sexta-feira, 27 de março de 2020

Comportamento: Registros de coronavírus no Brasil são subestimados, sugere estudo baseado na Universidade de Oxford



Presença da Covid-19, em média, é maior em locais que fazem mais testes; país estaria detectando de 8% a 18% dos casos. O Brasil é um dos países que menos fazem testes no mundo

Um levantamento indica que os países que conseguem testar parcela maior da população para Covid-19 estão, em média, registrando incidência maior da doença. Entre os já afetados pela transmissão comunitária da epidemia, o Brasil é um dos que menos fazem testes, o que pode levar autoridades a subestimar a presença do vírus.

O trabalho que compilou dados nacionais mescla relatórios oficiais com fontes de informação alternativa, e é um termômetro ainda impreciso da situação global, mas é a primeira iniciativa do tipo feita no mundo. Os dados foram agregados pelo projeto Our World in Data, baseado na Universidade de Oxford e financiado pela Fundação Bill e Melinda Gates, além de outros.

Capacidade de diagnóstico
Veja quem está testando mais pessoas para a Covid-19. A barra é proporcional ao número de exames laboratoriais por país (por milhão de habitantes)
PaísTestes por milhão de hab. 
 Emirados Árabes Unidos
12 738
 Bahrain
10 982
 Noruega
8 025
 Coreia do Sul
6 148
 Eslovenia
4 736
 Austrália
4 473
 Itália
3 499
 Alemanha
2 023
 Dinamarca
1 851
 Áustria
1 778
 Bélgica
1 580
 Suécia
1 413
 Irlanda
1 350
 Israel
1 247
 República Tcheca
1 093
 Rússia
998
 Reino Unido
960
 Irã
957
 Taiwan
899
 Hong Kong
698
 Espanha
646
 França
559
 Finlândia
538
 Eslováquia
497
 Suíça
461
 Romênia
427
 Malásia
422
 Holanda
349
 Polônia
345
 Estados Unidos
314
 Hungria
313
 Croácia
307
 Vietnã
159
 Nova Zelândia
121
 Japão
118
 África do Sul
110
 Tailândia
102
 Colômbia
82
 Turquia
35
 Brasil
14
 Filipinas
12
 Índia
11
 Paquistão
10
 Indonésia
7
 Ucrânia
7
 México
2
Como países só são obrigados a relatar casos positivos, ainda não há dados oficiais para estimar as diferenças, por isso o grupo britânico buscou uma maneira alternativa. Entre 59 países que relataram o número de testes sendo realizado por habitante, o Brasil ficou na 53ª posição: apenas 13,7 pessoas por milhão de habitantes haviam sido testadas até o meio de março — cerca de 3 mil testes, número que o governo relatou à imprensa na época.

A lista não pode ser considerada um ranking, porque não existem dados em muitos países que abrigam o novo coronavírus, mas o número brasileiro é baixo. O Reino Unido, por exemplo, testou 960 pessoas por milhão de habitantes até aquela data. A Coreia do Sul testou 6.148.

— O fato de a gente estar, no momento, fazendo exame só para casos moderados a graves mascara a realidade da infecção aqui no país — afirma a infectologista Raquel Stucchi, professora da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp.
Em sua opinião, é possível tentar melhorar a capacidade de testagem do país, que é o que está forçando autoridades de saúde a adotarem critérios mais restritivos para economizar o número de testes. Mas fatores como escassez global de insumos para os diagnósticos, como reagentes de laboratório, podem atrapalhar.
O Ministério da Saúde anunciou que pretende ampliar de 32 mil para 22,9 milhões o número de kits de testagem no Brasil nas próximas semanas. Muitos dos quais (cerca de 8 milhões) serão exames sorológicos, sem muita utilidade clínica, mas úteis para estimar a incidência do vírus.

Quem procura acha

A relação entre testes de Covid-19 e casos confirmados

Países que realizam mais exames laboratoriais estão verificando, em média, uma incidência maior da doença
10.0009000800070006000500040003000200010009008007006005004003002001009080706050403020109876543210,90,80,50,40,20,10,70,60,3Casos de Covid-19 por milhão de habitantes100.00090.00080.00070.00060.00050.00040.00030.00020.00010.00090008000700060005000400030002000100090080070060050040030020010090807060504030201098765Testes realizados por milhão de habitantesFOFOISISITITNONOATATESESEEEEDKDKKRKRBHBHQAQASISIIRIRSESEBEBEFRFRFIFICZCZILILLVLVDEDEIEIEGBGBKWKWUSUSMYMYAUAUAMAMCHCHSKSKMTMTPAPAHRHRLTLTROROCRCRPLPLHUHUAEAENLNLPSPSJPJPTWTWBYBYTHTHZAZACOCOPHPHPKPKRURUVNVNIDIDUAUABRBRININ

Há mais sinais de que as infecções no Brasil estão subestimadas. Um levantamento feito pela London School of Hygiene and Tropical Medicine se baseou nas taxas de letalidade para estimar subnotificação em países. O Brasil estaria detectando apenas de 8% a 18% dos casos reais.

— Algum grau de subnotificação vai existir, mas é preciso ter estimativas melhores de incidência para poder planejar melhor as medidas de contenção e medidas de isolamento — afirma Raquel Stucchi.

Segundo a pesquisadora da Unicamp, uma maior disponibilidade de testes poderia permitir que, mais para a frente, o isolamento social fosse flexibilizado. Em tese, mais pessoas poderiam ser dispensadas de quarentenas se fossem testadas por sorologia e se os médicos constatassem que elas já foram infectadas, já convalesceram e criaram imunidade contra o novo coronavírus.

Fonte: O Globo (27/03/2020)

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