sexta-feira, 12 de junho de 2020

Planos de Saúde: Os 5 Direitos que os usuários de planos de saúde possuem e (provavelmente) não sabem


É muito comum que as advogadas e os advogados especialistas em saúde suplementar recebam questionamentos diários sobre condutas das operadoras de planos de saúde e que a uma primeira vista é algo básico, mas que o consumidor não tem ciência dos seus direitos.

Em razão dessa situação decidi compilar 5 direitos que esses consumidores possuem e muito provavelmente não fazem ideia. Não irei destrinchar de forma aprofundada cada um desses direitos, tampouco debater suas implicações práticas ou o que o Superior Tribunal de Justiça aplica em termos de decisões.

Minha intenção é informar o direito e os fundamentos jurídicos para o consumidor e para os colegas de profissão que atuam com outros tipos de demanda, mas eventualmente se deparam com questionamentos dessa natureza.

Cada caso é único e depende da análise do contrato de cada consumidor, devendo essa lista ser utilizada apenas como um norte. Assim, vamos aos direitos:

1) O plano de saúde deve fornecer os medicamentos domiciliares quando se tratar de situação de urgência ou emergência.
Para entender bem esse direito é preciso saber o que diz a Lei dos Planos de Saúde, mais especificamente no artigo 35-C:

Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos:
I - de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizado em declaração do médico assistente;
II - de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações no processo gestacional;
III - de planejamento familiar.
Junto a esse ponto, temos o artigo 10, inciso VI, que em termos gerais não indica o fornecimento de medicamentos domiciliares como de cobertura obrigatória e concede ao fornecedor a opção de inserir essa condição no contrato:

Art. 10. É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta Lei, exceto:
VI - fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, ressalvado o disposto nas alíneas ‘c’ do inciso I e ‘g’ do inciso II do art. 12;
A maioria das operadoras de planos de saúde não ofertam aos seus consumidores a cobertura de medicações domiciliares. A finalidade desse ponto da Lei, na realidade, é a exclusão do dever de custear a compra comum e até corriqueira em farmácias.

Quando falamos de situação de urgência ou emergência não estamos diante de uma doença comum, sendo necessária a compreensão do conceito de tratamento da forma mais ampla, ou seja, dos procedimentos e medicamentos necessário para saída da situação emergencial e manutenção da saúde e vida do paciente.

Um exemplo: uma mulher com trombofilia comprovada por exame de mutação genética passa por uma gestação difícil e de alto risco, tratando-se de situação de urgência na qual se faz necessária a utilização durante toda a gestação de uma medicação de uso domiciliar para que essa gestante não tenha que ir todo dia ao hospital receber a dose diária da substância.

Por essa razão, independente da modalidade de fornecimento da medicação, o plano deve custear os medicamentos domiciliares quando se tratar de situação de emergência ou urgência.

2) Quem decide os materiais (órteses, próteses...) que serão utilizados no tratamento do paciente é o médico, cabendo ao plano custear.
Outra dúvida muito comum e que vez ou outra vem acompanhada de uma negativa de fornecimento do plano de saúde.

É importante informar que apenas o médico do consumidor pode escolher os itens necessários para o tratamento mais adequado. Essa determinação encontra amparo no incio I do art. 7º da Resolução nº 424/2017 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e art. 1º da Resolução nº 1.956/2010 do Conselho Federal de Medicina (CFM):

Art. 7º da Res. ANS 424/2017: No tocante à cobertura de órteses e próteses ligadas aos atos cirúrgicos listados no Rol de Procedimentos e Eventos em saúde, deverão ser observadas as seguintes disposições:
I - cabe ao profissional assistente a prerrogativa de determinar as características (tipo, matéria-prima e dimensões) das órteses, das próteses e dos materiais especiais – OPME necessários à execução dos procedimentos contidos no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde; e [...]
Art. 1º da Res. CFM 1.956/2010: Cabe ao médico assistente determinar as características (tipo, matéria-prima, dimensões) das órteses, próteses e materiais especiais implantáveis, bem como o instrumental compatível, necessário e adequado à execução do procedimento.
Na prática o que se nota são muitas recusas e até a "realização" de juntas médicas ou odontológicas unilaterais, tolhendo por completo o direito do consumidor ao tratamento indicado pelo seu médico.

3) Caso não exista profissional especializado em determinada área da medicina na rede credenciada, cabe ao plano arcar com as despesas do paciente.
Por mais que o plano do consumidor seja o mais completo da operadora, nem sempre todas as áreas da medicina são cobertas pela rede credenciada e abrangência geográfica do contrato.

Segundo dados do CFM o número de médicos no Brasil passa de 450 mil, ou seja, 2,18 médicos a cada mil habitantes. Ainda assim, existem áreas da medicina não cobertas de forma expressiva pelos planos e isso atrai uma obrigação de custeio das despesas quando o profissional ou clínica procurada pelo consumidor não estão inseridos na rede credenciada.

Essa determinação está inserida nos incisos I e II do artigo 4º da Resolução nº 259/2011 da ANS:

Art. 4º Na hipótese de indisponibilidade de prestador integrante da rede assistencial que ofereça o serviço ou procedimento demandado, no município pertencente à área geográfica de abrangência e à área de atuação do produto, a operadora deverá garantir o atendimento em:
I - prestador não integrante da rede assistencial no mesmo município; ou
II - prestador integrante ou não da rede assistencial nos municípios limítrofes a este.
Portanto, na hipótese de não existir profissional credenciado a operadora deve ressarcir integralmente o usuário.

4) Aposentado pode manter o plano que tinha quando era empregado se contribuiu com o pagamento da mensalidade.
Assim, como o primeiro direito, nesse também precisamos entender o que diz a Lei dos Planos de Saúde sobre o beneficiário aposentado:

Art. 31. Ao aposentado que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1o desta Lei, em decorrência de vínculo empregatício, pelo prazo mínimo de dez anos, é assegurado o direito de manutenção como beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.
§ 1º Ao aposentado que contribuir para planos coletivos de assistência à saúde por período inferior ao estabelecido no caput é assegurado o direito de manutenção como beneficiário, à razão de um ano para cada ano de contribuição, desde que assuma o pagamento integral do mesmo.
Ou seja, o aposentando, quando empregado, que tiver contribuído por mais de dez anos com o pagamento (no todo ou em parte) do plano de saúde tem o direito de permanecer como beneficiário do plano por tempo indeterminado.

Por sua vez, caso a pessoa se aposente antes de completar 10 anos de contribuição naquele empresa, terá direito a permanecer com o plano de saúde pelo mesmo período de contribuição. Isto é, se o empregado/aposentado contribuiu no todo ou em parte com o pagamento da mensalidade durante 6 anos, permanecerá com o contrato ativo por mais 6 anos.

Independente da situação, o aposentado somente continua com o contrato vigente se assumir o pagamento integral da mensalidade.

Contudo, a prática mostra algumas situações abusivas, como, por exemplo, um acréscimo significativo no valor da mensalidade. Nesse sentido devemos recorrer à Resolução nº 279/2011 da ANS, mais especificamente aos arts. 16 e 18:

Art. 16. A manutenção da condição de beneficiário no mesmo plano privado de assistência à saúde em que se encontrava quando da demissão ou exoneração sem justa causa ou aposentadoria observará as mesmas condições de reajuste, preço, faixa etária e fator moderador existentes durante a vigência do contrato de trabalho.
§ 1º O valor da contraprestação pecuniária a ser paga pelo ex-empregado deverá corresponder ao valor integral estabelecido na tabela de custos por faixa etária de que trata o caput do artigo 15 desta Resolução, com as devidas atualizações.
[...]
Art. 18. O plano privado de assistência à saúde de que trata o artigo anterior (plano exclusivo para ex-empregados) deverá ser oferecido e mantido na mesma segmentação e cobertura, rede assistencial, padrão de acomodação em internação, área geográfica de abrangência e fator moderador, se houver, do plano privado de assistência à saúde contratado para os empregados ativos.
Parágrafo único. É facultada ao empregador a contratação de um outro plano privado de assistência à saúde na mesma segmentação com rede assistencial, padrão de acomodação e área geográfica de abrangência diferenciadas daquelas mencionadas no caput como opção mais acessível a ser oferecida juntamente com o plano privado de assistência à saúde de que trata o caput para escolha do ex-empregado demitido ou exonerado sem justa causa ou aposentado.

Dessa forma, o aposentado pode sim manter seu plano de saúde da época em que era empregado, possuindo argumentos jurídicos suficientes para impedir práticas abusivas das operadoras.

5) É possível mudar para outra operadora sem o cumprimento de novas carências caso o contrato atual esteja vigente há 2 anos.
Por fim, temos a hipótese de portabilidade de carências, expressamente permitido pela ANS e que as operadoras acabam cometendo muitos erros por conta do desrespeito dos prazos para conclusão da troca.

Essa medida é regulada pela Resolução nº 438/2018 e prevê alguns requisitos específicos para que o consumidor troque de operadora e não tenha que cumprir novos prazos.

Uma das principais determinações é que o consumidor deve estar vinculado há 2 anos ao plano atual e que a operadora do plano de saúde destino tem o prazo de 10 dias para responder se aceita ou não a portabilidade, caso não responda a portabilidade é automaticamente considerada válida.

Outra determinação importante é que o consumidor, após ingressar no novo plano, deve solicitar o cancelamento do anterior diretamente à operadora no prazo de 5 dias, o não cumprimento dessa exigência sujeita o consumidor ao cumprimento das carências do novo plano pelo descumprimento dos termos da Resolução.

O tema é um tanto quanto complexo e necessita de um artigo específico para ficar melhor explicado, mas caso o leitor tenha interesse em saber mais pode acessar o site da ANS clicando aqui ou aqui para ter acesso a uma cartilha explicativa.

É possível notar que os direitos aqui informados foram retirados diretamente da Lei dos Planos de Saúde e de Resoluções da ANS, textos esses que muitas vezes são complexos e envolvem a leitura de outras fontes para o completo entendimento.

Muitos consumidores somente buscam essas informações quando a operadora do plano de saúde nega algum procedimento ou age de forma abusiva em relação a prazos e preços, sendo de grande importância transformar os termos da lei em uma linguagem acessível a todos.

Fonte: JusBrasil e Eduardo Bauer (11/06/2020)

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