sábado, 24 de outubro de 2020

Idosos: Longevidade dos habitantes da Sardenha (IT) intriga cientistas

 

A cada 100 mil habitantes da ilha, 22 chegam aos 100 anos.

Ao contrário do resto do mundo, muitos dos homens não morrem antes das mulheres.

Nas montanhas da Sardenha, uma ilha a 190 quilômetros da costa italiana, um mistério intriga os cientistas: a vida longa - muito longa - dos seus habitantes.

Aos 98 anos, Silvia Piras lê os jornais sem a ajuda de óculos. O marido, Efisio, já completou 100 anos e ainda cuida de plantas. "Nos casamos em 1932, no dia seis de fevereiro", diz ele. "Quando nos conhecemos, eu tinha 18 anos, ele 20”, completa ela. O casal mora no terceiro andar, sem elevador. No verão chega a fazer 40 graus. E, mesmo assim, todos os dias marido e mulher descem juntos as escadas para passear.

O agricultor aposentado Pepino Podda também é centenário. A saúde éboa, ele só se queixa de uma dor no braço - e da falta da esposa, que se foi antes dele. Na Sardenha, muitos homens não morrem antes das mulheres, como no resto do mundo. "Quando eu era pequeno tive duas pneumonias. E mesmo assim cheguei aos 100 anos. Não sei por quê." O filho caçula de Pepino, Mário Podda, revela uma curiosidade: o pai não bebe água nunca. Só vinho.

Um dos próximos aniversários centenários da Sardenha é o de Consolata Melis - ela está eufórica. Consolata é tão independente que vive sozinha em um apartamento. Tem 10 filhos, 50 netos, bisnetos e trinetos. A memória é perfeita. "Não esqueci as boas nem as más lembranças", diz ela, no idioma sardo. 

Rita Lobina, que já apagou as velas de 100 anos, assiste a todos os telejornais. Há pouco tempo fez uma operação na perna com anestesia geral, mas já está andando. Ainda cozinha, quando é preciso. Quanto à idade, responde, sem modéstia: "não é para todos".

Na Sardenha, é para muitos. Aqui, os que chegam a um século de vida, segundo a universidade de Sassari, são 22 a cada 100 mil habitantes.

Para se ter uma idéia, na Europa, continente com alta expectativa de vida, o número de centenários não passa de 8 em 100 mil habitantes.

O geneticista Mario Pirastu é presidente do parque genético de Ogliastra, instituição que pesquisa as razões da longevidade sarda. Ele analisa o sangue da população de mais de 20 cidades. Ainda não tem as respostas, mas levanta algumas hipóteses. "A saúde pública melhorou muito. O estilo de vida, sem estresse, também contribui. As famílias cuidam bem dos seus velhos."

"Nos interessa descobrir por que essas pessoas escapam de doenças cardiovasculares. E por que respondem tão bem aos remédios. É possível que exista uma predisposição genética."

Testemunhas das duas grandes guerras, os centenários sardos viveram no campo, trabalharam muito e comeram pouco. "Eram tempos feios”, diz Efisio. “Nós conhecemos a fome."

"A carne era muito pouca. Tomávamos sopa. As cabras e ovelhas tínhamos que vender", conta Consolata.

Talvez aí esteja uma razão para essa longevidade. Afinal, a ciência já chegou à conclusão de que, para se viver muito, é fundamental comer pouco.

Os centenários da Sardenha estão concentrados em 50 pequenas cidades, cada uma delas com menos de três mil habitantes. A estrada que leva à região tem 100 quilômetros. Jovens sardos fizeram da área uma rota turística para enfrentar o desemprego. E adivinhe o que eles incluíram junto às atrações do turismo alternativo, junto às tradições locais? Os velhinhos centenários...

Como numa seleção natural, onde só os mais fortes sobrevivem, eles se salvaram, estão lúcidos e sadios. O tempo? Já não conta. "Tenho 100 anos nas costas. E são muito pesados. Estamos próximos do fim", diz Efisio. “Agora esperamos o outro mundo”, ri.

Fonte: G1, Colaboração: Houw Ho Ling (23/10/2020)

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