Em entrevista economista Henrique Jäger, presidente do segundo maior fundo de pensão do Brasil, diz que a Petros quer fortalecer a governança por meio do aumento da transparência e se aproximar do participante
Segundo maior fundo de pensão do Brasil, a Petros, fundação de seguridade dos funcionários da Petrobras, tem hoje R$ 20 bilhões em caixa, contou o economista Henrique Jäger, presidente da entidade, em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast.
Como metade está comprometido com as obrigações dos próximos seis meses, a fundação tem um volume de até R$ 10 bilhões, que pode ir para investimentos. “Tudo muito cuidadosamente escolhido”, enfatiza.
A Petros tem R$ 126,6 bilhões de patrimônio total, com 9,6% aplicados em renda variável, entre ações e fundos de ações e de índice. O restante está aportado em renda fixa (80,9%), investimentos estruturados (3,7%) e imobiliários (3,2%), operações com participantes (2,3%) e investimentos no exterior (0,3%). A Petros tem 131.843 participantes, dos quais 52.567 ativos e 79.276 assistidos.
Os planos de benefício definido (BD), que estão maduros e não recebem novos participantes desde 2000, somam R$ 63,7 bilhões. O PP-2, de contribuição variável (CV), tem R$ 41,3 bilhões, está em fase de acumulação - são 48 mil participantes, sendo 42 mil na ativa - e de expansão. Foi criado em 2007 e deve se tornar o maior da Petros até 2025.
É a segunda vez que Jäger ocupa a presidência da fundação. A primeira temporada foi de 2015 a 2016, época marcada pela CPI dos Fundos de Previdência, que investigou desvios na Petros, na Previ (dos funcionários do BB), Postalis (Correios) e Funcef (Caixa).
Jäger atendeu a reportagem na espaçosa sala da diretoria, ornamentada com vasos de plantas naturais, no 13º andar de um moderno prédio no centro do Rio. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Como estão as alocações dos fundos da Petros?
Nos planos de benefício definido (BD), que estão maduros, a política de investimento é conservadora. Concluímos a estratégia de imunização da carteira. A meta de aquisição de títulos públicos, principalmente NTN-Bs (Tesouro IPCA), foi alcançada no fim de outubro: 82% do patrimônio estão nesses papéis, com títulos marcados na curva - a maior parte - e a mercado - pois temos papéis com vencimento de até cinco anos, para casar com as necessidades de pagamento. Uma parte está em caixa, aplicada em Selic. Não vamos mexer nisso.
E no plano de contribuição variável, o PP-2?
Estamos concentrados em títulos públicos, por conta da rentabilidade e do risco baixo. Mesmo com os dois últimos movimentos do Copom [reduzindo os juros], a rentabilidade fica acima do objetivo de retorno. Para diversificar, tem de ser uma coisa muito boa e segura. A menos que aconteça uma queda mais acentuada dos juros, vamos continuar concentrando em títulos públicos, inclusive no PP-2. Mas, nele, a diversificação é fundamental, com a tendência de queda de juros no médio prazo. A Petros tem de se preparar. Vamos ver quais produtos dialogam com o apetite a risco, olhar para todos os setores e produtos, sempre observando o risco como fator preponderante para a decisão. Não podemos aplicar em ativos com risco muito elevado, que possam ameaçar o resultado; pois, diferente do plano BD, nesta modalidade, se o fundo não performar bem, o participante recebe menos.
Qual é a projeção para a taxa de juros?
O cenário interno trabalhava com a faixa entre 8% e 10% (ao ano) para 2024. Mas é importante lembrar que o cenário externo é predominante no momento.
Quando o cenário internacional começou a influenciar de forma agressiva o nacional, na virada do semestre, reduzimos a exposição em bolsa, e aumentou a liquidez. Hoje temos R$ 20 bilhões em caixa. E precisamos de aproximadamente R$ 10 bilhões para obrigações. Além disso, parte da liquidez está nos planos maduros. São milhões que a gente precisa manter em caixa. E a gente tem de garantir recursos em caixa para não ter de se desfazer de ativo em momentos ruins. Todos os investimentos são muito cuidadosamente escolhidos.
Como é a definição dos investimentos?
Cada plano tem uma política de investimento, com planos de cinco anos e revisão anual, que estamos fazendo agora. As mudanças são estudadas com muito cuidado, sempre testando, casando ativos e passivos. Não se dá cavalo de pau em transatlântico. Temos uma área de risco, que define o portfólio, a partir do qual se faz a compra de ativos. Há uma “Chinese Wall” entre ela e a área de investimentos.
Não se dá cavalo de pau em transatlântico. Temos uma área de risco, que define o portfólio, a partir do qual se faz a compra de ativos.
Como a Petros distribui os aportes em ações?
Por definição, fundos de pensão são minoritários. A gente não pode aplicar mais de 10% dos ativos em um conglomerado econômico. E não posso ter mais de 25% de uma companhia. E, devido ao perfil dos nossos planos, a gente entende que é melhor diversificar do que concentrar em poucos ativos. A gente tinha 11% da BRF. Fomos vendendo e, hoje, temos 2%. Na Vale, tínhamos 3%; hoje, se tem 1% é muito. A estratégia é diluir riscos. Não foi decisão por não gostar dos empresários. É que, quando está na governança, o fundo tem posição mais pesada no ativo, o que dificulta a saída. Tem de olhar com uma perspectiva de longo prazo. A gente quer olhar a nossa carteira de renda variável sempre com a possibilidade de arbitrar e aumentar a rentabilidade. Uma participação menor facilita vender e comprar. Em Petrobras, não podemos investir por conta do endividamento que ela tem conosco.
Quanto a Petrobras deve à Petros?
Deve metade do plano de equacionamento, R$ 20 bilhões. A negociação fechou com pagamento vitalício, até a última pessoa que tem um dos planos com déficit.
Como foi a evolução desse déficit?
Quando cheguei em 2015, havia um estudo mostrando déficit de R$ 5 bilhões. E houve uma tempestade perfeita. A revisão do perfil das famílias, com petroleiros e esposas mais jovens do que se projetava, trouxe mais um incremento. Houve o acidente de Mariana, e a gente tinha exposição de R$ 5 bilhões a ações da Vale quando elas despencaram. A Bolsa caiu de 60 mil para 45 mil pontos. A inflação estava subindo - chegou a bater 16% por conta da crise econômica e política, com o impeachment da presidente Dilma. E a inflação bate direto no passivo, que é corrigido pelo IPCA. Tínhamos a maior parte dos títulos com vencimento de longuíssimo prazo marcados na curva. Quando entrei (2015), o déficit era de R$ 8 bilhões e quando saí (2016), de R$ 22 bilhões.
Como está a negociação do déficit com a Petrobras?
A gente saiu [em 2016] com um plano de equacionamento pronto, mas a nova diretoria adiou a implementação por um ano. Só isso já aumentou em R$ 6 bilhões o déficit. Com as correções, chegou a R$ 40 bilhões. Agora, tem um grupo de trabalho com participação da Petrobras e funcionários da Petros. Ainda está em discussão.
A Petros entra na governança das investidas?
Estar no conselho é consequência da participação acionária. Não queremos participar da gestão das empresas. A estratégia é gerar valor pela diversificação e arbitragem. Não é arbitragem do tipo entrando e saindo o dia todo. Não somos uma asset. Nosso comportamento é muito mais estável. Se houver perspectiva de baixa, começamos a vender. Se tiver perspectiva de alta, vamos comprar. Sempre evitando a superexposição.
Em quais companhias a Petros tem conselheiros?
Entre Conselhos de Administração e Fiscal, temos assento em Bonaire, Hmobi, Invepar, Norte Energia, Multiner e Mesa Air Group. Todos os conselheiros são profissionais externos, contratados por meio de uma política para seleção. O objetivo é ter profissionais com especialização e capazes de ter uma atuação eficaz para gerar valor. E isso contribui para evitar potencial conflito de interesses.
Como ficou a participação da Petros na Sete Brasil? [A Petros era cotista do Fundo de Investimento em Participações (FIP) Sondas, criado para investir na Sete Brasil - que, envolvida em escândalo de corrupção e sem fundos para pagar as sondas que encomendou, entrou em recuperação judicial em 2016]
Zeramos já na minha primeira gestão. E, com uma arbitragem envolvendo a Petrobras, conseguimos reaver R$ 950 milhões do R$ 1,7 bilhão investido.
Como ficaram os investimentos em FIPs de maneira geral?
Na minha primeira gestão na Petros, fizemos mudanças na política de investimentos e suspendemos os FIPs. Até hoje existe uma vedação nos fundos BD. No PP-2, tem de passar pelo conselho deliberativo. Na época, tínhamos uns 35 FIPs, nunca passando de 4% concentrados nos investimentos estruturados. Hoje temos cinco.
Ainda pode haver investimentos no segmento?
Tem muito FIP no mercado oferecendo rendimentos maravilhosos. Mas queremos esperar a implementação da resolução 175 [Marco Regulatório dos Fundos de Investimento], da CVM [Comissão de Valores Mobiliários], e estudar muito. Além disso, os FIPs precisam dialogar mais com o nosso perfil da poupança. Eles têm uma curva J: você aplica, tem um prejuízo e depois passa a ter rentabilidade exponencial. Mas esse prejuízo afeta o participante do plano CV, pois ele recebe em função da quantidade de cotas que tem. Se tiver prejuízo, recebe menos. E quem for receber no futuro vai se beneficiar do resultado do investimento. Aconteceria uma transferência de renda de uma geração para a outra. Os novos fundos vão ter de resolver isso. A indústria precisa se atualizar. Temos discutido isso. Eles avaliam apresentar produtos com rentabilidade menor, combinando empresas mais maduras com outras menos, de modo que se compensem e garantam rentabilidade mínima, que não afete o desempenho do plano.
O que o sr. trouxe de ensinamentos de sua gestão em 2015-2016?
A experiência foi muito intensa e rica. Fiquei mais resiliente e crítico, buscando olhar pelos mais diversos prismas na tomada de decisão, sempre olhando para as consequências. As decisões tomadas aqui tem consequências na vida das pessoas.
O que tem de novidades na Petros?
Hoje, tem três pilares importantes: minimizar o impacto do plano de equacionamento na vida dos participantes, fortalecer a governança por meio do aumento da transparência e aproximar do participante. A vida na Petrobras é muito intensa. Quando o trabalhador sai, surge um vácuo na vida dele. Alguns ficam deprimidos. Queremos ficar mais próximos. A Petros tinha encontros, corridas, coral, atividades. Por conta da pandemia, se afastou dos participantes. Tínhamos atendimento na Bahia, em Sergipe, em Santos e no Rio, que foram fechados. Estamos reabrindo no Rio. Neste mês, lançamos um programa chamado “Petros mais perto de você” para aproximar a Petros do participante, da patrocinadora e dos funcionários.
Fonte: Estadão (20/11/2023)
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