Alta dos juros torna desconto oferecido menos atraente, mas há quem prefira priorizar o planejamento e antecipar a quitação
Com a aproximação de um novo ano, muitos já começam a preparar os bolsos para arcarem com despesas como o IPTU e o IPVA, que começam a ser cobrados a partir de janeiro. No entanto, com uma prévia de inflação acumulando alta de 10,42% em 2021 e com projeções desfavoráveis para 2022, o contribuinte pode se questionar se realmente vale a pena correr atrás dos descontos oferecidos pelas cidades e estados para aqueles que decidirem quitar as dívidas em uma única parcela, em vez de dividirem o valor ao longo dos meses.
A resposta para esse questionamento, contudo, não é tão simples e divide opiniões de especialistas. Para o professor de finanças pessoais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), William Eid Junior, é preciso levar em conta outros fatores, como a alta na taxa básica de juros, a Selic, agora em 9,25%, que pode tornar vantajoso o parcelamento da dívida a longo prazo.
— É mais vantagem parcelar porque a Selic subiu e a taxa de juros cobrada no parcelamento está menor — explica Eid. — Talvez uns 12% a 13% de desconto pudesse tornar o pagamento à vista mais atraente para o contribuinte.
O desconto sugerido pelo professor não é o que a maioria dos estados e capitais estão oferecendo. No Rio de Janeiro, por exemplo, quem optar por não parcelar a dívida do IPVA vai receber um desconto de 3% no valor total. Em Minas Gerais, esse desconto pode ultrapassar os 3% para contribuintes que se mantiveram regulares por dois anos consecutivos, mas ainda não chega ao patamar indicado pelo professor.
— Eu sempre tento guardar parte do décimo terceiro para pagar o IPVA em parcela única no começo do ano e me livrar logo disso, mas além de ter ficado mais caro, agora não sei se vale mais a pena fazer isso — conta a professora de inglês Vanessa da Cunha, moradora de São Paulo, onde o desconto oferecido é de apenas 3%.
Com o IPTU não é muito diferente nas principais capitais do país. Mesmo em cidades como Recife (PE) e no Distrito Federal (DF), em que os descontos para o pagamento em cota única do IPTU podem chegar a até 10%, o professor ainda sugere o parcelamento da dívida.
— Pegamos o Rio de Janeiro, por exemplo, onde esse desconto é de 7%. Podemos considerar que o rendimento de renda fixa de uma aplicação sem risco seja por volta de 10 a 11% ao ano. Dessa forma, se eu parcelar um IPTU de R$ 1 mil e aplicar o valor em um rendimento desses, ao final de 10 meses, eu ainda teria por volta de R$ 145 na conta — explica Eid.
No caso do Rio de Janeiro, no entanto, o cenário pode se tornar mais favorável caso o contribuinte também tenha feito a Declaração Anual de Dados Cadastrais (DeCAD), cuja dedução é de 5% — o que significaria um acumulado de 12% de desconto no final das contas. Esse valor pode subir ainda mais, podendo ser superior a 40%, caso o imóvel seja um dos mais de 60 mil contemplados por um decreto que garante um abatimento do valor em determinadas regiões da cidade.
Na opinião do especialista em finanças e diretor de pós-graduação no UniAnchieta, Filipe Pires, e do professor de finanças do Insper, Ricardo Humberto Rocha, essa conta depende das reservas pessoais de cada um, o que pode tornar o cenário viável para eventuais antecipações de pagamento em alguns casos.
— De forma geral, quando a gente faz o cálculo em cima do que é oferecido, é melhor pagar à vista do que parcelado — aponta Rocha. — O grande problema é se você se preparou pra ter esse desembolso em uma única parcela.
De acordo com os especialistas, fazer dívidas para usufruir dos descontos não é a melhor opção, sobretudo com a possibilidade da Selic chegar aos dois dígitos já no começo de 2022, o que impacta diretamente no custo do crédito.
— É preciso lembrar que nem todos têm esse valor disponível para fazer uma antecipação. Nesse caso específico, o que deve ser levado em conta é o custo de captação de uma dívida para fazer jus aos descontos — explica Pires. — Sem a possibilidade de ter o valor já em conta e disponível, é pouco provável que alguém consiga pagar a cota única. É viável para quem já tem o valor total e possa se fazer valer desses descontos.
O diretor, ainda, traça um paralelo da situação atual com a época de hiperinflação, em que os trabalhadores corriam para os supermercados ao receberem os salários porque os preços eram remarcados diariamente, na intenção de gastar menos.
— Essa tomada de decisão nesse ano, mais do que nos demais, faz com que deixar o dinheiro parado signifique perder valor de poder de compra a curto prazo — afirma o diretor. — Tudo o que você consegue antecipar acaba diminuindo essa perda de poder de compra.
Fonte: O Globo (23/12/2021)
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