Embora esses conceitos ainda pareçam nebulosos para muita gente, a ideia de que 'o futuro já começou' permeou o clima do evento de inovação em Lisboa. E a palavra que guia as novas tendências mundiais é 'autonomia'.
Os conceitos de NFTs, metaverso e Web3 ainda são nebulosos para muitas pessoas. Do mesmo modo, muita gente ainda não entende a transformação trazida pela chamada "era dos dados" (em que praticamente tudo sobre a vida dos consumidores pode ser mapeado pelas empresas por meio da internet). Mas em ambientes de tecnologia e inovação, como na conferência Web Summit, que acontece em Lisboa, os assuntos não só estão em evidência como são algumas das principais pautas de debates. A ideia de que "o futuro já começou" permeia o clima do evento e a palavra da vez é "autonomia".
A existência do metaverso e das NFTs são alguns exemplos práticos de como funciona a chamada Web3, nova fase da internet que conhecemos. Nela, a ideia principal é a descentralização do poder. Portanto, as pessoas conseguem fazer coisas pela internet sem ter um intermediário mediando suas ações on-line. E essas ações podem ser coisas mais simples, como conversas virtuais com seus amigos, até processos mais complexos, como a criação de um site, a compra de um ativo financeiro ou o envio de pagamentos.
A ferramenta que possibilita essa descentralização é a chamada blockchain, a mesma usada como base de negociação das criptomoedas. Ela funciona como uma espécie de livro de caixa criptografado, que registra informações (inclusive transações financeiras) na internet, mas de forma permanente e imutável. Esse sistema é compartilhado, por isso, qualquer pessoa pode registrar uma informação nele por meio de alguma plataforma que permita isso, como é o caso da rede Ethereum. Com isso, apenas aquela pessoa (e a outra parte envolvida naquela transação ou troca de informações) tem acesso a esse registro.
É via blockchain que as NFTs são negociadas e que o metaverso é construído. Os tokens não fungíveis (ou NFTs, na sigla em inglês) são certificados digitais, registrados na blockchain, que determinam que um ativo pertence a uma determinada pessoa. Trocando em miúdos, os NFTs representam virtualmente qualquer tipo de item, que pode ser real ou intangível, como artes visuais, músicas, vídeos, itens virtuais dentro de videogames (como roupas, armas, avatares), etc.
Já o metaverso traz a ideia de um mundo virtual em que se consiga fazer tudo que se faz no mundo real. Ou seja, o usuário pode ter experiências cada vez mais imersivas por meio dele, como "visitar" um lugar e interagir com outras pessoas.
Embora a ideia do metaverso ainda assuste alguns investidores, que temem que o investimento da Meta (novo nome da empresa dona do Facebook) nele não dê retornos, no ambiente da tecnologia ele já é uma realidade consolidada. Não à toa, não era difícil encontrar, no Web Summit, stands de empresas que ofereciam aos visitantes experiências e "passeios" por meio de ferramentas como óculos de realidade virtual, por exemplo.
Durante sua participação na conferência, a principal executiva de produto da Meta, Naomi Gleit, definiu o metaverso como a evolução da internet que conhecemos, que acontece "em duas dimensões" (ou seja, em 2D) para uma experiência 3D. Isso significa, portanto, que essa experiência será cada vez mais imersiva.
Especialistas garantem, no entanto, que sua existência independe do tipo de dispositivo. Em uma palestra sobre a monetização do metaverso, Amanda Cassatt, presidente da Serotonin, uma empresa de marketing voltada para a Web3, afirmou que existirão óculos, fones de ouvido e até outros dispositivos mais modernos, como implantes, para trazer o metaverso para a vida das pessoas. Porém, em muitas vezes essa experiência será por meio do próprio smartphone.
Na mesma palestra Amy Peck, fundadora e presidente do EndeavorXR, uma empresa de tratamento via videogame para crianças com transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), também comparou o metaverso com um "site em três dimensões" e disse que "no futuro, as pessoas não discutirão se devem ou não estar no metaverso, porque todos já estarão".
Um exemplo de investimento já avançado no metaverso vem de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. Durante a palestra, Maha Abouelenein, fundadora e presidente da agência de comunicação Digital & Savvy, falou sobre a estratégia Metaverso Dubai. A iniciativa pretende trazer serviços governamentais para o metaverso.
"Se você precisar de qualquer serviço do governo, pode fazê-lo em um escritório do governo, pode fazê-lo por meio do seu aplicativo ou pode ir ao metaverso. Você entra no metaverso do Ministério da Economia por exemplo e um agente vem te ajudar. Você recebe ajuda em tempo real. Dubai é a primeira cidade do mundo que vi oferecendo serviços governamentais ao vivo no metaverso", conta Abouelenein.
No lançamento da ferramenta, o governo de Dubai afirmou que queria "substituir o site 2D para um metaverso 3D que fosse imersivo e possibilitasse que os usuários interagissem com as pessoas.
Para a Abouelenein, existem muitas oportunidades de criação no metaverso, especialmente em áreas de educação, infraestrutura, tecnologia e saúde.
Gleit, da Meta, também trouxe exemplos semelhantes. Em sua palestra, a executiva disse que existem "jogos" de realidade virtual feitos para treinarem profissionais, como é o caso de estudantes de medicina que treinam operações em simuladores em que realmente conseguem sentir os órgãos e ossos dos "pacientes".
Em sua fala, a executiva também afirmou que o metaverso existirá com ou sem os investimentos da Meta feitos nele e fez questão de destacar que uma das principais características do movimento é permitir que qualquer um crie algo nele.
Além de permitir que qualquer pessoa produza coisas na internet, a blockchain também dá autonomia para seus usuários armazenarem e manusearem seus dados do jeito que melhor os convém. Durante uma palestra sobre NFTs, Pierre-Nicolas Hurstel, co-fundador da carteira de NFTs Arianee, a tendência é que as pessoas armazenem todas as suas informações em carteiras digitais.
"Hoje, você tem seguidores no LinkedIn, tem seguidores no Facebook, mas não pode trazê-los para lugar nenhum, você não é dono desses dados. Agora, você pode ser dono da sua presença digital, pode ter provas de que aquelas informações pertencem a você, ou que você tem mesmo aquele amigo no mundo digital. Tudo isso vai nos devolver o controle, como indivíduos, da maneira como interagimos nos espaços digitais", afirma. Para ele, essa tendência "vai resolver os principais problemas da internet hoje", como a centralização e monetização dos dados.
Para William Quigley, co-fundador e presidente da empresa de carteira digital WAX, no futuro muitos produtos estarão "tokenizados". Isso significa que até mesmo as coisas que as pessoas consumirem no mundo "real" terão um registro on-line.
"Eu acho que, para todos nós, o maior impacto que os NFTs terão é tokenizar os produtos de consumo", afirma. "Acredito que nos próximos 10 anos, a maioria dos produtos de consumo terá 'gêmeos digitais' que serão vinculados ao produto original", diz. Para ele, uma vantagem disso será a possibilidade de verificar a proveniência daquele item e a liberdade de as pessoas poderem negociá-los.
É aí que a discussão volta à importância dos dados, uma vez que tudo estará registrado na internet e pertencerá aos próprios consumidores. Na sociedade contemporânea, um dos ativos mais valiosos são as informações pessoais das pessoas. Afinal, ao ter conhecimento sobre hábitos, características e até a saúde de um consumidor, uma empresa consegue captá-lo, oferecendo produtos e serviços praticamente "customizados" para aquele cliente.
E é isso que muitas companhias têm feito. A temática foi abordada em uma palestra feita por Sudheesh Nair, presidente da ThoughtSpot, empresa que oferece softwares de análise de dados. Em sua fala, o especialista afirmou que as companhias precisam estar atentas a iniciativas recentes como o Open Banking, que dão aos consumidores o poder sobre seus próprios dados.
Por meio delas, as pessoas estão aptas a compartilhar informações pessoais, como hábitos e transações financeiras, práticas de consumos e até de saúde com as empresas que quiserem, e não só com aquelas em que são clientes. O objetivo disso é que o consumidor "se apresente" para outras companhias. Uma vez que têm essas informações, as empresas podem oferecer produtos e serviços customizados e até mesmo com taxas adapatadas para aquele cliente.
Segundo Nair, é justamente isso que o consumidor procura ao compartilhar suas informações. "O objetivo dele é ter uma experiência mais personalizada junto daquela empresa", afirma. "As pessoas querem ser tratadas como pessoas e não como números", conclui. E, segundo o especialista, é isso que as companhias precisam oferecer.
Para Nair, essa "customização" dos serviços vem acontecendo de forma cada vez mais intensa. Alguns exemplos disso, segundo o especialista, são os próprios carros de aplicativos, em que o cliente pode escolher se quer um carro "comum", um mais confortável, um com bagageiro maior ou um que caiba mais pessoas.
Outro exemplo trazido pelo especialista que evidencia ainda mais a necessidade e busca dos consumidores por experiências particulares é a possibilidade de customização de itens de vestuário, por exemplo.
Segundo o especialista, hoje é possível que clientes entrem em sites de marcas massivas como a Nike e "montem" um tênis do jeito que querem. "Dessa forma, cada um de nós aqui desta sala pode ter um tênis exclusivo que mais ninguém tem", afirma.
Portanto, as companhias precisam, cada vez mais, se adaptar a esse tipo de consumidor.
Fonte: Valor (07/11/2022)
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