Para entidade, ministro não pode ser o relator porque atuava como AGU quando o processo já possuía 10 votos proferidos
O Instituto de Estudos Previdenciários (Ieprev), terceiro interessado na ação que ficou popularmente conhecida como ‘revisão da vida toda’ para beneficiários da Previdência Social, pediu para que o novo relator, ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), se declare suspeito e impedido de julgar a causa, “em respeito à imparcialidade”.
O ministro André Mendonça tornou-se oficialmente relator do Recurso Extraordinário 1.276.977 no dia 27 de maio. A troca era esperada, uma vez que Mendonça recebeu os processos do ex-ministro Marco Aurélio, que se aposentou, como é o caso deste recurso.
Na petição apresentada nos autos da revisão da vida toda, o Ieprev defende que Mendonça não pode ser o relator porque atuava como advogado-geral da União (AGU) quando o processo já possuía 10 votos proferidos, e a União possui interesse na causa, em favor do INSS. Na visão do Ieprev, essa situação seria o diferencial para afastar a jurisprudência do Supremo de que não existe impedimento da atuação de ministro ex-AGU em processos em que a União.
A entidade lembra que Mendonça já se declarou suspeito na ação conhecida como “dossiê antifascista” em que se discutia no Supremo os atos do Ministério da Justiça relativos à produção e ao compartilhamento de informações sobre a vida pessoal, as escolhas pessoais e políticas e as práticas cívicas de pessoas identificadas como integrantes de movimento político antifascista. Mendonça era ministro da Justiça na época.
O julgamento da revisão da vida toda será reiniciado por causa do pedido de destaque do ministro Nunes Marques feito poucos minutos do prazo final reservado ao plenário virtual. O placar estava 6 a 5 a favor dos aposentados e prevalecia a posição do relator, ministro Marco Aurélio, e o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o assunto, no sentido de que o segurado do INSS tem, diante de mudanças nas regras previdenciárias, o direito de optar pela regra que lhe seja mais favorável. Com a entrada de Mendonça o placar pode ser invertido.
A defesa do aposentado Vanderlei Martins de Medeiros e o próprio Ieprev ajuizaram petições suscitando questão de ordem no processo para anular o destaque do ministro e manter o voto do relator original, ministro Marco Aurélio, a favor dos aposentados, mesmo se a discussão da revisão da vida toda for reiniciada. No entanto, ainda não há decisão sobre esse pedido.
Mesma questão, diferentes valores
De acordo com a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e nota técnica do Ministério da Economia, o impacto de autorizar a revisão da vida toda para os cofres públicos seria de R$ 46,4 bilhões ao longo de dez anos.
Porém, no dia 8 de março de 2022, último dia do julgamento em plenário virtual, equipes do Ministério da Economia e da Previdência Social afirmaram que o impacto estava subestimado e o valor da LDO se referia apenas aos benefícios de aposentadoria por tempo de contribuição, porém, a tese alcança todos os benefícios previdenciários com contribuições anteriores a 1994, como auxílio-doença, pensão por morte e aposentadorias por invalidez, o que elevaria o valor para mais de R$ 360 bilhões.
O grupo “Lesados pelo INSS Revisão da Vida Toda” contesta a previsão do órgão federal de R$ 46 bilhões e contratou estatísticos e matemáticos, que estimam impacto econômico entre R$ 2,7 bilhões e R$ 5,5 bilhões nos gastos federais com Previdência, conforme a mediana do indicador de inflação.
Entenda o julgamento da revisão da vida toda
Em 1999, foi promulgada a Lei 9.876, uma reforma previdenciária que criou duas fórmulas para apuração da média salarial, sobre as quais são calculadas as aposentadorias. A regra geral definiu que, para trabalhadores que começassem a contribuir a partir de 27 de novembro de 1999, o cálculo da previdência deveria ser sobre 80% dos recolhimentos mais altos desde o início das contribuições.
Mas a mesma lei fixou uma regra de transição para quem já era contribuinte: o benefício deveria ser calculado a partir das contribuições realizadas a partir de julho de 1994 (quando foi instituído o Plano Real). No STF, os segurados visam uma revisão, para incluir nos cálculos todo o período de contribuição do segurado, e não só após 1994. Dessa forma, beneficiaria os segurados que tiveram as maiores contribuições antes desse período. Por isso, o processo ganhou o nome de revisão da vida toda.
Até 1994, o país tinha uma alta inflação devido às mudanças frequentes de moedas. Naquele ano, foi instituído o Plano Real. A Lei 9.876/1999 então definiu que iriam ser considerados os salários a partir de julho de 1994. No entanto, algumas pessoas tiveram suas maiores contribuições antes de 1994. Então quando elas começaram a se aposentar depois disso, tiveram benefícios menores do que poderiam ter. E muitas pessoas passaram a entrar no Judiciário para pleitear que a aposentadoria considerasse todo o histórico contributivo, e não apenas de 1994 para frente.
O STJ decidiu, em 2019, pela validade da revisão da vida toda, autorizando que, quando mais vantajosa, os segurados teriam direito ao cálculo da média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a 80% de todo o período contributivo, e não só a partir do Plano Real. O INSS recorreu ao STF por meio do recurso extraordinário que está em análise pelos ministros.
Fonte: Jota (02/06/2022)
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