Em seus 247 anos de história, Campinas transformou sua vocação de atrair desenvolvimento em sua grande marca identitária. Se inicialmente ela cultivava o café como mola do seu crescimento econômico, já no século XIX – com o Instituto Agronômico de Campinas (IAC), fundado em 1887 – passou a cultivar também ciência, tecnologia e conhecimento, percurso que trilhou marcadamente no século XX fomentando o nascimento de universidades e centros de pesquisa. A Campinas do século XXI agora expande os caminhos abertos no passado e investe em seu maior patrimônio: a vocação para a inovação e os avanços tecnológicos.
Campinas é a quarta cidade mais inteligente e conectada do país, já tendo ficado em 1º lugar no ranking em 2019. Aqui, afinal, nasceu a fibra óptica (parceria entre Unicamp e CPqD – Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Tecomunicações) na década de 1970. E também em Campinas teve início o primeiro projeto de Big Science brasileiro, o Sirius, que está sendo construído pelo Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), criado nos anos 1980, um dos quatro laboratórios referências mundiais do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM).
Neste campo fértil, nas últimas décadas, nasceram duas das dez primeiras startups unicórnio brasileiras (nome dado às startups que em curto espaço de tempo se transformam em empreendimentos bilionários): Quinto Andar e Movile (que controla marcas como iFood, PlayKids, Sympla, entre outras empresas) – veja entrevista exclusiva com co-fundador Fabrício Bloisi. Não é por acaso que Campinas passa pela história de várias startups unicórnio, onde atuam importantes executivos com formação ou experiência nas universidades da cidade e nos institutos de pesquisa.
Berço de startups
Dentro deste cenário, a Campinas Tech (Associação Campinas Startups) propõe fazer da cidade o berço de startups do Brasil. A ideia foi apresentada pessoalmente à Prefeitura Municipal de Campinas no último dia 5 de julho, em forma de manifesto.
“Campinas tem uma densidade de conhecimento e capital intelectual muito grande. Nós acreditamos que não há na América Latina outra localidade com este perfil tão forte, onde você pode estimular o empreendedorismo na base. O que falta é um aglutinador que faça a conexão dos diversos atores”, afirma José Eduardo Azarite, vice-presidente de Ecossistema Empreendedor da Campinas Tech, entidade sem fins lucrativos criada em 2010 com o objetivo de unir forças para dar suporte a startups de base tecnológica na região.
Azarite acredita que, desde que haja uma articulação com o poder público, Campinas tem as condições ideais para ser reconhecidamente o maior berço de startups do País. “Mas, apesar de ter tudo isso, Campinas ‘cacareja’ muito pouco”, diz Azarite, comparando a outros importantes polos nacionais semelhantes à cidade, como Porto Alegre (RS), Recife (PE), Santa Rita do Sapucaí (MG) e Florianópolis (SC).
“Levamos esta provocação para a Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SDE)”, diz Azarite, que entregou o manifesto, junto com o presidente da Campinas Tech, Omar Ferroni Branquinho, nas mãos de Adriana Flosi, secretária municipal de Desenvolvimento, e Newton Frateschi, responsável por Ciência, Tecnologia e Inovação da mesma secretaria. Ambos foram receptivos à proposta. “Recebemos o manifesto da Campinas Tech, que está alinhado com os projetos da SDE, principalmente no que tange às questões de posicionamento, desburocratização, educação e comunicação”, afirmou a secretária. Para Frateschi, é importante estabelecer Campinas como um grande ambiente de Ciência e Tecnologia.
Educação e inclusão
De acordo com Azarite, a cidade tem os requisitos necessários, mas é preciso expandir no âmbito da educação. “O cidadão comum não está tão informado sobre isso, ele não conhece estas oportunidades, precisamos levar esta informação à sociedade, criar processos mais inclusivos, porque há muitos empreendedores por aí. A Campinas Tech promove programa de capacitação, e já capacitou para o mercado de trabalho milhares de pessoas. As empresas de base tecnológica precisam de mão de obra, por isso a educação é um viés importante”, defende. ”A inclusão deve acontecer em todos os âmbitos, de raça, gênero, orientação sexual, e não apenas no econômico”, completa Azarite.
“Precisamos levar o nome de Campinas como berço de startups. Se sairmos na frente com uma narrativa positiva, aliada à densidade de competência que nós temos, poderemos atrair empreendedores do Brasil e da América Latina para começarem suas startups aqui”, acredita o vice-presidente da Campinas Tech. “Isso mexe com a economia da região.” Segundo ele, as empresas-filhas da Unicamp, por exemplo, movimentam R$ 8 bilhões por ano, das quais cerca de 75% permaneceram na região. “A logística e a localização também favorecem”, afirma Azarite, ex-aluno de Química da Unicamp e ex-pesquisador do CPqD, que desde os 18 anos mora na cidade e se considera campineiro.
O diretor de Inovação do CPqD, Paulo Curado, compactua da mesma visão de Azarite. “Campinas tem muitas instituições que compõem este ambiente ideal para startups. Falta concatenar estes atores, todos relevantes, e colocá-los na mesma direção, para que cooperem mais entre eles e criem o ambiente ideal para inovação. Desta forma vamos atrair mais capital privado e mais investimento”, diz Curado, que trabalha no CPqD há 35 anos. “A prefeitura tem papel importante nisso. Já temos um sistema de educação invejável, gente capacitada e espírito empreendedor.”
Criado pelo governo federal na década de 1970 para o desenvolvimento de tecnologia nacional nas telecomunicações, o CPqD completa agora 45 anos. Empresa 100% nacional, estabeleceu-se em Campinas justamente pela concentração de profissionais capacitados e por ser celeiro de produção de conhecimento. “Desde que a cidade nos acolheu, tivemos fortes laços com as universidades, especialmente PUC-Campinas e Unicamp, esta última com a qual desenvolvemos a fibra óptica.” Em 1998, a empresa passou a ser uma fundação privada e saiu do orçamento da União. Hoje o centro é o maior laboratório de certificação de produtos de telecomunicações do Brasil (como celulares, modens e cabos).
Tecnologia nacional
Curado lembra que quase todo o tráfego brasileiro das centrais digitais passavam por sistemas projetados aqui, com tecnologia nacional, atraindo inclusive muitas indústrias à região e promovendo a criação, por exemplo, do Instituto Eldorado, dentro do próprio CPqD. “Numa época em que não se falava em startups, nós já fomentávamos isso.”
Segundo Curado, a população faz uso de tecnologias desenvolvidas pelo CPqD sem ter conhecimento disso, como os caixas eletrônicos para deficientes visuais, além de serviços voltados para a agricultura, os projetos de cidades inteligentes, ações em conectividade e rastreabilidade, muitos recursos da TV digital e diversos projetos de Inteligência Artificial. Entre os trabalhos mais importantes que desenvolve hoje está a tecnologia 5G e os blockchain (relacionados a confiança, privacidade e segurança). “São projetos de vanguarda, onde a Inteligência Artificial é peça chave. Juntando 5G e IA vamos dar saltos que mudarão a vida das pessoas”, revela. “Temos que olhar o futuro.” Entre as pesquisas do CPqD que estão voltadas para o futuro estão a computação por contexto e a computação quântica.
“A forma de se inovar mudou nos últimos anos. O CPqD se engajou no ecossistema de inovação. Podemos trazer cada vez mais tecnologia para a região. Temos alcance nacional, mas nossa atuação é local”, conclui Curado.
Fonte: Campinas (12/07/2021)
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