos uma regulamentação que permita à empresa nascer pequena e depois se tornar grande. E quando eu falo de regulamentação segmentada, o chamado ‘sandbox’, é podermos permitir a empresa pequena nascer dentro desses mercados e ter isenções temporárias de regulamentação. Será muito importante para o dinamismo da economia.

Valor: Na previdência aberta, há fundos com ganhos abaixo do CDI.

Solange: Isso não está bom. Temos que analisar tanto o nosso marco regulatório, mostrar para o participante que essa rentabilidade não é adequada. E o participante que tem que cobrar a performance, o regulador não pode interferir. Até o fim de junho, a Susep vai divulgar a lista de rentabilidade dos fundos.

Valor: E como isso será feito nos fundos de pensão?

Solange: Temos que divulgar a performance, o custo administrativo. É muito importante ter uma análise comparativa de custos.

Fonte: Valor (13/05/2019)

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