A pedido de muitos amigos, publico este artigo, revisto e atualizado sobre a privatização da Telebrás. Antes, porém, uma explicação de meus critérios. Como sugere a Bíblia, uma árvore deve ser julgada por seus frutos. Esse é o critério que proponho para julgar a privatização das telecomunicações no Brasil. É o que faço aqui, ao avaliar seus frutos ou resultados.
Comparemos a situação das telecomunicações brasileiras em janeiro de 2020 com o que tínhamos em 29 de julho de 1998, quando o setor foi privatizado.
1. De lá para cá, o Brasil universalizou o acesso ao telefone, ao passar de 24,5 milhões para cerca de 300 milhões de acessos telefônicos. Desse total, 226 milhões são celulares em serviço.
2. As linhas fixas passaram de 19 milhões para 32,5 milhões, hoje todas de acessos banda larga.
3. A densidade ou penetração da telefonia decuplicou, isto é, cresceu mais de 10 vezes, saltando de 14 para 140 telefones por 100 habitantes, ou seja, um crescimento da ordem de 1.000%.
4. A internet se consolidou e o País quebrou em fevereiro de 2015 a barreira dos 200 milhões de acessos em banda larga, a maioria deles a partir de terminais móveis.
5. No período 1998-2020, apenas com os resultados da privatização da Telebrás, o governo brasileiro obteve — direta ou indiretamente — um retorno financeiro da ordem de 1,23 trilhão, ou o equivalente a US$ US$ 283,2 bilhões (de dólares).
O único balanço correto: fatos e números
Façamos, portanto, um balanço objetivo – baseado exclusivamente em fatos e números – do que ocorreu no setor de telecomunicações nesse período e a avaliar os resultados da desestatização da telefonia – expressão mais precisa do que privatização, embora usaremos tanto uma quanto outra expressão ao longo deste artigo.
Faço aqui uma observação preliminar: Privatizar ou desestatizar não uma questão ideológica. É uma estratégia de governo. Assim sendo, só há, dois tipos de privatizações ou de desestatizações: as bem feitas e as mal feitas. As primeiras são realizadas com rigor e honestidade. As últimas, podem ter todos os tipos de vícios ou de corrupção.
Ressalto, também, que não há nenhuma razão para combatermos todas as privatizações, apenas do ponto de vista político ou ideológico. Todos se recordam das últimas campanhas eleitorais, quando os candidatos petistas e a esquerda em geral combatiam duramente as privatizações.
Ganhos financeiros e econômicos
Os petistas sempre acusaram os governos anteriores de terem privatizado as telecomunicações “a preço de banana”, como repetia ex-ministro das Comunicações, Paulo Bernardo. Se estudassem apenas por algumas horas a questão, o ex-ministro das Comunicações e seus colegas de PT não diria uma bobagem dessas, pois a venda da Telebrás gerou ao longo dos últimos 22 anos ingressos superiores a R$ 1,23 trilhão.
Sim: mais de um 1,2 trilhão de reais. Isso não significa negar a existência de muitos problemas setoriais, nem as queixas de milhares de assinantes, quanto aos padrões de atendimentos das operadoras.
A rigor, os ingressos econômicos e financeiros gerados pela desestatização das telecomunicações no período de julho de 1998 a dezembro de 2014 foram de R$ 722,2 bilhões, sem incluir aí os R$ 500 bilhões de recursos privados investidos depois de 1998 pelas concessionárias e empresas privadas na infraestrutura. A soma desses recursos, a valores históricos, chega a R$ 1,23 trilhão.
Vejam o que rendeu a privatização da Telebrás
Demonstramos a seguir os valores de receitas ou ingressos diretamente ligados à venda da Telebrás, em quatro etapas:
• R$ 22,26 bilhões, provenientes do Leilão da privatização das teles, no dia 29-07-1998, pagos pela aquisição de 19% das ações que representavam o controle da holding em poder do governo federal;
• R$ 70 bilhões arrecadados nos leilões posteriores de licenças para operadoras de telefonia celular, da primeira até a quarta geração (1G, 2G, 3G e 4G) de 1998 a 2014.
• R$ 550 bilhões de impostos gerados pela nova rede telefônica do País (que saltou de 24,5 milhões de telefones em julho de 1998 para mais de 300 milhões em dezembro de 2013, aí incluídos telefones fixos e celulares) – e pelos impostos pagos pelos 170 milhões de usuários de telefonia e de internet. E um lembrete: o Brasil cobra as mais elevadas alíquotas de impostos sobre os serviços de telecomunicações do mundo: da ordem de 43%. Esses impostos são pagos por nós, usuários.
• R$ 102 bilhões confiscados pelo governo federal dos três fundos setoriais entre o ano 2000 e 2019; esses fundos, pagos por todos os usuários de telecomunicações do País, foram criados por lei para serem aplicados exclusivamente na expansão do setor nas áreas rurais e na inclusão social. São eles: o FUST (Fundo de Universalização das Telecomunicações), o FISTEL (Fundo de Fiscalização das Telecomunicações) e o FUNTTEL (Fundo de Tecnologia das Telecomunicações).
• Somem-se a todos esses valores os investimentos de quase a R$ 500 bilhões feitos pela iniciativa privada na infraestrutura setorial após a privatização, e teremos, então, o total dos recursos gerados pela privatização do setor.
Se somarmos as cinco parcelas acima: R$ 22,2 bilhões+70 bilhões+550 bilhões+102 bilhões+500 bilhões, teremos o total geral de R$ 1,274 trilhão (de reais) gerados apenas pela privatização setorial. Ou o equivalente a US$ 283,2 bilhões (de dólares).
Há ainda benefícios não quantificáveis: “Quanto valeria, por ex., a inclusão social de 170 milhões de brasileiros, não apenas graças à telefonia, mas, também ao acesso à internet?”
Os brasileiros mais jovens não se lembram que o monopólio estatal da Telebrás era elitista e cruel: cada novo assinante de telefonia tinha que pagar valores que variavam de US$ 1.000 a 3.000 para obter uma linha telefônica pelo velho plano de expansão. E o telefone só era instalado cerca de 24 meses depois (ou até 48 ou 60 meses).
Em conclusão: se US$ 283,2 bilhões forem considerados “preço de banana” – talvez fosse o equivalente a toda a banana produzida e exportada pela América Latina nos últimos três séculos.
E uma pergunta final: “Quanto valeu para o País a universalização do telefone, com aumento da densidade telefônica que saltou, em 21 anos, de 14 para mais de 140 telefones por 100 habitantes?”
Sempre que cruzar com Paulo Bernardo — se ele estiver em liberdade — eu irei perguntar-lhe, com um leve sorriso:
— Então, ministro, o senhor ainda acha que a Telebrás foi privatizada a preço de banana?
Fonte: Ethevaldo Siqueira (12/03/2020)
Nota da Redação: Somar impostos e arrecadações das teles no período pós privatização, sem considerar as receitas geradas por elas, é no mínimo ser muito tendencioso nessa análise.
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