Retiradas de patrocínio e desrespeito aos direitos adquiridos dos participantes elegíveis a um plano vitalício bem demonstram a frustação destes
Na década dos anos de 1970, quando foram criados os fundos de pensão no Brasil, a equipe econômica do governo do general Ernesto Geisel, chefiada pelo ministro Mário Henrique Simonsen, tinha pelo menos três objetivos bem definidos:
- livrar a União do pagamento das aposentadorias dos trabalhadores das estatais;
- fomentar o mercado de capitais e
- criar uma poupança de longo prazo para alavancagem dos investimentos em infraestrutura do governo.
Não é difícil imaginar a quantidade e a qualidade dos incentivos que foram oferecidos para convencer esses trabalhadores a abrirem mão da segurança de uma aposentadoria vitalícia, corrigida pelo mesmo critério dos servidores em atividade, garantida pelo Estado, para se lançarem a uma aventura totalmente desconhecida. Foi, então, sancionada a Lei 6435/1977 como forma de garantir os direitos e deveres desse novo pacto de vontades.
Como acontece com a grande maioria dos contratos firmados neste País, nesses 44 anos o acordo celebrado entre as partes foi solenemente desfigurado, por meio de regulamentações paralelas (resoluções do Conselho Nacional de Previdência Complementar – CNPC, instruções da Superintência Nacional de Previdência Complementar – Previc, aprovações de alterações de estatutos das Entidades e regulamento dos planos de benefícios), chegando aos seus estertores com uma avalanche de retiradas de patrocínios aos planos previdenciários operados no âmbito do regime de previdência complementar pelas entidades fechadas, como está ocorrendo nos últimos tempos e com o aval do governo.
Chama atenção o fato de que a existência de segurança jurídica nas relações sociais é condição essencial para o desenvolvimento de um Estado Democrático de Direito que, acima de tudo, resguarda os cidadãos de medidas autoritárias, casuísticas e pessoais que pretendam atingir seus direitos subjetivos. E esse detalhe não escapou ao crivo do legislador que, ao elaborar a Lei Complementar nº 109/2001, deixou explícito em seu artigo 3º, inciso VI, que a ação do Estado será exercida com o objetivo de proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios.
No artigo 17 da mesma Lei Complementar, parágrafo único, o legislador estabelece o critério de reconhecimento do esforço contributivo do trabalhador e determina que “ao participante que tenha cumprido os requisitos para obtenção dos benefícios previstos no plano é assegurada a aplicação das disposições regulamentares vigentes na data em que se tornou elegível a um benefício de aposentadoria.” Portanto, a satisfação das condições para elegibilidade a um benefício de aposentadoria configura o direito adquirido na relação contratual, que está protegido contra abusos dos poderes constituídos e dos particulares, em benefício do cidadão.
Na previdência complementar, de forma peculiar, quando o segurado (participante do plano de benefícios) satisfaz todas as condições para o recebimento da prestação diz-se que ele é elegível ao benefício. Ser elegível significaria, então, possuir direito adquirido para o recebimento do benefício, na forma contratada, espelhada no regulamento do plano.
Também, nesse sentido, o §1º, do art. 68 da LC 109/2001 reafirma que “os benefícios serão considerados direito adquirido do participante quando implementadas todas as condições estabelecidas para elegibilidade consignadas no regulamento do respectivo plano”.
É importante destacar que o direito adquirido, aqui tratado pelo legislador, diz respeito ao direito a um benefício vitalício conquistado pelo participante, no caso dos planos de benefício definido (BD) e nos planos de contribuição variável (CV), principalmente.
Ao optar pela retirada de patrocínio, ainda que se ofereça como opção um plano de contribuição variável, o patrocinador do plano está se eximindo do compromisso contratual de fazer, que é pagar um benefício vitalício aos integrantes do contrato firmado entre as partes.
Nossa expectativa é que o poder judiciário em algum momento reconheça a frustração do direito adquirido que está sendo imposto ao trabalhador e responsabilize a todos os agentes que deram causa, inclusive o Estado, que é o responsável pela aprovação desta flagrante ilegalidade.
Fonte: Reconta Aí e Antônio Bráulio de Carvalho (04/10/2021)
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