quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

TIC: Rede 5G servirá de base para testar cirurgia remota no Hospital das Clínicas (SP)



Claro, Embratel, NuT e fornecedores integram o projeto no Instituto do Câncer de São Paulo 

Engenharia e medicina caminham muito bem juntas. Melhor ainda quando em alta velocidade. Testes com frequência de 5G realizados no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), uma unidade do Hospital das Clínicas, provaram que já é possível fazer cirurgia remota com o uso dessa tecnologia. Isso significa uma renovação das aplicações do braço robótico que atua no Instituto do Câncer desde 2014, já que 5G acelerou as transmissões dos procedimentos realizados pelo equipamento. Além disso, o potencial e conhecimento do Hospital das Clínicas poderá ser multiplicado pelo país.  

Esse robô foi instalado por Ricardo Abdalla, médico assistente da cirurgia do aparelho digestivo do Icesp e professor livre docente da Faculdade de Medicina da USP, à qual o hospital é vinculado (FMUSP). Abdalla foi convidado para executar essa tarefa depois de ter implantado um equipamento semelhante para cirurgias no hospital Sírio-Libanês, em 2008.  

No fim do ano passado, o Icesp recebeu mais um robô para atuar em intervenções de pacientes, desta vez com doenças benignas. As equipes médicas serão treinadas e em dois meses o equipamento deverá entrar em operação. Cada braço robótico custa cerca de US$ 2 milhões, preço que sobe para US$ 3 milhões com a adição dos instrumentos médicos necessários, segundo o professor Abdalla.   

Só no Instituto do Câncer foram realizadas 540 cirurgias robóticas nos últimos cinco anos - número adicional às cirurgias tradicionais agendadas. Segundo o professor, o volume seria maior ainda se os hospitais não tivessem sido afetados pela pandemia e a consequente escassez de material cirúrgico. “Estamos em nova etapa, de enxurrada de novas tecnologias e exigências de que são seguras, o tempo todo”, diz o professor Abdalla.  

O sistema com 5G foi aprovado também para telemedicina, treinar médicos a distância, monitorar pacientes em UTI e melhorar o atendimento ‘home care’ (cuidado médico em domicílio), com o fornecimento de mais indicadores da saúde do paciente em tempo real para o médico.  

A licença de uso científico foi liberada pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Os testes foram feitos na frequência standalone de 3,5 gigahertz, considerada a mais ‘pura’ em 5G. “A conclusão que tiveram e referendamos é que [o sistema] atendeu plenamente o que foi planejado”, afirma Maria Teresa Lima, diretora-executiva da Embratel para governo. A empresa do grupo Claro foi a habilitadora do sistema, unindo todos os participantes na chamada prova de conceito (PoC), que serve para corroborar as expectativas dos especialistas em relação ao projeto elaborado. Agora, está em estudo a fase comercial das aplicações.  

Os testes comprovaram taxas de até 1 gigabit por segundo de transmissão de dados, superando a tecnologia por Wi-Fi da rede fixa. Além disso, a latência ficou entre 10 e 15 milissegundos e houve estabilidade da rede em todas as transmissões, diz Murilo Barbosa, vice-presidente de negócios da Ericsson, que implantou os equipamentos no Icesp.  

A latência é o tempo de resposta ao comando do usuário na internet, recurso crucial em uma cirurgia a distância, por exemplo, mas que em redes 4G fica na faixa de minutos. “Sabemos que a cirurgia remota está longe de acontecer, mas queríamos testar as possibilidades”, diz o engenheiro Marco Bego, diretor do núcleo de inovação do Hospital das Clínicas (InovaHC). “Queríamos saber a segurança de mandar dados da cirurgia para outra região, como os pacotes [de dados] chegariam, se estariam íntegros.”   

Na transmissão por Wi-Fi, como o volume de dados é muito grande, frequentemente o pacote não chegava inteiro e era preciso reenviar, diz Bego, acrescentando que o 5G demonstrou uniformidade.  

Escolhida para integrar o ecossistema do projeto por ter desenvolvido um software de assistência médica remota, a startup NuT, de Natal (RN), adicionou inovações ao produto em 5G. Seu sistema já é usado há anos em UTIs e ‘home care’, aplicação que agora ganhou inovações, com levantamento de informações do paciente que servem de munição aos médicos para o tratamento a distância.  

Na versão de ‘home care’ em 4G, os dados que eram coletados do paciente ficavam no local, e o médico via remotamente só o que era exibido no monitor do hospital. “Agora, a gente captura os dados e disponibiliza”, diz Ramon Malaquias, diretor de tecnologia da NuT. “A PoC serviu como pontapé do que é possível fazer em saúde. O impacto será significativo ao longo do tempo.”  

A Claro obteve a licença da faixa de 5G para a prova, fez o gerenciamento do sistema e cuidou de toda a operação, enquanto o beOn - hub de inovação da operadora - interagiu com a NuT em busca das inovações para a área de saúde, explica Teresa Lima.  

A Ericsson implantou o sistema, com rádios e antenas compactos dentro do centro cirúrgico. “São do tamanho da palma da mão”, diz o vice-presidente da empresa sueca, referindo-se aos equipamentos, instalados próximos de onde ocorre a intervenção no paciente. De lá, os dados saem para a rede da Embratel e Claro.  

Além das próprias cirurgias com o braço robótico, outro fator importante é a multiplicação do aprendizado. O professor treinou 16 cirurgiões robóticos, oito dos quais completaram o treinamento. Eles fizeram dez cirurgias em cinco especialidades sob sua supervisão, no ‘padrão ouro’ - critério para avaliação de evidências científicas, adotado no hospital. O médico manipula o robô por meio de imagem do paciente exibida no monitor, enquanto o equipamento executa com precisão no paciente o comando recebido.   

O conhecimento obtido será levado à Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec/SUS), mostrando que é possível treinar equipes a distância usando 5G. O professor espera orientar cirurgiões a distância, em tempo real. Para isso, centros universitários e do SUS que recebem pacientes em estado grave precisam também possuir braços robóticos, ampliando a atuação do Hospital das Clínicas.  

Perguntado sobre quantos equipamentos desse tipo seriam necessários no hospital, o professor diz que antes de disseminar é preciso explicar o que é a segurança ao doente, que não está definida cientificamente. Por isso se fala em centros de referência para uso da inovação.  

Nas universidades públicas a tecnologia ainda não faz parte da grade curricular, mas as instituições privadas já têm sala de simulação, robôs de treinamento de anatomia. Há médicos que já não conseguem operar sem o robô; outros fogem dele. Os alunos estão mais acostumados, os formandos, nem tanto, mas o professor diz que é preciso treinar, fazer investimento pessoal.  

Com o padrão standalone abre-se um leque de oportunidades para diversos setores além da saúde. “No beOn interagimos com cada área. Fizemos um aporte bem-sucedido com a NuT, que continua no nosso portfólio, afirma Rodrigo Assad, diretor do beOn Claro. “Estamos um pouco à frente das ofertas de prateleira.”  

A NuT usa um gateway (equipamento de comunicação) com um ou mais dispositivos que coletam os dados do paciente. O médico tem acesso às informações e pode ver sua evolução, análises e alertas. Além disso, o sistema de ‘machine learning’ (aprendizado de máquina) evolui com o processo.  

Mas não basta ter rede 5G com nuvem computacional e aprendizado de máquina, entre outros recursos, observa Malaquias, da NuT. É preciso evoluir a parte de aplicações com todos os parceiros, e as aplicações ainda estão sendo desenvolvidas. A prova executada no Icesp é só uma fração do que é possível fazer.   

Bego, do InovaHC, naturalmente está alerta para os avanços tecnológicos. Ele afirma que há grande interesse em 5G e que vêm sendo avaliados os casos de uso, “um deles em parceria com a Claro”.  

Em novembro do ano passado, o Valor publicou reportagem sobre testes de 5G no Hospital das Clínicas. O projeto OpenCare 5G partiu do conceito de rede aberta, com a participação de diferentes fornecedores. O pool de empresas envolveu o banco Itaú, parceiro da Telefônica, dona da Vivo, em um projeto 5G; a consultoria Deloitte, os fornecedores Siemens e NEC, além da escola de engenharia da USP, entre outras instituições.

Fonte: Valor (25/01/2023)

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