quarta-feira, 13 de abril de 2022

Revisão Aposentadoria: Pedido de destaque no STF sobre a Revisão da Vida Toda e a necessidade de aperfeiçoamentos



Ato do ministro Nunes Marques no julgamento da revisão da vida toda escancarou anomalias processuais

A Resolução nº 642/2019 em seu artigo 4º prevê o “pedido de destaque”, em que as partes ou um dos ministros do STF requerem a solicitação para que o processo seja retirado do plenário virtual e o julgamento ocorra no presencial, anulando todos os votos. Ocorre que este é um novo procedimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal, e sua adequação está sendo feita conforme surgem novas situações.

O STF necessita adequar este mecanismo, pois ele pode acabar se tornando um “recurso de ministro contra ministro”, criando um terrível precedente infralegal. Uma ação em especial nos chama atenção: a revisão da vida toda, pois este pedido de destaque, realizado pelo ministro Nunes Marques, escancarou anomalias processuais que podem surgir com o seu uso.

O processo já estava com 11 votos juntados, inclusive o do ministro divergente que solicitou a anulação do julgamento. Um processo anulado, que afeta a vida de milhares de idosos brasileiros que por anos aguardavam a concretização do seu direito. Isso causou espanto e temor em toda a comunidade jurídica, pois este perigoso precedente pode diminuir a importância do colegiado, onde um integrante da Corte, descontente com o julgamento, anula sem motivação aceitável todo o trabalho já realizado, trazendo insegurança jurídica aos cidadãos.

O pedido de destaque realizado por um ministro se mostra como instrumento capaz de contribuir para a produção de um julgamento mais deliberativo, que busca aumentar a troca de argumentos e informações sobre o caso. Porém, este processo possui grande produção de provas, incluindo a juntada de sustentações orais, parecer do PGR, diversos memoriais aos gabinetes com seus respectivos despachos, Nota Técnica do Ministério da Economia sobre o custo da ação e até mesmo o voto divergente de Nunes Marques.

O voto do ministro adentrou nas questões levadas pelas partes, e isso demonstrou a profundidade do debate trazido, deixando-lhe confortável para declarar sua decisão. Todas as partes conseguiram exaurir a produção de provas para a elucidação do tema deixando os julgadores convictos para proferirem seus votos, acompanhando ou não a fundamentação do relator, pelo desprovimento do recurso do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

O pedido de destaque deve ter uma motivação que fundamente a sua requisição e posteriormente a aceitação do órgão, e este é o entendimento externado pelo ministro Nunes Marques, quando relator da ADI 6.630/DF, que indeferiu pedido de destaque feito pela parte. Sua fundamentação foi:

“2 — O fato de ocorrer em ambiente virtual não restringe nem desqualifica a análise da demanda. Alterações foram recentemente promovidas no Regimento Interno a fim de aproximar, tanto quanto possível, essa modalidade de julgamento do realizado presencialmente”.

E mais: “Os ministros possuem amplo acesso às peças processuais, e os votos são disponibilizados, à medida que proferidos, no sítio eletrônico do Tribunal. Ausente excepcionalidade a justificar o acolhimento da pretensão, mostra-se oportuno o exame do mérito”.

Portanto, o próprio ministro Nunes Marques, acertadamente, entende que o pedido de destaque necessita de uma excepcionalidade. E não ocorreu qualquer exceção, nova prova ou ato processual que justificasse este pedido na revisão da vida toda. O colegiado votar diferente do que um ministro espera não é motivo de anulação de julgamento. Se mostrou evidente que a decisão do colegiado passa a ter um peso menor que o pedido realizado por um ministro, caso ele não concorde com a solução da Corte na matéria. A resolução se tornou mais forte que o regimento interno.

O pedido de destaque deve ter um limite temporal para que ministros exerçam sua prerrogativa de requerer e também a necessidade de motivação. Caso não ocorra um novo ato processual que justifique a anulação do julgamento, este deve encerrar no plenário virtual. No caso tratado, a preclusão é medida impositiva, pois deveria ser realizado antes ou durante o seu voto, e não posteriormente. E vou além, foi solicitado o destaque após a juntada dos 11 votos, tendo conhecimento do resultado final, ferindo frontalmente a segurança jurídica e credibilidade das decisões do plenário.

O STF deve se atentar aos votos já juntados de quem não faz mais parte da composição da Corte, devendo ser mantidos por uma imposição processual e regimental. O Regimento Interno do STF possui força de lei, e a resolução não pode prevalecer sobre este. Caso o pedido de destaque seja acatado, e o julgamento venha a ocorrer presencialmente, o regimento é lei material, e prevê em seu artigo 134 que reiniciado o julgamento, “serão computados os votos já proferidos pelos ministros, ainda que não compareçam ou hajam deixado o exercício do cargo”.

Caso um ministro, que já votou, deixe seu cargo, o seu voto deve permanecer. Se isso não for respeitado, passamos a ter até mesmo o poder de escolha do colegiado quando um ministro requer o destaque, pois no próximo ano teremos mais dois ministros se aposentando. O pedido de destaque pode ser perigoso a toda decisão dada pelo colegiado, em que um ministro pode vetar de forma estratégica a decisão de outros seis ou mais, e aguardar nova formação do colegiado para lhe garantir a vitória.

Notem como a ação se faz emblemática, pois a cadeira do ministro aposentado hoje pertence ao ministro André Mendonça, que era advogado-geral da União quando a ação já possuía dez votos juntados no STF. Após o pedido de destaque, o seu sucessor na AGU, Bruno Bianco, afirmou que “o INSS é um cliente da AGU” e iria lutar com afinco para derrubar este direito dos aposentados. Percebemos como a questão se mostra complexa?

E mais, para a manutenção do voto do ministro aposentado, o CPC artigo 941, §1º afirma que “o voto poderá ser alterado até o momento da proclamação do resultado pelo presidente, salvo aquele já proferido por juiz afastado ou substituído”. O texto previsto permite a alteração do voto, porém isso não será possível no caso de juiz afastado ou substituído, o que ocorreu neste processo.

Na ADI 6.630/DF foi apresentada questão de ordem, em que a parte requereu a reiteração das sustentações orais, em razão de pedido de destaque. Os atos que ocorreram no plenário virtual foram confirmados novamente. Disse a ministra Cármen Lúcia:

“Digamos que tivesse havido ali, nos votos que já foram tomados, alguém que se aposentou, que na minha compreensão do Regimento não permite sequer o destaque, porque o Regimento impede esse tipo de situação. O voto tomado do aposentado, que estava no exercício regular, não pode ser desfeito”.

O processo traz fatos que demonstram a total necessidade da resolução ser reestruturada: um ministro vencido anula a decisão do colegiado sem fundamentar, com isso o voto do relator aposentado pode não ser aproveitado e hoje a sua cadeira é ocupada por um ministro que era parte no processo. A legislação deve se atentar aos atos improváveis, pois eles não são impossíveis.

O julgamento em plenário virtual deve se tornar uma realidade mais presente, por isso a importância de adequarmos a resolução para que não se sobreponha a regimentos, códigos e princípios administrativos (moralidade, finalidade e motivação), e não acabar se tornando um ato que não condiz a finalidade da norma.

Deve haver um motivo determinante para a anulação de todo um julgamento, segundo Gaston Jèze, a atividade dos agentes administrativos, no exercício da competência, somente pode ter por motivo determinante o bom funcionamento do serviço público. Este é um princípio basilar no direito administrativo. No Brasil, a teoria dos motivos determinantes é utilizada para a situação em que os fundamentos de fato de um ato administrativo sejam a validade do mesmo, dependendo de uma justa motivação para a prática do ato. Assim, havendo comprovação de que o alegado pressuposto de fato é falso ou inexistente, o ato obrigatoriamente é nulo.

Seria uma perigosa inovação processual quem teve seu voto vencido buscar reverter votos que são contrários a seu posicionamento por meio de veto. Este mecanismo trará ofensa aos princípios da colegialidade, segurança jurídica, devido processo legal e juiz natural, seguranças da legitimidade democrática.

No processo, ficou claro que “jamais uma regra de transição pode ser mais desfavorável que uma regra permanente”, e este era o posicionamento da Corte no RE 524.189, julgado de forma unânime, que entendi tal possibilidade como “absurda”. As regras de transição devem abrandar efeitos, nunca trazer prejuízos ao segurado. Na exposição de motivos do projeto da Lei 9.876, a regra transitória do artigo 3º teria a função teleológica de favorecer o segurado já filiado antes da sua vigência.

Esta aspiração se acha em evidente harmonia com a finalidade típica das normas de transição dos regimes previdenciários, que possuem por finalidade trazer segurança jurídica para as relações. Nas palavras de Thomas Jefferson “a aplicação das leis é ainda mais importante que a sua elaboração”. O STF havia cumprido o papel de aplicar o desejo do legislador.

Fonte: Jota e João Badari (11/04/2022)

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