Ao câmbio atual, dívida da Oi que foi para recuperação judicial, em 2016, seria equivalente a R$ 85 bilhões hoje
Depois de seis anos, a Oi está prestes a sair da recuperação judicial. Só neste ano, a empresa pagou o equivalente a R$ 15 bilhões em compromissos financeiros. Os desembolsos foram possíveis depois da concretização das vendas da operação de telefonia móvel e do controle da infraestrutura de fibra, que deu origem à V.tal. Em entrevista exclusiva ao EXAME IN, o CEO da empresa, Rodrigo Abreu, conta que a companhia quitou todas as dívidas novas que foram feitas dentro do processo judicial, para seguir com investimentos durante esse período, e fez também a maior amortização dos vencimentos que carregava antes da reestruturação: cerca de R$ 4,5 bilhões devidos ao BNDES.
“Ganhamos o direito de virar a página e realmente começar uma vida nova”, afirma Abreu. “Tenho dito isso internamente, porque realmente começa agora o trabalho totalmente focado nessa nova Oi”, diz, lembrando que o negócio deixou de ser uma operação de telecom para ser uma empresa de serviços digitais, de forma mais abrangente. E que há ainda muito por fazer nesse futuro.
A Oi terminou dezembro de 2021 com cerca de R$ 35 bilhões de dívida bruta. Os R$ 15 bilhões pagos neste ano, portanto, vão reduzir esse total. Abreu, porém, preferiu não antecipar como ficou o endividamento. Hoje, após o fechamento do mercado, a companhia vai divulgar o balanço referente ao primeiro trimestre e esses dados ficarão mais claros. O executivo explicou apenas que não é possível uma subtração simples, porque existem os diversos ajustes cambiais que precisam ser feitos.
Apesar das boas novas, permanece entre os investidores uma preocupação a respeito do volume de dívida que a companhia ainda possui. Abreu tem clareza de que esse continua sendo um ponto importante, tanto quanto a execução da operação daqui para frente.
Quando a Oi pediu recuperação judicial, seis anos atrás, anunciou R$ 65 bilhões em dívidas que foram listadas no processo. Há muita gente que erroneamente afirma que os compromissos, portanto, não caíram sequer à metade. Mas o que esses investidores esquecem é que mais de 50% da dívida da empresa, na época, era em moeda estrangeira. Ao câmbio atual, os vencimentos daquele momento seriam equivalentes a aproximadamente R$ 85 bilhões. Essa seria a fotografia pré-recuperação judicial da Oi.
Portanto, passados seis anos é como se a Oi tivesse conseguido não só manter, mas acelerar, os investimentos e ainda resolver cerca de R$ 50 bilhões em passivos. Esses não são números exatos, mas dão uma ordem de grandeza melhor para se ter em mente antes de juízos apressados.
Agora, mais leve, focada em serviços digitais e não mais em construir infraestrutura, os investimentos da Oi vão diminuir consideravelmente. Nos últimos dois anos, especialmente para acelerar a cobertura de fibra, a Oi investiu entre R$ 7 bilhões e R$ 8 bilhões por ano. Segundo Abreu, a média anual daqui para frente deve ser reduzida em aproximadamente 80%, o que coloca a empresa num patamar de investimento anual de aproximadamente R$ 1,5 bilhão.
“Temos finalmente a perspectiva de sermos geradores de caixa num horizonte de médio prazo”, diz ele, explicando que isso significa dentro de aproximadamente dois anos. Além disso, o trunfo da empresa para enfrentar a questão do endividamento é a participação minoritária na V.tal, que após os ajustes finais do contrato ficou em pouco menos de 35%. O plano é que a V.tal passe por uma abertura de capital, o que permitirá que a Oi monetize esse ativo e, com isso, melhore sua estrutura de capital.
Abreu, na entrevista, voltou a frisar que a escolha por se manter acionista tem relação com a expectativa de uma maior utilização da rede de fibra — do que se ela ficasse dentro da Oi e o investimento tivesse de ser remunerado apenas pelo próprio uso interno. Como uma empresa de rede neutra, a V.tal venderá o acesso a sua infraestrutura a diversas outras companhias, além da própria Oi, que é o contrato âncora do negócio. No nascimento, a V.tal estreia com uma avaliação da ordem de R$ 20 bilhões. A crença é que o negócio pode até dobrar de valor nos próximos anos.
Uma nova gigante na B3
Para quem acreditava que a Oi havia sido fatiada na recuperação judicial e tinha dúvidas sobre o que restaria, é bom que se diga que a empresa renasce como um negócio com receita anual de R$ 10 bilhões. “Não é futuro, isso é já”, enfatiza Abreu.
A expectativa é que a companhia tenha uma margem Ebitda da ordem de 20%. No ajuste final dos contratos para a transação da V.tal, que é controlada por um fundo de private equity gerido pelo BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da Exame), a Oi negociou manter para si própria a gestão da casa-cliente no acesso à fibra. Na prática, significa que tanto o investimento nos aparelhos para instalação do serviço, como todo atendimento e gestão, ficam com a empresa original.
Abreu explica que isso deve fazer com que a margem da Oi seja um pouco mais elevada que os 20% dados anteriormente como guidance. “Não chega a ser uma mudança de magnitude. É mais um ajuste direcional. Vamos comunicar isso ao mercado com o próximo balanço.”
O resultado financeiro do que será essa nova empresa, porém, só deve ganhar visibilidade a partir do segundo semestre do ano. Isso porque a transação de venda da operação celular foi concluída (financeiramente) realmente apenas em abril e a venda da fibra, neste mês.
O que é a nova Oi
O plano de Abreu é levar a companhia ao posto de maior em fibra no Brasil — não em rede, que agora é da V.tal, mas em número de clientes. Atualmente, a empresa tem quase 4 milhões de usuários de banda larga nessa tecnologia. Quando entregou à rede ao fundo do BTG Pactual, tinha aproximadamente 16 milhões de casas passadas com fibra – ou seja, domicílios onde a rede está disponível para contratação.
Na prática, significa que a meta do CEO de alcançar uma utilização de rede, antes de vendê-la, da ordem de 25% foi alcançada. Daqui para frente, a empresa vai dar foco, cada vez mais, à diferenciação da sua prestação de serviço ao cliente. O caminho para isso é foco na qualidade do atendimento e também em novos produtos e soluções, sempre com um perfil digital e tecnológico.
Já estreando essa nova vida, no começo de junho, a companhia lançou o serviço de FTTR, que permite ao cliente de banda larga o acesso à fibra em toda a residência, independentemente de furar parede ou limpar dutos de passagem.
“Assim como ao criar a V.tal abrimos espaço para outras empresas ofereçam serviços sobre nossa rede antiga, o que traz competição, conquistamos o direito de vender novos produtos e serviços, por meio de parcerias”, ressalta Abreu, apontando que a oferta poderá agora estar acompanhada de uma série de novas soluções, como financeiras e de educação, entre outras.
A frente de soluções corporativa será outra fonte grande de atenção. A base desses clientes já traz cerca de R$ 3 bilhões à companhia por ano. “Somos a maior em serviços corporativos e nossas ofertas estão já cada vez mais adaptadas à nossa nova realidade, com aumento dos componentes de TI, como segurança, gestão de nuvem, big data”, explica o CEO.
Exemplo de como essa frente deve avançar é o contrato com a Secretaria de Segurança Pública da Bahia, anunciado há alguns dias. A Oi vai administrar uma rede privada móvel para o órgão estadual, dentro de um projeto que inclui centros de monitoramento, inteligência artitificial, reconhecimento de placa e facial, entre outros.
O fim do processo de recuperação judicial da Oi resulta não só em uma empresa diferente, mas em um setor diferente. A criação da V.tal, com uma rede de fibra realmente neutra, e o surgimento de uma companhia de soluções digitais e de conectividade com atuação nacional, essa nova Oi, vão chacoalhar o desenho do que até agora era chamado de setor de "telecomunicações".
Fonte: Exame (28/06/2022)
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