sábado, 16 de maio de 2020

Meu Bolso: Com a queda dos juros, vale investir possíveis sobras em CDBs de banco médios?


Rentabilidade oferecida por esses bancos passou de 118,70% do CDI em 2014, em média, para 128,70% neste ano, com a taxa Selic na mínima histórica. Nos grandes bancos o máximo é 96% do CDI.


Que a renda fixa remunera cada vez menos o investidor não é novidade para ninguém. Com a Selic em 3% ao ano e indicações de que vêm mais cortes por aí, os bancos precisam oferecer taxas atraentes em seus CDBs (Certificados de Depósito Bancário) se quiserem captar o dinheiro dos investidores.

O esforço precisa ser ainda maior por parte dos bancos médios, afinal, investir em um CDB é emprestar dinheiro para uma instituição financeira e um banco grande tem bem menos chance de dar um calote.

“Banco médio vive de linha de crédito e, se a captação está mais cara, é um desafio enorme para se mostrar viável", afirma um gestor que prefere não ser identificado.

Com risco maior, os bancos médios tradicionalmente oferecem maior rentabilidade em seus CDBs. O tipo de remuneração mais comum é aquela atrelada ao rendimento do CDI (Certificado Depósito Interbancário) e a porcentagem paga veio subindo conforme a taxa básica de juros caía.


Em 2014, quando a Selic variou entre 10,50% e 11,75% ao longo do ano, a remuneração média dos CDBs de bancos médios foi de 118,70% ao ano, conforme levantamento da Yubb, plataforma de busca de investimentos.

No ano passado, quando a taxa de juros oscilou de 6,50% a 4,50%, a rentabilidade média dos CDBs foi de 124,50% ao ano.

Em 2020, em que a Selic já desceu a 3% ao ano, os bancos médios têm oferecido, em média, 128,70% de retorno.

Confira o desempenho
Remuneração de CDBs de bancos médios X Selic
AnoMédia de rentabilidade bruta*Selic média**
2014118,70%11,03%
2015115,30%13,63%
2016116,10%14,16%
2017119,50%9,84%
2018121,20%6,53%
2019124,50%5,88%
2020***128,70%3,67%


Só que investimento não é leilão. Logo, não é para sair distribuindo seu suado dinheirinho para - apenas - quem paga mais.
Até porque, os 120% do CDI de hoje não enchem o bolso do investidor como acontecia anos atrás.
Ulisses Nehmi, sócio da gestora Sparta, lembra que o investidor tem em mente ainda um grande retorno ao se falar de rendimento de 110%, 120% do CDI, mas com a Selic na mínima histórica, a remuneração é baixa.

Além da rentabilidade baixíssima, o dinheiro fica imobilizado por muito tempo, já que esses CDBs de bancos médios, que geralmente oferecem maior rentabilidade, costumam ter vencimentos acima de dois anos.

“O investidor abre mão da liquidez por um prazo grande para conseguir uma remuneração melhor”, afirma Nehmi.

O que olhar ao escolher um CDB?
Assim como nas ações, o investidor deve olhar os fundamentos da empresa (no caso banco) que está oferecendo o CDB. Quanto maior a rentabilidade, provavelmente o risco também é maior.

“Tenho grandes preocupações com bancos médios que não conseguem levantar recursos com investidores institucionais", aponta um gestor que prefere não ser identificado.

Há alguns indicadores disponíveis nos balanços dessas instituições para te ajudar na escolha.

"Para começar precisa olhar se o banco está dando prejuízo. Se sim, já pode descartar. Caso não tenha prejuízo recente, é preciso estudar de onde veio o lucro, se de operações recorrentes ou não recorrentes. Vários bancos médios só não reportaram prejuízo porque utilizaram de manobra não recorrente", explica Marilia Fontes, especialista em renda fixa da Nord Research.

Item não recorrente em balanços é algo que não é rotineiro, ou seja, não deve se repetir nos próximos resultados.

Marilia também prefere os bancos que atuam em um nicho específico e se mostrem rentáveis naquela área, em vez daqueles que tentam "abraçar o mundo" em suas operações.

Outro indicador que Marilia recomenda ter atenção é o índice de Basileia dos bancos, uma espécie de medidor da saúde financeira dos bancos e financeiras. Ele mostra quanto os bancos estão se expondo aos riscos do mercado

A recomendação internacional é um mínimo de 8% para Basileia. O Brasil exigiu até mais (11% no mínimo) por um tempo. Contudo, como as regras ficaram mais rígidas, o mínimo exigido foi, aos poucos, diminuindo e, a partir de 2019, passou a ser de 8%.
Só que atingir a nota mínima para "passar de ano" é pouco para passar no crivo de Marilia Fontes. Ela orienta que os investidores busquem por bancos com Índice de Basileia de, no mínimo, 15%. Você pode consultar o Índice de Basileia de todos os bancos atuantes no Brasil no site do Banco Central.

Outro indicador que pode dar pistas sobre a saúde financeira do banco é a carteira D-H, que reúne empréstimos com atraso de mais de 61 dias nos pagamentos e duração de até três anos e financiamentos mais longos e atrasos acima de 121 dias.

Para Marilia, esse tipo de crédito concedido deve representar, no máximo, 7% da carteira de crédito do banco.

Além disso, é importante ficar de olho na nota dada pelas agências de classificação de risco aos CDBs que você tem interesse.

Essa nota, que a maioria dos títulos tem, busca apontar quais as chances de o banco que emitiu o CDB te dar o calote. Ou seja, se o risco da aplicação é baixo ou elevado. É importante saber que essa nota pode mudar ao longo do período de aplicação.

Como o CDB atrelado ao CDI é pós-fixado, ele têm como aliada certa proteção natural contra mudanças na economia.

Isto porque as taxas do CDI passam por ajustes diários e, em caso de choque inflacionário, o Banco Central tende a elevar a Selic para tentar segurar o aumento generalizado de preços. O que uma coisa tem a ver com a outra? A taxa do CDI segue de perto a Selic.

Colchão de segurança (?)
Muita gente acredita que o fato de o CDB ser protegido pelo FGC (Fundo Garantidor de Créditos), uma espécie de seguro para algumas aplicações de renda fixa, é garantia suficiente para colocar seu dinheiro no CDB que pagar mais.

Mas não é bem assim. Para começar, esse pagamento não é infinito. Assim como o seguro de um carro, o valor garantido pelo FGC aos investidores segue algumas regras.

A primeira delas: o pagamento é de até R$ 250 mil por pessoa física, e isso inclui não só o dinheiro que você investiu, mas também a rentabilidade.

Outro ponto importante é que esses R$ 250 mil estão limitados a conglomerados financeiros. Ou seja, se você tiver dinheiro aplicado em diversos CDBs emitidos por um mesmo banco que venha a falência, o teto para a restituição do seu investimento também é de R$ 250 mil.

Se você tiver R$ 300 mil em um ou mais CDBs emitidos pela mesma instituição financeira, por exemplo, e ela quebrar, o FGC pagará apenas R$ 250 mil e os outros R$ 50 mil serão perdidos.
Se o investimento estiver dentro desses limites então pode investir sem medo? Não exatamente.
Marília explica que o risco de depender do FGC em tempos de crise, como o atual, é maior. "O FGC tem 2,3% do dinheiro que ele garante em disponibilidade. Ele funciona como um seguro, então nunca tem 100% do que garante porque nunca 100% de sinistros vão acontecer, mas se mais de 2,3% quebrar, não vai ter dinheiro disponível. É um risco que o investidor corre", diz Marilia.

A analista destaca que 2,3% de garantias em momentos de crescimento da economia são mais do que suficiente, já em momentos de crise pode faltar caixa.
"Na crise do 'subprime' [dos EUA, em 2008], mais de 6% do sistema bancário quebrou e o FGC deles também quebrou. A diferença é que o FGC deles é público, o nosso é privado e controlado pelos bancos. Em situação de crise, o pequeno investidor fica muito exposto", diz.
Os analistas da XP Investimentos, Camilla Dolle, Lucas Genoso e Mirian Abe, avaliam que a última crise fez com que a maioria dos bancos adequasse melhor suas carteiras, pulverizando mais os riscos e elevando os critérios de concessão de crédito, o que reduz os riscos de inadimplência e, por consequência, de quebradeira.

Dessa forma, apesar de haver atualmente maior incerteza em relação ao setor bancário, os analistas da XP acreditam que essas aplicações oferecem segurança ao investidor que busca rentabilidade mais elevada e pode permanecer dentro dos limites de garantia do FGC.

"Sugerir ao investidor pequeno, que vai colocar R$ 10 mil, R$ 50 mil, olhar balanço é exigir demais. Por isso, o papel do FGC é tão importante. Aí o investidor compara taxa e prazo", afirma Pedro Barbirato, diretor de produtos do Modalmais.

Mas é importante ter em mente que, em caso de falência do banco, o FGC leva, em média, cerca de 90 dias para ressarcir o investidor, conforme os dados históricos. Marilia destaca que esse prazo pode aumentar se houver "fila" de bancos quebrados com a crise.

"Por este motivo, ao investir em bancos com maior risco de crédito, sugere-se não aplicar a reserva de emergência e ter disponibilidade de manter o valor aplicado até o prazo de vencimento", destacam os analistas da XP.

Para Marilia, se o dinheiro a ser investido é "pouco", ou seja, menos que os R$ 250 mil garantidos pelo FGC, é possível dividir a aplicações entre "dois ou três emissores seguros". Contudo, é preciso saber que esse dinheiro vai ficar "bloqueado" pelo prazo do vencimento do CDB. Se o banco quebrar, o FGC pode demorar a pagar e não há rentabilidade nesse período.

Já o gestor ouvido pelo Valor Investe, e que prefere não se identificar, diz que "não faz sentido correr esse risco. Você vai comprar um seguro sabendo que vai bater o carro? Melhor nem sair de casa”.

Não é tudo igual
Bancos médios não estão todos na mesma cesta, oferecendo os mesmos serviços. Assim, eles estão expostos a riscos específicos da área que atuam.

A equipe de análise de renda fixa da XP Investimentos separou os setores com os riscos médios e elevados. Confira:

Risco alto
Empréstimo Pessoal/Crédito Direto ao Consumidor/Cartão
A redução da atividade econômica em geral e o isolamento social deverão afetar gravemente o consumo e, consequentemente, a originação de empréstimos neste segmento.

Além disso, a redução de turnos e do quadro de funcionários nas empresa terá impacto sobre a renda das famílias, o que deverá levar a um aumento da inadimplência.

Financiamento de veículos
A redução da renda das famílias pode aumentar a inadimplência dos financiamentos já existentes.

Além disso, a originação de novos créditos para aquisição de veículos deve cair substancialmente, devido à menor confiança do consumidor e da adoção de critérios mais rígidos por parte dos bancos para a concessão desses créditos.

Empresas médias e pequenas
Com o cenário que se desenha, muitas empresas pequenas e médias já apresentam e devem continuar sofrendo com a queda das vendas e a falta de crédito para capital de giro.

A principal garantia que elas podem oferecer são duplicatas de vendas performadas, ativo que já está ficando escasso, uma vez que já é observada diminuição na atividade das empresas. Os impactos já devem ser sentidos no próximo trimestre.

Risco médio
Crédito consignado
O maior volume de crédito consignado existente foi concedido para funcionários públicos, aposentados e pensionistas, que contam com estabilidade de renda.

Além disso, a cobrança dos empréstimos é realizada por desconto diretamente na folha de pagamentos. Desta forma, não é esperado um aumento da inadimplência.

Por outro lado, assim como no caso dos empréstimos pessoais comuns, dependendo da duração da quarentena, a originação (ou seja, o aumento da carteira de crédito) poderá ser prejudicada, uma vez que depende, em sua maioria, da presença do tomador em lojas físicas.

Além disso, bancos menos eficientes podem ser prejudicados com a redução da taxa-teto de juros do consignado.

Empresas grandes
A expectativa é que empresas mais alavancadas e com dívidas em dólar tenham que renegociar linhas de crédito neste contexto.

Desta forma, o resultado dos bancos pode ser penalizado por menores receitas e maior provisão para devedores duvidosos (PDD).

Por outro lado, as empresas maiores e com melhor situação creditícia devem postergar investimentos, mitigando o risco de necessidade de renegociações.

CDBs x fundos de crédito privado
Com a Selic na mínima histórica, Ulisses Nehmi, da Sparta, considera que o investidor interessado em buscar ganhos acima do CDI na renda fixa procure por fundos de crédito privado, em que a liquidez é maior e o potencial de ganho também.
"CDB não me parece uma escolha feliz. Se for para ter um investimento mais conservador, até o Tesouro Selic pode ser uma alternativa mais interessante, pelo menos tem mais liquidez", avalia Nehmi.
Em favor dos fundos de crédito, ele destaca que mesmo que o fundo tenha resgate em D+30 (o investidor recebe o dinheiro 30 dias depois de pedir o resgate), a liquidez é bem maior do que nos CDBs.

Os fundos também conseguem chegar a CDBs que pagam mais ou são mais seguros. "No mercado secundário de CDB tem banco de primeira linha pagando bem mais que banco médio, mas o investidor tradicional não tem acesso", diz Nehmi.

Por outro lado, enquanto o CDB vai te pagar exatamente o prometido no fim do prazo, os fundos de crédito podem balançar e até ter desempenho negativo, como ocorreu recentemente.

Em março, a rentabilidade média desse segmento de fundos, segundo dados levantados pelo Valor Investe, foi de -1,54% e 80% das carteiras que compõem a categoria deram prejuízo, sendo a pior perda entre eles de -13,42%.

Essa movimentação não é habitual e o Valor Investe te mostrou que o motivo para essa chacoalhada foi uma combinação de fatores: turbulência econômica causada pela covid-19; aumento do risco de crédito das empresas emissoras de títulos de dívidas; certa paralisação do mercado secundário de dívida.
A crise atual também levou a uma mudança de postura do investidor. Muita gente correu para longe dos fundos de crédito privado.
Segundo dados da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), nos três primeiros meses do ano, esse segmento de fundos teve resgate líquido de R$ 36,6 bilhões, valor que só não foi mais alto porque, em março, um fundo exclusivo com recursos de um banco comercial (não identificado) captou R$ 7 bilhões.

Outro fator a colocar nesta "conta" de decisão de CDBs X fundos de crédito é o preço cobrado por essa terceirização de montagem de portfólio, a taxa de administração. Nehmi afirma que essas taxas para fundos de crédito privado costumam variar entre 0,5% e 0,8%.

Assim, qualquer valor acima disso merece uma "luz amarela": ou está caro ou a rentabilidade buscada - e entregue nos últimos anos - precisa ser superiores aos fundos concorrentes.

Os CDBs têm vantagens e desvantagens e, mesmo sendo uma aplicação de renda fixa, obter bons ganhos com eles passa longe de ser simples. Pese os prós e contras apontados pelos especialistas antes de tomar sua decisão.

Fonte: Valor Investe (15/05/2020)

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