O segmento da previdência complementar no Brasil cada vez mais vem se intensificando ao longo dos últimos anos, especialmente, quando se trata da previdência complementar fechada, aquela voltada para um grupo de trabalhadores específico e que tem Plano de Benefícios de caráter previdenciário patrocinados por seus respectivos empregadores.
No mercado, atualmente, temos 3 (três) tipos de modalidades de Planos de Benefícios, isto, no âmbito das entidades fechadas de previdência complementar, quais sejam, o de Benefício Definido – BD (tem caráter mutualista entre Participantes e Assistidos. coletividade), o de Contribuição Definida – CD (na sua essência tem a reserva acumulada em saldo de contas. individual) e o de Contribuição Variável – CV (uma espécie de modalidade híbrida, mistura características de BD e CD em relação aos benefícios programados).
Pela leitura do texto constitucional e da legislação peculiar ao regime de previdência complementar, depreende-se que a inscrição em Planos de Benefícios se dá de forma expressa e facultativa. Doutro lado, o regime de previdência oficial (RGPS/RPPS), em que, face a atividade laborativa, lícita e remunerada, implica na filiação de forma obrigatória e automática. A exemplo disto, são os trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho, os quais se submetem ao Regime Geral de Previdência Social (INSS), de caráter contributivo, independentemente, da vontade ou ato formal do trabalhador.
É cediço que, para um Plano de Benefícios entrar em vigor e, até mesmo, ser operado pelas EFPC, há todo um arcabouço jurídico envolvido na matéria. A legislação previdenciária aplicável ao assunto traz consigo inúmeras regras, diga-se, mínimas, para a composição regulamentar de um Plano e, para sua implementação, deve ser submetido, previamente, à apreciação do órgão governamental competente, o qual, hoje, leia-se, Superintendência Nacional de Previdência Complementar – PREVIC, para, depois, resultar em direitos e obrigações entre Entidade, Patrocinador, Participante e Assistido.
O chamado contrato previdenciário (Regulamento do Plano de Benefícios), ainda que aprovado pelo órgão governamental competente, é passível de fiscalização a qualquer momento, sendo a EFPC responsável por eventuais afrontas ao referido instrumento, e, consequentemente, suportará as sanções previstas no âmbito administrativo e/ou judicial.
A partir da contextualização acima, surge a seguinte pergunta: se as EFPC, e os respectivos Planos de Benefícios por ela administrados, passaram pelo crivo legal para, posteriormente, serem operacionalizados, podem ser objeto de fiscalização pela autoridade governamental competente a qualquer momento, assim como precisam prestar contas aos seus Participantes, Assistidos, Patrocinadores e à PREVIC, o que leva a justificar o elevado número de ações judiciais, no presente momento, além de terem surgido várias reclamações formuladas perante o Ministério Público, geralmente provocadas por associações de aposentados?
As principais entidades de previdência complementar fechada têm acompanhado de perto o expressivo aumento de contendas judiciais e, muitas delas distribuídas em boa parte do território nacional, haja vista a particularidade dos Patrocinadores que contemplam funcionários lotados ao longo de todo o Brasil, sendo que determinadas demandas versam sobre idêntica matéria. Praticamente, um Ctrl “C”/Ctrl“V” nas petições iniciais, sendo que a experiência demonstra o fato de, às vezes, nem o nome da parte autora ter sido substituída corretamente, dado o elevado volume de demandas protocolizadas no Poder Judiciário, por uma mesma banca jurídica.
Para os operadores do direito, que atuam no sistema de previdência privada fechada, especialmente, nas defesas das EFPC, sãos inúmeras as matérias enfrentadas nas ações judiciais que envolvem Planos de Benefícios. Pode-se perceber que os pleitos não observam os ditames regulamentares e a legislação de regência e, vão mais além, não respeitam as características peculiares envolvidas neste tipo de regime previdencial e invocam supostos direitos na esfera judiciária.
Os postulantes, até mesmo por não buscarem conhecer as nuances técnicas exigidas da matéria, confundem correções de benefícios ou de valores decorrentes de resgates, buscando a equiparação aos chamados “expurgos inflacionários”, estes suscitados em demandas judiciais voltadas às cadernetas de poupança. Requerem, inclusive, a devolução das contribuições vertidas por seus Patrocinadores, sendo que a norma determina apenas a devolução das parcelas recolhidas ao Plano pelo Participante, em sede de resgate.
As questões trazidas ao Poder Judiciário, no tocante às EFPC e os Planos de Benefícios por elas administrados, é de tamanha magnitude, chegando ao ponto de a corte suprema deste país (STF) ter que bater o martelo, em sede de repercussão geral, para que dispositivos constitucionais não fossem afrontados. Sob este aspecto, Participantes e Assistidos, com o fito de obterem a majoração de suas reservas nos Planos de Benefícios, traziam temas relacionados ao Direito do Trabalho, de modo que fossem, forçadamente, reconhecidos pelo Direito Previdenciário (previdência complementar), chegando a se discutir de quem era a competência para processar e julgar tais contendas judiciais (Justiça Federal do Trabalho x Justiça Comum).
Outro ponto de extrema preocupação para as Entidades Fechadas de Previdência Complementar, frisa-se, derivada de ações judiciais promovidas por Participantes e Assistidos, é a aplicabilidade da Lei nº 8.078/1990, bem conhecida pelos brasileiros como Código de Defesa do Consumidor, nos contratos previdenciários, sendo certo que a previdência privada fechada não tem fins lucrativos, além de ser regulada e fiscalizada por lei e órgão governamental específicos e, consequentemente, não se deve confundir com as relações comerciais mantidas com as Entidades Abertas de Previdência Complementar, pois, estas sim, visam o lucro e têm tratamento diverso das EFPC.
Os objetos das contendas propostas por Participantes e Assistidos vinculados a Plano de Benefícios, de natureza de previdência fechada, têm um grau de complexidade tão elevado, que muito dos magistrados não se sentem à vontade para prolatarem a Sentença antes de ouvirem um experto na área. Neste sentido, designam Perito Atuarial para lhes auxiliar na demanda judicial com a apresentação de estudo técnico, uma vez que os Juízes se preocupam com a manutenção do equilíbrio financeiro e atuarial do Plano de Benefícios, pelo fato de ter sido formulado pedido na contramão do que é disposto no Regulamento correspondente ao Plano questionado.
Demandas judiciais em excesso prejudicam os interesses do sistema de previdência complementar. Em Planos de Benefícios albergados pelo princípio do mutualismo, tais como, os Planos estruturados na modalidade de Benefício Definido (BD), em que impera a coletividade para assegurar a concessão e a manutenção dos benefícios regulamentares, as aventuras processuais afetam a saúde financeira do Plano, visto que as EFPC são apenas administradoras dos recursos vertidos por Participantes e Patrocinadores. Significa dizer que, é Participante em conflito com os demais Participantes, quando acionam a máquina judiciária sob o fundamento de preservarem prováveis direitos.
Como visto em linhas pretéritas, têm demandas judiciais espalhadas ao longo do Brasil e de todos os tipos. Por outro lado, chega aos nossos ouvidos que em outros países a realidade é bem diferente, em se tratando de demandas judiciais promovidas por Participantes e Assistidos. A título de exemplo, dados demonstram que a adesão a Plano de Benefícios se dá de forma obrigatória, mediante acordo sindical, na Suécia e Holanda, e nem por isto é motivo para Participantes ingressarem com ações judiciais. Pelo contrário, a filiação obrigatória nos anteditos países se revelam um grande sucesso e excelente política de fomento da previdência complementar. Tudo isto, por uma simples questão cultural associada a uma forte expansão da educação previdenciária.
Ainda sobre a Holanda, pode-se dizer que o mercado de fundos de pensão se destaca por ser um dos mais desenvolvidos do mundo. Conforme OCDE (2011), os ativos dos fundos de pensão da Holanda representavam 138,2% do PIB daquele país. A não adesão aos planos setoriais (plano por meio de acordo coletivo) é possível, desde que o empregador forneça um plano corporativo (iniciativa do empregador para todos ou parte de seus empregados), com benefícios ao menos em um nível equivalente ao plano setorial. Logo, por que os Participantes e Assistidos vinculados a Planos de Benefícios operados pelas EFPC acionam demasiadamente a máquina judiciária brasileira, se ingressam nos Planos, voluntariamente, conforme determinado pela nossa Magna Carta, tendo acesso ao Estatuto da EFPC, ao Regulamento e demais documentos relacionados ao Plano, os quais, também, são franqueados o acesso ao órgão fiscalizador competente?
A bem da verdade, o que poderia se ver numa previdência complementar fechada, mas é o que não se espera, são as Entidades Fechadas de Previdência Complementar procurando solucionar conflitos na esfera judicial/administrativa, em face dos terceirizados, tais como, empresas de consultoria, empresas de investimentos, auditores, entre outros prestadores de serviços, isto, no caso de ocorrer ofensa contratual, pelo fato de tais EFPC serem as zeladoras das contribuições vertidas por Participantes, Assistidos e Patrocinadores, segundo previsto nos ditames regulamentares e no Convênio de Adesão.
Desta feita, é notória a judicialização dos Planos de Benefícios de caráter previdenciário, notadamente, aqueles operados e administrados pelas Entidades Fechadas de Previdência Complementar, o que não é visto um volume excessivo do contencioso se compararmos o Brasil com outros países, a exemplo disto, já comentamos acima a respeito da Holanda. Consequentemente, isto reforça a insegurança jurídica nas EFPC, o que não se espera.
E o que fazer para mudar este cenário? Será que falta aos Participantes e Assistidos se conscientizarem e conhecerem melhor o seu Plano de Benefícios e sua EFPC? Será que as EFPC podem atuar preventivamente, de modo a mitigar novas ações judiciais, e buscar solucionar as que estão em andamento? Pois bem, como política de fomento do regime de previdência complementar, as EFPC precisam olhar para dentro de casa e promoverem uma interlocução mais de perto com Participantes e Assistidos, caso ainda não tenham atuado neste sentido, como forma de minimizar os riscos jurídicos correspondentes a Planos tão reclamados nas vias judiciais.
É necessário que Participantes e Assistidos reflitam com profundidade se a justiça é um caminho viável e adequado para dirimir eventuais conflitos envolvendo o seu Plano de Benefício. Não se afasta a ocorrência de que a EFPC possa, eventualmente, prejudicar o direito de Participante ou Assistido. Seria muita ingenuidade pensar que as EFPC não cometem erros, num segmento tão vasto de Plano de Benefícios em plena atividade. Se direitos são afrontados, obviamente, é merecedor que haja reparo pelo agente causador do dano. Entretanto, o que estamos assistindo no momento é a uma enxurrada de ações judiciais sem a vinculação a efetivos direitos, o que, por sua vez, apresentam-se como meras aventuras processuais, por muitas vezes se encontrarem ausentes de respaldo legal.
Fonte: Gama Consultores (30/09/2014)
Nota da Redação: Se houvesse por parte das EFPC's o respeito ao contrato previdenciário, que é o regulamento do plano vigente na data em que o participante adquire a elegibilidade à aposentadoria mesmo sem ter se aposentado, que garante legalmente seus direitos adquiridos e acumulados, a judicialização seria muito minimizada.
sexta-feira, 3 de outubro de 2014
Direito Previdenciário: Desafio da judicialização, no âmbito das EFPC. Por que o Brasil se destaca negativamente, se comparado a outros países?
Postado por
Joseph Haim
às
12:16:00
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Direito Previdenciário,
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