Estudo analisou diversas janelas possíveis para que o dinheiro não esgotasse em 30 anos e 4% foi a taxa que funcionou para o pior cenário
Para quem deseja ter um futuro tranquilo financeiramente, é preciso pensar desde cedo sobre o quanto é necessário acumular de patrimônio ao longo da vida para a aposentadoria. Muitos métodos ajudam nessa matemática, como a regra dos 4%, que ajuda a ter uma ideia de como vai ser a sua renda durante o período a partir de uma taxa máxima anual de retirada segura.
A regra é aplicada para dois objetivos: entender quanto acumular para a aposentadoria e como (qual percentual sacar) usufruir do patrimônio durante o período.
Carolina Frigerio, planejadora financeira, explica que o método ajuda a entender quanto a pessoa deveria ter de patrimônio para conseguir viver de renda. O conceito, diz ela, foi sugerido por William Bengen e divulgado em 1994 no Journal of Financial Planning. Ele analisou o desempenho de diferentes carteiras de investimento, em diferentes janelas, começando em 1926 e finalizando em 1995.
“No estudo, concluiu-se que a retirada de 4% no primeiro ano, seguida de retiradas anuais de 4% mais inflação, fariam com que o montante investido durasse, no pior cenário, pelo menos, 30 anos. Exatamente por isso, a regra dos 4% também é conhecida como Taxa Segura de Retirada (TSR)”, explica a planejadora.
A TSR é o quanto você pode sacar anualmente dos seus investimentos (4% do seu patrimônio), sem que o valor se esgote. Frigerio explica que o intuito do estudo foi justamente simular taxas de retiradas, considerando diferentes alocações de carteira, que teriam resultados satisfatórios mesmo passando por períodos intensos de recessão, guerra e inflação.
Como calcular quanto poupar?
Antes de mais nada, para usar a premissa, é preciso saber “quanto custa ser você”, diz Frigerio. Para o cálculo, não basta saber o quanto você gasta por mês, é preciso entender quais são os custos da sua vida ao longo de um ano, tendo em vista que muitos gastos são esporádicos, como as férias.
“Essa é uma das variáveis mais importantes e que terá influência direta no quanto você precisa acumular. Importante: melhor ainda se puder estimar quanto você custará no futuro. Suponhamos que você tenha estimado que precisa de R$ 120 mil no ano para poder se bancar. Quanto você precisaria ter de patrimônio para poder viver da renda dos seus investimentos? Basta multiplicar R$ 120 mil por 25, ou dividir R$ 120 mil por 4%, que dá no mesmo. Você terá um total de R$ 3 milhões, sendo esse o patrimônio necessário”, explica Frigerio.
A lógica dos 4% é que, até então, os planejamentos de aposentadoria costumavam utilizar as médias históricas de rentabilidade, que ficavam na casa dos 7-8% ao ano. No entanto, para mitigar cenários de estresse, caso a pessoa tenha o azar de enfrentar um período de crise logo após decretar a sua aposentadoria e não sofrer um baque bem na largada e isso comprometer o plano de retiradas, o percentual foi ajustado para um cenário mais conservador que a taxa média de retorno real anual.
O estudo analisou diversas janelas possíveis para que o dinheiro não esgotasse em 30 anos e 4% foi a taxa que funcionou para o pior cenário. “Se essa retirada aumentasse para 5%, teríamos mais janelas com o dinheiro acabando antes do prazo. Por outro lado, por ser conservadora, os 4% de retirada, em muitos casos, significa que o investidor terminaria a vida com patrimônio ainda maior”, comenta.
“Muitos criticam o estudo porque uma janela de 30 anos pode ser curta demais para quem quer se aposentar cedo, mas precisamos lembrar que essa foi a janela utilizada por ser um período típico de aposentadoria e o mais importante: a partir de uma janela de 30 anos, os juros compostos possuem um efeito 'bola de neve' muito significativo, tendo pouca diferença um período de desacumulação de 30 ou 50 anos”, explica a especialista.
Mas vale para todo mundo? Quais os cuidados?
Frigerio pondera que uma confusão comum é a pessoa achar que pode sacar 4% do seu patrimônio todo ano, independente da oscilação. “Não é isso. A regra está baseada em sacar 4% do patrimônio no 1º ano da aposentadoria e, nos anos seguintes, corrigir esse valor pela inflação, independente da variação dos investimentos. Subiu muito? Continua com o valor sacado no 1º ano reajustado pela inflação. Caiu muito? Idem”, detalha.
Além disso, a especialista ressalta que o método é uma “ótima base para saber o tamanho da montanha que precisa escalar", pois dará uma dimensão realista do patrimônio a ser acumulado. Mas, como qualquer método, "não é uma bala de prata”, ressalta, comentando que o planejamento financeiro de aposentadoria precisa considerar o contexto individual de cada pessoa.
“É muito comum pensarmos nossa aposentadoria como uma idade por conta do INSS ou como investimentos em previdência privada. Contudo, gosto de fazer a provocação que aposentadoria é a sua carteira de investimentos e o total de patrimônio que você precisa acumular.”
Por isso, a regra dos 4% funciona como uma base de cálculo para o total de investimentos que a pessoa precisa ter na carteira para se aposentar, preferencialmente, de maneira diversificada.
Guilherme Baía, planejador financeiro, também explica que a premissa pressupõe que o valor sacado será menor que os rendimentos, mas depende essencialmente do quanto se acumula. "Considere alguém que começou muito tardiamente e não chegou a juntar mais que dois anos de despesas mensais (24 meses). Nesse caso, 4% corresponderia a um (0,96) mês de despesas pagas para um ano", explica.
Baía aconselha que, quem quiser começar a pensar em acumular recursos para o período de aposentadoria, deve levar em conta os seguintes fatores:
- Capacidade mensal de poupança — quanto a pessoa conseguirá poupar em cada mês para o patrimônio acumulado no futuro;
- Tempo até o momento da conversão para o início dos saques;
- Nível de risco assumido (perfil de investidor) — em que tipo de investimentos o portfólio se diversificará;
- Estimativa de longevidade;
Com essas informações é possível chegar ao valor bruto de saque que duraria até o fim da vida, mas será preciso considerar também se esse valor será suficiente para a vida que se pretende levar na velhice, comenta o especialista.
"Embora os resultados não sejam simples de se obter, não se deve abandonar a ideia e, quanto antes se começar, melhor, sabendo que o tempo é um aliado melhor que alta rentabilidade quando se fala de aposentadoria", recomenda Baía.
"Além disso, é preciso ter paciência. Quem consegue poupar 10% da renda, significa que precisa de 90% para as despesas. Assim, para que junte 6 meses de despesas (540% da renda), são necessários quase 5 anos", diz.
Os cálculos ainda precisam levar em conta a inflação e a tributação. Em alguns casos, o melhor seria buscar um planejador que, além de realizar os cálculos, apontaria outras questões que podem alterar sensivelmente os resultados como herança potencial, necessidade de cuidar dos pais, nível de dependência dos filhos, entre outros.
Fonte: Valor Investe (06/04/2025)
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