sexta-feira, 10 de junho de 2022

TIC: O terremoto do mundo tech vem vindo aí?



O mundo está para assistir a um massacre de heróis.

As mentes mais brilhantes da América passaram os últimos 20 anos correndo para Oeste para garimpar ideias em Silicon Valley. Não para ficarem ricos, era o que nos diziam, mas para resolver problemas urgentes e construir coisas que pudéssemos usar. Tudo que tínhamos a fazer era encher os donos das cabeças certas de dinheiro para que eles desenvolvessem as tecnologias certas para que resolvêssemos qualquer coisa, dos problemas de mobilidade à doença do clima, passando pela desigualdade. Essa corrida do ouro idealista criou novos bilionários, titãs da tecnologia que convenceram investidores e o público em geral com promessas de um amanhã melhor.

Mas agora esses gênios estão vendo suas empresas desmoronarem diante dos novos ventos da economia. As taxas de juros estão emergindo de baixas históricas e está ficando claro que um monte dessas empresas – das mais empoderadas às mais ridículas – não conseguem sobreviver sem dinheiro fácil…

Nós já vimos bolhas como essas explodir antes no final dos anos 1990 e início dos 2000. Mas desta vez a escala é muito diferente. Naquele tempo as que se dissolviam no ar eram empresas de 2 ou 3 bilhões de dólares. Hoje são de 20, 30 bilhões…

Os luminares de Silicon Valley viviam dizendo que o dinheiro era só o combustível da sua revolução. Mas o que o mercado está mostrando é que o dinheiro era não só o combustível mas o motor, o capitão e o destino desses empreendimentos…

O que vem vindo aí é um evento na escala das grandes extinções.

Em 2012 o Facebook abriu capital e alcançou a marca de 1 bilhão de usuários … Elon Musk estava colhendo uma enorme quantidade de subsídios do governo para lançar a revolução dos carros elétricos … Tudo isso era movido por uma economia totalmente voltada para empurrar Silicon Valley. O crash de 2008 estava logo ali e os bancos centrais estava hiper-focados em garantir que não faltasse dinheiro. Mantinham as taxas de juros em zero para que as empresas não tivessem medo de tomar dinheiro. E tudo isso animava não só os investidores mas uma sociedade inteira querendo emergir de uma catástrofe.

Agora tudo está diferente. O mundo começa a se perguntar se não estará conectado demais. As redes sociais têm sido usadas para sujar eleições, envenenar relacionamentos e planejar insurreições … as promessas de promover o bem estar social vão se apagando e as de dar retorno financeiro, então, mais ainda … As dores e feridas estão aparecendo em todas as fases da vida das empresas de tecnologia. 

Os aceleradores de startups estão emitindo alertas para que os fundadores de novos negócios se preparem para o pior. Os maiores grupos de venture capital estão cortando seus investimentos pela metade ou menos. Os salários das companhias mais “hipadas” mostram-se completamente insustentáveis … a conversa do bem estar social evaporou … um numero cada vez maior desses empreendimentos comprovam-se movidos a “hipe” e não a genialidade tecnológica … 

Agora que a maré virou, somente o frio e concreto dinheiro num balanço limpo e lógico pode salvar essas empresas, e não softwares transados, blockchain ou a camiseta preta favorita de algum CEO.

Ate ha pouco tempo era out discutir os números de uma empresa tech. Era quase como perguntar a um novaiorquino onde é o Empire State. Só servia para mostrar que você “não era do Vale” e não entendia nada sobre como as coisas eram medidas por lá. Você parecia caipira se não enxergasse a Big Picture e só quisesse saber de coisas babacas como lucro…

O problema é que essa conversa só funciona quando o mercado está inundado de dinheiro. Agora os CEOs cronicamente deficitários estão se deparando com a religião da sustentabilidade…

Até a vintenária Tesla está respirando essa fumaça. A companhia de Elon Musk finalmente deu algum lucro em 2020, mas os problemas se vão empilhando: agora tem a competição das grandes automobilísticas; agora tem a China … 

Companhias cujo valor subiu verticalmente estão indo retas para o fundo … Muitas das que não conseguiam demonstrar que seus negócios eram rentáveis inventaram os seus próprios “indicadores de desempenho” .. esses indicadores podiam ou não ter alguma relação com performance financeira. Eles eram tidos como sagrados pelo pessoal da mídia social mas eram completamente invalidáveis. 

“Se você está investindo numa companhia que só se mede por suas própria métrica particular”, advertia um experiente agente do mercado, “você é um completo idiota”. Mas esses “indicadores próprios” hipnotizaram investidores suscetíveis a jargões e até os próprios empregados dessas empresas, que eram remunerados com ações em vez de dinheiro… Agora o problema delas e desses empregados é que ações podem cair até virar pó.

Dinheiro é o que muitas dessas empresas menos têm e isso fará suas ações caírem ainda mais … e elas ainda têm um longo caminho a percorrer antes que seu valor reflita suas métricas financeiras reais…

As cripto-moedas são um desperdício inacreditável de capital e a maior prova de que o excesso de dinheiro enfiado em tecnologia perdeu totalmente o foco na busca de idéias úteis … É um esquema de pirâmide … uma caixa-preta que só tem valor enquanto mais gente continuar enfiando dinheiro nela…

Lá em 2011 Mark Andreesen, um dos mais “hipados” venture capitalists, disse que o software engoliria o mundo … mas em vez de usar a fase das vacas gordas para resolver problemas reais, os deuses auto-indulgentes da tecnologia criaram essa nova geração de empresas que agora se esboroam no chão com um baque surdo. 

Todo mundo mete o pau em Elon Musk … mas talvez quem melhor represente essa dessacralização é a Meta de Mark Zuckerberg. A companhia criada num dormitório de Harvard é hoje o paraíso do racismo, das teorias de conspiração e do negativismo. Ele confiou em aquisições e cópias em vez de inovação. E agora resolveu requenta-la num conceito meia-boca de ficção científica chamado “metaverse”. Só que ha poucas evidências de que o mundo esteja disposto a seguí-lo nessa aventura de queima maciça de dinheiro…

Hoje temos startups de carros voadores, de entrega ultra-rápida de supermercados, de vôos de milionários pelo espaço – mas nada disso se parece com aquilo que nos foi prometido. São grandes ideias, ninguém discute, mas nenhuma delas nos aproxima de uma revolução, e uma revolução foi o que nos foi prometido.

Em lugar dela, o que é que está aí, diante de nossos narizes?

Estamos mais conectados e mais divididos do que nunca. Estamos mais sós. A desigualdade continua aumentando, a crise imobiliária piorou e a crise do clima está rugindo. Nós demos 20 anos de capital irrestrito aos deuses da tecnologia para que eles resolvessem problemas por nós e eles não chegaram nem perto disso. Novos deuses virão – porque o mercado os cria a granel – e espero que seja gente que possa resolver problemas reais e não novos santos para esse panteão dos caronas de tendências cuja hora da verdade está chegando.

Há um preço a ser pago por todos esses excessos, e esse preço não será só em dinheiro.

Fonte: Vespeiro (09/06/2022)

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