A digitalização parece não ter fronteiras. Para muitos usuários, uma boa parte das atividades do dia a dia já é mediada por um sinal digital, seja assistir TV na sala de estar ou usar o GPS no carro para traçar uma rota até o destino desejado. Talvez por isso surpreenda saber que no Brasil os aparelhos de PABX - as centrais telefônicas que as companhias usam para distribuir suas linhas de comunicação - ainda estejam com os pés fincados na era analógica. Independentemente do setor de atividade, as grandes empresas já fizeram a transição para o meio digital, adquirindo equipamentos mais modernos, mas as companhias de pequeno e médio portes resistem, por motivos diversos, a modernizar essa parte da infraestrutura.
A Intelbras, que fabrica telefones com e sem fio para todas as tecnologias, faz um estudo semestral sobre o setor para orientar seus negócios. Pelo levantamento mais recente, a companhia estima em R$ 250 milhões a receita do mercado neste ano com a venda de centrais telefônicas e a instalação dos aparelhos no segmento de até 300 ramais. Dessa receita, a expectativa é que o PABX analógico represente 79,2% dos negócios; o restante virá da telefonia por internet (IP).
O padrão analógico está perdendo espaço - a tecnologia representou 85,7% de uma receita total de R$ 210 milhões em 2012, e 92,7% dos R$ 180 milhões de 2011, segundo cálculos da Intelbras -, mas sua participação majoritária coloca o Brasil em uma posição distante de mercados mais avançados. O país se mantém cinco anos atrasado em relação às novas tecnologias adotadas nos Estados Unidos, disse Wendel Martins, gerente do segmento de médias centrais da Intelbras. Ele não revela a receita da companhia por segmento, mas adianta que a expectativa é fechar o ano com R$ 800 milhões em todas as áreas de atuação - com destaque para equipamentos de segurança -, 23% acima do valor apurado em 2012.
A receita da Leucotron, fabricante de centrais telefônicas, também está fortemente amparada na tecnologia analógica. Apesar de não revelar valores, Antônio Cláudio de Oliveira, diretor de negócios da companhia localizada no polo tecnológico de Santa Rita do Sapucaí, em Minas Gerais, disse que 70% da receita, hoje, vem de sistemas analógicos e 30% de IP. "Há dois anos, TDM [Multiplexação por Divisão de Tempo, como é conhecida a tecnologia analógica] representava 90% da receita", disse Oliveira.
A Damovo, sucessora da Ericsson Enterprise Systems do Brasil, que até 1999 era conhecida por Matec, vivia de receita recorrente de manutenção de PABX TDM. Ao perceber que a tecnologia entrava em declínio, à medida que os clientes migravam para IP, a companhia de capital britânico redirecionou sua estratégia a partir de 2009.
"O desafio foi adaptar e trocar o quadro de pessoal", disse o presidente da Damovo do Brasil, Alberto Ferreira. Há seis anos na empresa, nos últimos quatro o executivo iniciou a transformação, que passou por geração de demanda, reforço de parcerias e troca de funcionários. Hoje são 340 profissionais, 18% a menos que em 2009. Os líderes de cada área foram treinados para atuar no novo cenário de negócios. No mesmo período, a receita líquida cresceu 41%; atingiu R$ 100 milhões no primeiro semestre e a expectativa é fechar o ano com R$ 203 milhões, incluindo a entrada de novos clientes e as vendas para a carteira existente. Para o fim de 2016, Ferreira projeta R$ 450 milhões. Em parceria com a Cisco, a Damovo desenha, implanta e mantém as redes para os clientes. São redes privadas, em cada qual trafegam apenas os dados da empresa que contratou o serviço, gerenciadas em nuvem, método pelo qual os clientes têm acesso aos sistemas por meio de internet.
Apesar da grande participação da tecnologia analógica na receita dos fabricantes, é praticamente consenso que a tecnologia IP vai dominar o mundo dos PABX no prazo de cinco a sete anos. Com todos os serviços migrando para a internet, como transmissão de dados e imagem, especialistas consideram muito mais natural incluir voz na mesma plataforma. Em centrais telefônicas com mais de 300 ramais, cerca de 80% das empresas usuárias já adotam IP.
Maurício Vergani, diretor da unidade de negócios corporativos da Oi, diz que o mercado de voz pelas redes tradicionais de hoje tem o mesmo tamanho que poderá assumir o de telefonia IP. A velocidade da migração, diz o executivo, depende do vencimento dos contratos antigos e do custo de manutenção do atual parque analógico.
Por que o Brasil está tão atrasado no padrão IP em relação aos EUA, onde essa tecnologia é dominante? Para alguns executivos, as empresas usuárias têm um imenso parque legado de centrais telefônicas TDM, que já está pago e ainda funciona relativamente bem. Para dar sobrevida ao sistema, adotaram uma solução híbrida, que combina linhas analógicas com digitais. Para outros, são as operadoras de telefonia que colocam obstáculos para a expansão do IP, para evitar investimentos em novas redes. Além disso, IP requer equipamentos como servidores, aparelhos de telefone específicos e gerenciadores de chamadas, considerados caros.
Existe uma tensão na cadeia de valores. "Os fabricantes tentam convencer o cliente a usar IP para vender equipamentos e as operadoras a transformarem tudo em serviços. Mas os clientes não querem pagar o valor desse processo, pois no Brasil não há o costume de investir em equipamentos de telecomunicações, ao contrário de outros países", disse Vergani, da Oi. No Brasil, o cliente não vê o benefício claro para investir e a operadora não quer assumir esse custo. Por isso caminhamos para o 'cloud'."
Vergani se refere ao gerenciamento em nuvem, que dispensa o cliente de adquirir equipamentos e sistemas. Além disso, esse método é mais barato porque o cliente paga só pelo que usa. A Oi, que hoje só oferece telefonia tradicional, vai lançar seu sistema IP com gerenciamento em nuvem no primeiro trimestre de 2014. Vergani não adiantou valores, mas disse que será vantajoso para clientes que têm a partir de dez ramais.
Paralelamente, a tele testa uma tecnologia para que os celulares assumam automaticamente o papel de ramal fixo assim que o funcionário entra na empresa. Hoje, os sistemas disponíveis exigem que o celular seja programado cada vez que o colaborador entra no ambiente de trabalho, disse Vergani. Com o aplicativo, que vai funcionar por Wi-Fi, banda larga sem fio, será mais fácil, afirmou.
A comunicação tradicional de voz trafega em cabeamento de pares trançados de cobre que chegam ao domicílio dos clientes. O PABX analógico integra essas linhas e as distribui na empresa. A tecnologia evoluiu e é possível combinar linhas analógicas com digitais por meio de equipamentos e concepção de rede. A convergência tende a ocorrer por plataformas de comunicação que usam o protocolo internet, ou IP. Enquanto no analógico é preciso fazer adaptações para que seja criado um ambiente digital, em IP é possível trabalhar com todas as mídias - voz, dados e imagem - sem adaptações. Assim, os fornecedores podem oferecer plataformas puramente IP ou TDM (analógica), ou híbridas. Geralmente os usuários levam em conta o sistema legado na empresa, quanto tempo compensa usá-lo e o custo-benefício para a migração tecnológica. Como as centrais telefônicas tradicionais são robustas, a estimativa é que cada uma demore de 10 a 15 anos para exigir uma troca. Por isso, a não ser que haja uma explosão na passagem da era analógica e digital para IP, o que seria uma revolução, a tendência é que isso ocorra naturalmente, como se faz com um carro velho que ainda funciona, mas chega uma hora que é preciso trocá-lo por um novo para que trafegue sem problemas. As teles estão atentas ao movimento. A GVT informou ao Valor, por meio de nota, que trabalha em sistemas de PABX IP para todos os perfis de clientes. Suas linhas analógicas usam par de cobre ou fibra óptica e podem ter um link dedicado que estabelece 30 chamadas simultâneas. A Telefônica/Vivo, também por nota, informou que a maior parte dos equipamentos que adquiriu para as pequenas e médias empresas são híbridos e suportam voz convencional e IP. Afirmou que em breve lançará sistemas de voz sobre IP de forma massiva e que as redes IP integram seus investimentos de R$ 24,3 bilhões de 2011 a 2014. A Telefônica/Vivo disse que vendeu mais de 100 mil ramais IP nos últimos meses.
Fonte: Valor (21/10/2013)
segunda-feira, 21 de outubro de 2013
TIC: Na era digital, sistemas analógicos dominam a telefonia em empresas
Postado por
Joseph Haim
às
10:28:00
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