quarta-feira, 27 de outubro de 2021

TIC: O leilão do 5G e o teto furado com a licença para gastar

 


É imperativa a responsabilidade fiscal, com Estado enxuto. A OCDE divulgou projeção para o PIB brasileiro para as próximas quatro décadas: média de 1,1% até 2030 e 1,4% até 2060. Privatizações, leilões de concessões (como o do 5G) e parcerias público-privadas são alternativas para melhorarmos essas perspectivas

A semana que passou foi dificílima. Assim, para desanuviar, vou iniciar este texto com um tema que julgo pertinente, mas que, de alguma forma, tem a ver com o estresse desses dias.

Morei grande parte da minha vida no bairro da Ilha do Governador, no Rio de Janeiro. Volto a ele, pois, na década de 1980 e princípio da de 1990, era a localidade que tinha a linha telefônica mais cara do estado, quiçá do país.

Naquela época, comprar uma linha de telefone era uma espécie de investimento. Na Ilha e na Barra da Tijuca custavam bem mais de U$ 1 mil, e o negócio era tão interessante que havia mercado paralelo, com forte ágio, inclusive com anúncios nos classificados de jornais.

O mesmo preço abusivo ocorreu no início das linhas celulares, no início dos anos 1990. Era preciso entrar na fila de espera, e os preços, igualmente cotados em dólar, eram estratosféricos, bem como os aparelhos que só(!) faziam ligações. Ademais, quando começou por aqui, a internet era discada, e pagava-se um absurdo pelo kilobyte.

As privatizações (lembram da Telebras?), no governo FHC, foram um marco de como a competição e a iniciativa privada mudaram a configuração do setor de telecom. Desde então, os preços desabaram, tanto das linhas, quanto dos aparelhos e da própria internet, que, de discada, passou a ser cabeada e depois por fibra ótica, com velocidades ultrarrápidas.

Toda essa introdução é para falarmos do leilão do 5G, previsto para acontecer daqui a poucos dias. Será um dos principais eventos deste ano e, em minha opinião, nos colocará em patamares comparáveis às principais economias nesse quesito comunicação. A ideia é que a rede esteja operacional em julho de 2022 em todo o país.

O leilão é a porta de entrada dessa nova tecnologia. Os especialistas estimam que possam ser arrecadados cerca de R$ 50 bilhões com as quatro frequências que estarão em disputa.

Não sou especialista no tema, mas conversei com alguns colegas professores do curso de Engenharia e meu intuito aqui é abordar a importância desse megaevento.

No início das discussões, tivemos uma verdadeira novela, com capítulos extensos, envolvendo a participação de empresas fornecedoras. Lembremo-nos que Trump pressionava o governo brasileiro para excluir a chinesa Hauwei, o que não mudou muito com Biden. Pelo que entendi, a gigante asiática ficará de fora da rede privativa do governo.

Os números envolvidos são superlativos. O presidente da Nokia afirmou que o 5G trará investimentos de U$ 1,2 bi ao nosso PIB. A GSMA, organização que engloba as operadoras móveis mundiais, calcula que o impacto do 5G é de mais de U$ 5 trilhões no PIB global, nos próximos cinco anos. Segundo a organização, a tecnologia será responsável por 20% das conexões e, em alguns países, mais de 50%.

A grande vantagem do 5G é sua rapidez e baixa latência, que é o tempo de resposta/transferência de um pacote de dados. Explicando para um leigo, é o tempo entre o “enter” de uma consulta e a reposta. Os engenheiros estimam que a velocidade da nova tecnologia reduza entre 50 e 80 vezes o tempo em relação ao que praticamos hoje.

Esse ganho de eficiência é tremendo, e muitas atividades serão aceleradas, tornando-as ainda mais produtivas. Não estou me referindo somente a joguinhos mais velozes para a garotada ou a download de filmes, mas a situações críticas, como numa cirurgia por internet, por exemplo.

Um ponto interessante é que no nosso país a chegada do 5G tende a melhorar ainda mais a rede 4G, o que é muito bom, além da geração de empregos ser significativa. Porém, o que me parece mais alvissareiro é que se abre a possibilidade de criarmos “cidades inteligentes”, algo que ganhou relevância na pandemia, virou tema de discussão entre especialistas e vai melhorar a vida de muitos brasileiros. Para completar, na minha seara, os mercados financeiros ganharão ainda mais agilidade, e as operações serão feitas com mais rapidez e muito menos intercorrências.

Tudo o que expus acima está associado ao mau humor que tomou conta das mesas de operações na semana passada, com a bolsa fazendo mínima do ano, dólar ultrapassando R$ 5,7 e juros futuros “explodindo”, especialmente após o ministro da Economia Paulo Guedes afirmar que o governo pode pedir licença para gastar, furando, na prática, o “teto dos gastos”, para aumentar o valor de benefícios sociais. Por quê?

Cada vez mais me convenço que é imperativa a responsabilidade fiscal, com Estado enxuto, até para que tenhamos inflação nas metas. A OCDE divulgou projeção para o PIB brasileiro para as próximas quatro décadas, e os números são pífios: média de 1,1% até 2030 e 1,4% até 2060. A meu juízo, privatizações, leilões de concessões (como o do 5G) e parcerias público-privadas são boas alternativas para melhorarmos essas perspectivas. E, para os críticos, se a âncora atual não é a ideal, pensemos em outra para substitui-la, só não dá simplesmente para matá-la.

Por fim, agentes secretos “00” possuem licença especial. Não podemos criar um personagem tupiniquim, um agente nada secreto, que tenha licença para gastar o que não temos.

Fonte: Valor Investe e Alexandre E. Santo (29/10/2021)

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