quarta-feira, 8 de maio de 2024

INSS: Previdência acende luz amarela com menos de dois contribuintes por cada beneficiário

 


Nova reforma da previdência a vista

O Brasil tem hoje menos de dois contribuintes para cada beneficiário da Previdência Social, razão que deve se deteriorar nas próximas décadas, fazendo com que, a partir de 2051, haja mais segurados do que pessoas contribuindo ao sistema previdenciário, aponta estudo publicado nesta semana pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A estimativa considera todos os regimes previdenciários (RGPS, RPPS e militar) e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), mas não considera demais benefícios como auxílio-maternidade e o antigo auxílio-doença (atual auxílio por incapacidade temporária).

O estudo aponta que a relação caiu de 2,26 contribuintes para cada beneficiário em 2012 para 1,97 em 2022, dado mais recente disponível. Já as projeções feitas apontam que a razão cairia para 0,99 em 2051 e chegaria a 0,86 em 2060, último ano projetado. Em outras palavras, mantendo-se inalterada as condições, haverá mais beneficiários do que contribuintes para a Previdência Social a partir de 2051.

Em números absolutos, a estimativa é que o total de beneficiários de aposentadoria, pensão por morte e BPC cresceria do patamar de 31,4 milhões, em 2022, para 61,2 milhões, em 2051, e alcançaria 66,4 milhões, em 2060, ou seja, mais que dobraria no intervalo de quase quatro décadas. Já o projetado de contribuintes da Previdência passaria de um total de 61,8 milhões (2022) para 60,6 milhões em 2051 e 57,2 milhões em 2060. Ou seja, a tendência é que o total de contribuintes caia ao longo do tempo, enquanto o número de segurados mais do que dobre.

Os pesquisadores Rogério Nagamine e Graziela Ansiliero, autores do estudo, observam que a piora da relação entre contribuintes e beneficiários vem ocorrendo devido ao processo natural da maturação dos regimes previdenciários e ao rápido e intenso envelhecimento populacional. Outro fator que explica a piora do indicador é o aumento do número de não contribuintes, devido à informalidade, ao desemprego e à inatividade.

Mais da metade da população (55,5%) em idade de trabalhar (homens de 20 a 64 anos e mulheres de 20 a 61 anos) não estava contribuindo para a Previdência Social em 2022, segundo os pesquisadores. Em termos absolutos, de um total de 129,5 milhões de pessoas em idade de trabalhar, apenas 58,9 milhões eram contribuintes (45,5% do total) e 70,7 milhões não contribuíam (55,5% do total).

Saída seria elevar idade mínima e reajustá-la conforme evolua a sobrevida"— Luís Eduardo Afonso

“Com essas tendências demográficas, o esperado é que nas próximas décadas o incremento do total de beneficiários não apenas siga em ritmo superior ao do total de contribuintes como também pode-se chegar a uma situação de estagnação ou até mesmo retração desse último grupo tendo em vista a esperada diminuição da população em idade de trabalhar”, escrevem os pesquisadores.

O estudo foi feito a partir de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, projeção populacional elaborada pelo IBGE em 2018 (dado completo do Censo Demográfico de 2022 ainda está indisponível) e de registros administrativos dos regimes previdenciários. “A tendência de piora na relação entre contribuintes e beneficiários é o principal diagnóstico e tende a se manter mesmo com uma nova projeção da população, cujos resultados podem, inclusive, piorar ainda mais o indicador”, destacam os pesquisadores.

Especialistas em Previdência Social concordam que a razão entre o número de contribuintes e beneficiários tem caído ao longo dos anos devido ao envelhecimento da população brasileira e menor taxa de fecundidade. Se medidas não forem adotadas, a situação, na avaliação dos especialistas ouvidos pelo Valor, poderá se deteriorar ainda mais diante do aumento do número de trabalhadores temporários com contratos fixos ou de plataformas on-line, o que vem sendo chamado de “gig worker”.

No estudo, Nagamine e Graziela também calculam uma estimativa de qual seria a alíquota necessária para custeio integral da Previdência Social, considerando as contribuições feitas pelos trabalhadores e empregadores. Essa alíquota seria de 32,2% em 2022 e chegaria a 73,6% em 2060.


O especialista em Previdência Luís Eduardo Afonso, professor associado da Faculdade de Economia e Administração da USP (FEA/USP), explica que a razão entre beneficiários e contribuintes é o que faz a alíquota necessária para custeio da Previdência estar estimada em mais de 70% em 2060. Na avaliação dele, uma das saídas para evitar isso seria aumentar a idade mínima e instituir mecanismo de ajuste automático dessa idade conforme a evolução da sobrevida. “Não tem bala de prata”, frisou o especialista.

Afonso ainda recomenda que o governo adote medidas de estímulo à formalização para elevar o número de contribuintes, com avaliação de resultado dessas políticas, ou seja, diferente do que acontece hoje no MEI (microempreendedor individual).

O ex-secretário de Previdência Leonardo Rolim defende a implementação do regime de capitalização no RGPS, que atende os trabalhadores da iniciativa privada, para dar sustentabilidade ao sistema no longo prazo. “Os regimes mais sustentáveis do mundo têm camada de capitalização”, ressaltou, lembrando que a proposta original de reforma da Previdência de 2019 havia essa previsão, mas medida acabou sendo retirada do texto.

Para ampliar a taxa de fecundidade, Rolim propõe que o governo promova uma política no mercado de trabalho que dê maior proteção à mulher, como previsão do salário-maternidade por mais tempo e benefício previdenciário maior para mulheres com mais de um filho. Ele ressalta que dificilmente as mulheres voltarão ter seis ou sete filhos, mas medidas como essa poderiam contribuir para a melhora do indicador.

Todas as projeções feitas pelo estudo, dizem os pesquisadores do Ipea, servem como alerta para a necessidade de medidas que visem garantir no longo prazo o adequado financiamento da seguridade social. “Atualmente o debate político parece estar focado em pautas de curto prazo, sem qualquer preocupação com o financiamento de médio e longo prazos”, escrevem.

Fonte: Valor (06/05/2024)

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