No fim do ano, bancos começam a oferecer planos previdenciários, mas agora eles têm um concorrente no Tesouro Direto! Veja as semelhanças, diferenças e qual opção é mais indicada para você
O fim do ano se aproxima, e nesta época os trabalhadores se preparam para receber o 13º salário, enquanto os bancos começam a oferecer planos de previdência privada, de olho nos recursos extras dos clientes.
Afinal, para aqueles contribuintes que entregam a declaração completa do imposto de renda, é possível deduzir, já na declaração do ano seguinte, aportes feitos em planos PGBL até 31 de dezembro do ano corrente.
Mas no início de 2023, os investidores brasileiros ganharam uma nova opção para pouparem para a aposentadoria e complementarem a Previdência Social. O Tesouro Direto, em parceria com a B3, lançou um novo título público, criado especificamente para este objetivo, o Tesouro RendA+ Aposentadoria Extra (NTN-B1).
Com rentabilidade atrelada à inflação oficial, nos moldes dos títulos Tesouro IPCA+, o Tesouro RendA+ prevê um investimento em duas etapas, com um período de acumulação, durante o qual o investidor faz aportes mensais, seguido de um período de 20 anos durante os quais ele apenas receberá uma renda mensal, também corrigida pelo IPCA.
Trata-se de um investimento muito fácil de simular, entender e acompanhar, com remunerações tão atrativas quanto os demais títulos públicos indexados ao IPCA, além do baixo risco típico dos títulos públicos federais. Não há dúvidas de que o novo título é um excelente investimento, sobretudo para investidores iniciantes.
O objetivo do Tesouro RendA+ não é substituir a Previdência Social, mas complementá-la, da mesma forma que os planos de previdência privada já o fazem. Mas… seria o Tesouro RendA+ capaz de substituir os PGBLs, VGBLs ou mesmo os fundos de pensão oferecidos por empresas a seus colaboradores?
As semelhanças entre o Tesouro RendA+ e os planos de previdência privada
O novo título público e os produtos de previdência privada são bem diferentes, mas não dá para negar que existem semelhanças em seus funcionamentos.
Em ambos os casos, há um período de acumulação de recursos, seguido de uma fase de usufruto do patrimônio construído no investimento.
Na primeira etapa, o investidor deve fazer os aportes - geralmente mensais - para que seu dinheiro seja investido no mercado financeiro. No caso do Tesouro RendA+, o próprio título é o investimento; no caso dos planos de previdência privada, os recursos são aplicados em um fundo de investimento previdenciário, com diversos ativos na carteira.
O dinheiro poupado será então rentabilizado durante vários anos, e o longo prazo ajudará os juros compostos a multiplicarem o patrimônio do investidor.
Na segunda etapa, o investidor pode cessar os aportes e passar a receber uma renda mensal; ou ainda, no caso da previdência privada, optar por apenas fazer resgates periódicos. Esses valores servirão como um complemento à sua aposentadoria pública.
Além disso, nos dois casos o investidor deve primeiro simular o investimento com base na data ou idade da aposentadoria, quanto pode investir por mês e/ou quanto deseja receber no futuro, a fim de definir a melhor estratégia de investimento. Depois disso, ele começa a fazer os aportes e tudo se dá de forma mais ou menos automática.
Os dois tipos de produto também contam com mecanismos para estimular o investidor a permanecer com a aplicação por um prazo longo, ao mesmo tempo em que desestimulam os resgates no curto prazo.
As semelhanças param por aí; veja as diferenças entre o Tesouro RendA+ e os planos de previdência privada
As diferenças, no entanto, são bem mais numerosas, como veremos a seguir:
Flexibilidade e customização vs. padronização
Nos planos de previdência privada, você pode personalizar a duração da fase de acumulação e até manter-se nela indefinidamente, usando o plano como uma aplicação financeira e planejando resgates periódicos após a aposentadoria.
Caso opte por passar para a fase de renda, esta pode ou não ser vitalícia, cobrindo o chamado “risco de sobrevivência” - isto é, de viver por mais tempo do que o inicialmente estimado.
Já no caso do Tesouro RendA+, não há essa flexibilidade de prazos. O Tesouro Direto oferecerá sempre um conjunto limitado de títulos com prazos determinados de acumulação seguidos de um período padronizado de 20 anos (240 meses) para o investidor receber os rendimentos mensais.
Inicialmente, estão sendo oferecidos títulos com oito datas de conversão, como são chamadas as datas em que o investidor passa da fase de acumulação para a de renda: 2030, 2035, 2040, 2045, 2050, 2055, 2060 ou 2065.
A ideia básica é que o investidor escolha um desses anos para se aposentar e compre, todo mês, até a data de conversão, títulos com o mesmo vencimento. Caso deseje começar a receber a renda em 2030, por exemplo, ele deverá comprar sempre títulos com esta data de conversão. Depois, receberá uma renda mensal de janeiro de 2030 até dezembro de 2049.
É claro que o investidor pode comprar títulos de diferentes datas de conversão e com isso acabar cobrindo um prazo superior a 20 anos de aposentadoria, mas ficaria a cargo dele mesmo fazer esse planejamento, ainda que contando com o auxílio das simulações do Tesouro. A renda vitalícia de uma previdência privada dispensa esse planejamento extra.
Diversificação e menos previsibilidade vs. concentração e mais previsibilidade
Enquanto os planos de previdência privada investem em fundos, que podem ser bastante diversificados, com um gestor responsável pela escolha dos ativos, o Tesouro RendA+ concentra toda a reserva para a aposentadoria em um único produto, um título de renda fixa indexado à inflação.
Como os demais títulos dessa natureza, o Tesouro RendA+ pagará uma taxa prefixada (conhecida no ato da compra do título) mais a variação do IPCA durante o prazo do investimento.
Em investimentos de longo prazo, a diversificação costuma ser desejável, dado que mitiga o risco do investimento. É, assim, um ponto positivo dos planos de previdência privada, que podem - se for adequado ao perfil do investidor - investir até mesmo em ações ou no exterior.
No caso do Tesouro RendA+, porém, não dá para dizer que a concentração em uma única estratégia torna o investimento arriscado. Afinal, trata-se de um título público, portanto, com garantia do governo federal. É o risco de calote mais baixo da economia brasileira.
Além disso, o título oferece proteção contra a perda do poder de compra, por ser indexado à inflação, algo extremamente bem-vindo quando falamos de investimento de longo prazo.
O risco maior fica por conta da volatilidade, pois os preços dos títulos públicos atrelados à inflação oscilam, no dia a dia, de acordo com as perspectivas para as taxas de juros no futuro. No entanto, quem fica com o investimento até o vencimento, recebe exatamente a rentabilidade contratada.
Trata-se, portanto, de um investimento interessante para quem não quer ou não pode correr muito risco, com uma rentabilidade que, no Brasil, costuma ser boa, pois historicamente nossas taxas de juros são elevadas.
A desvantagem da falta de diversificação, neste caso, está no fato de que o investidor não tem chance de ganhar, no vencimento, um retorno real (acima da inflação) superior à taxa prefixada contratada na compra do título. A rentabilidade, assim, não será menor que o esperado, mas também não será maior.
Nos planos de previdência que investem em bons fundos, porém, a rentabilidade pode acabar superando o inicialmente estimado, dependendo do grau de liberdade do gestor e dos ativos que ele escolher para compor a carteira. Mas o contrário, claro, também pode acontecer, e o retorno dos fundos pode decepcionar.
Tributação: a principal diferença
Talvez a maior diferença entre o Tesouro RendA+ e os planos de previdência privada seja o fato de estes contarem com incentivos tributários, enquanto o novo título público não.
A tributação do Tesouro RendA+ seguirá a tabela regressiva válida para os demais títulos públicos e outras aplicações de renda fixa, em que a alíquota de IR diminui de acordo com o prazo de investimento.
Prazo (em dias corridos) | Alíquota de IR |
De 0 a 180 dias | 22,5% |
De 181 a 360 dias | 20% |
De 361 a 720 dias | 17,5% |
Mais de 720 dias | 15% |
Repare que, neste caso, a menor alíquota possível, aquela que o investidor pegará caso realmente fique com o título até o fim do prazo, é a de 15%. Caso ele acabe vendendo o papel no curto prazo, as alíquotas podem ser maiores. Vale lembrar que o Tesouro RendA+ tem liquidez diária como todos os demais títulos públicos. A única diferença é que ele tem uma carência de 60 dias para venda.
Já nos planos de previdência, o investidor pode escolher entre duas tabelas de tributação: a progressiva - com as mesmas alíquotas válidas para salários e rendas como aluguéis, pensões e aposentadorias -, e uma tabela regressiva especial, válida apenas para a previdência privada.
No primeiro caso, as alíquotas variam de zero a 27,5% e crescem conforme o valor recebido; já no segundo caso, as alíquotas variam de 35% a apenas 10% e diminuem com o tempo.
Tabela progressiva (a partir de maio de 2023)
Rendimento mensal | Alíquota | Parcela a deduzir do IRPF |
Até R$ 2.112,00 | - | - |
De R$ 2.112,01 até R$ 2.826,65 | 7,5% | R$ 158,40 |
De R$ 2.826,66 até R$ 3.751,05 | 15,0% | R$ 370,40 |
De R$ 3.751,06 até R$ 4.664,68 | 22,5% | R$ 651,73 |
Acima de R$ 4.664,68 | 27,5% | R$ 884,96 |
Tabela regressiva da previdência privada
Prazo | Alíquota |
Até 2 anos | 35% |
Acima de 2 anos e até 4 anos | 30% |
Acima de 4 anos e até 6 anos | 25% |
Acima de 6 anos e até 8 anos | 20% |
Acima de 8 anos e até 10 anos | 15% |
Acima de 10 anos | 10% |
Aqui já dá para ver que, caso resgate o Tesouro RendA+ no curto prazo, o investidor tem uma “punição” menor do que no caso da previdência privada. Entretanto, se ficar na previdência por mais de dez anos, o que é bem razoável quando falamos de aplicações para a aposentadoria, ele obtém uma alíquota de IR mais vantajosa.
Além disso, os fundos de pensão - oferecidos por empresas como benefício a seus empregados - e os planos tipo PGBL (Plano Gerador de Benefício Livre) contam com um grande benefício tributário extra: as contribuições feitas ao plano podem ser abatidas na declaração de imposto de renda em até 12% da renda bruta tributável anual. Mas claro que só se beneficia disso quem entrega a declaração completa.
Isso significa que o investidor só irá pagar o IR sobre essa parcela dos seus rendimentos quando for resgatar o plano de previdência (no caso de fundos de pensão e PGBLs, o IR incide sobre todo o valor resgatado, e não apenas sobre a rentabilidade). Caso opte pela tabela regressiva, ele ainda reduzirá a alíquota de IR a apenas 10%. Ou seja, na prática ele não só adia o pagamento do IR como efetivamente paga menos imposto.
Custos: Tesouro RendA+ pode sair até de graça
No caso do Tesouro RendA+, o incentivo ao investimento de longo prazo - e o desincentivo ao resgate antecipado no curto prazo - ficou a cargo não da tributação, mas da taxa de custódia.
Para quem for receber rendimentos inferiores a seis salários mínimos após a data de conversão do seu título (o equivalente a R$ 7.812 em valores de hoje), a taxa de custódia do Tesouro RendA+ será zero.
Já para quem investir o suficiente para ganhar acima desse valor pagará uma taxa de custódia de 0,10% ao ano, proporcional ao excedente, isto é, ao valor do rendimento que ultrapassar os seis salários mínimos.
Se houver resgate antecipado, porém, o investidor pode ter de pagar uma taxa de custódia mais alta, mas decrescente de acordo com o prazo em que permaneceu com o investimento:
- Até 10 anos de investimento: 0,50% ao ano sobre o valor do resgate;
- De 10 a 20 anos de investimento: 0,20% ao ano sobre o valor do resgate;
- Mais de 20 anos de investimento: 0,10% ao ano sobre o valor do resgate.
Já nos planos de previdência privada, paga-se uma taxa de administração anual sobre o valor investido e dificilmente ela será inferior a 0,50% ao ano, a taxa máxima do Tesouro RendA+. Isso sem falar numa eventual taxa de carregamento, que já caiu em desuso, mas ainda é encontrada em alguns planos.
Assim, no quesito baixo custo, não há dúvida de que o Tesouro RendA+ ganha de lavada.
Planejamento sucessório, seguros e pensões: outros benefícios dos planos de previdência
Para além da dimensão de investimento, os planos de previdência privada contam com vantagens para o planejamento sucessório, além de uma série de outros benefícios, dos quais o Tesouro RendA+ não dispõe.
PGBLs e VGBLs não entram em inventário quando o titular do plano morre, passando diretamente aos herdeiros e podendo ainda ficar isentos do imposto sobre heranças.
Além disso, é possível incluir como beneficiários do plano pessoas que não sejam os herdeiros obrigatórios do titular, para que tenham o direito a receber recursos após a sua morte.
Finalmente, é possível incluir no plano seguro contra invalidez, pensão por morte aos beneficiários ou mesmo escolher que a renda vitalícia seja, após a morte do titular, revertida aos beneficiários, de forma vitalícia ou não. Não são todos os planos que oferecem essas alternativas, mas elas estão entre os seguros que as previdências privadas podem oferecer a seus clientes.
Afinal, o Tesouro RendA+ é capaz de substituir a previdência privada?
Dito tudo isso, fica claro que o novo título público e os planos de previdência privada são produtos bem diferentes. E, em muitos casos, não convém simplesmente trocar a previdência privada pelo Tesouro RendA+.
Se você tem acesso a um fundo de pensão na empresa onde trabalha e seu empregador também contribui para o plano em seu nome, certamente vale a pena aproveitar.
O mesmo vale para quem entrega a declaração completa do imposto de renda: também não compensa abrir mão de um PGBL para poder abater as contribuições.
Nessas duas situações, o Tesouro RendA+ pode atuar como um complemento da previdência privada, para receber por exemplo as contribuições que excedam os 12% da renda bruta tributável anual, e já garantindo uma renda mínima na aposentadoria, caso o retorno da previdência acabe sendo inferior ao esperado.
Para quem precisa fazer planejamento sucessório - em geral indivíduos com patrimônio maior - ou quer garantir uma renda para herdeiros financeiramente dependentes após a sua morte, também não há dúvidas de que a previdência privada é o caminho a se seguir.
A dúvida pode recair mais sobre quem entrega a declaração simplificada de IR e não tem acesso a previdência privada pelo empregador, o que lhe faria normalmente optar por um VGBL.
Nesse caso, a escolha vai depender muito do perfil do investidor: para quem tem bastante prazo pela frente, pode ser mais interessante investir em um VGBL que possa investir em ativos mais arriscados, mas que possam trazer maior retorno, ou mesmo combiná-lo com o Tesouro RendA+.
Para quem tem menos prazo pela frente, é mais iniciante ou simplesmente não quer se dar ao trabalho de entender um pouco mais sobre planos de previdência e pesquisar um bom produto, o novo título público aparece como uma alternativa bastante prática, simples de entender e fácil de acompanhar, já capaz de “segurar as pontas” na aposentadoria.
Fonte: Seu Dinheiro (13/11/2023)
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