A missão do STF diante das novas normas de Retirada de Patrocínio
Em 15.12.2023, foi publicada no Diário Oficial da União (“DOU”) a Resolução CNPC n° 59/2023, a qual trouxe importantes novidades quanto ao procedimento de retirada de patrocínio.
Vale lembrar que a retirada de patrocínio é procedimento previsto no artigo 25 da Lei Complementar nº 109/2001 e seu objetivo é permitir que a patrocinadora possa suspender as contribuições ao plano, ensejando a extinção da relação contratual firmada com a Entidade Fechada de Previdência Complementar (“EFPC”). A retirada de patrocínio, embora seja de iniciativa exclusiva da patrocinadora, deve ser formalizada e submetida à aprovação da Superintendência Nacional de Previdência Complementar.
Esse instituto precisa existir, evidentemente, caso contrário as patrocinadoras ficariam eternamente presas aos respectivos planos, o que seria ilógico do ponto de vista empresarial e, ao mesmo tempo, precisa ser regulado com máxima atenção para preservar e proteger os participantes e assistidos.
Tanto é que a legislação, ao conceder tal faculdade, impõe à patrocinadora que se retira uma série de obrigações, por exemplo, a atualização cadastral dos participantes e assistidos vinculados ao plano de benefícios, a elaboração de termo de retirada de patrocínio que trate da segregação patrimonial do plano, bem como das obrigações do patrocinador em face da retirada de patrocínio e ainda exige, nessa situação, a elaboração e a apresentação de avaliação atuarial do plano para definir individualmente as reservas matemáticas e garante que aos participantes e assistidos seja concedida a escolha entre os seguintes institutos: Benefício Proporcional Diferido, Portabilidade, Resgate e Autopatrocínio, conforme artigos 115 e 121 da Resolução n° 23/2023.
A Resolução CNPC n° 59/2023 foi editada visando aprimorar ainda mais esse procedimento, especialmente porque quem atua no segmento de previdência complementar sabe das dificuldades e obstáculos que uma retirada de patrocínio enfrenta. A judicialização decorrente de um procedimento desse tipo infelizmente ainda é comum quando os participantes e assistidos se sentem de alguma forma lesados pela patrocinadora ou pela própria EFPC.
Nesse contexto, tudo indica que a intenção da Resolução CNPC n° 59/2023 claramente foi trazer novos mecanismos que protejam os direitos dos participantes e assistidos. Dentre as várias alterações, vale destacar a criação de plano e fundo específicos. Note-se que, com as novas regras previstas nos artigos 9 a 12 da referida Resolução, a reserva matemática individual do participante deve ser transferida compulsoriamente para o Plano Instituído de Preservação da Proteção Previdenciária. Posteriormente, o participante pode (i) transferir para outro plano de benefícios, (ii) receber uma renda vitalícia, (iii) resgatar a reserva em parcela única ou (iv) combinar a as opções (i) e (iii) em que o valor do recebimento não pode superar 25% da sua reserva matemática individual final, conforme artigo 13 da referida Resolução.
Já para planos que oferecem benefícios vitalícios, deve ser instituído o Fundo Previdencial de Proteção da Longevidade, formado por valores da reserva de contingência, reserva especial e fundos previdenciais do plano objeto de retirada. Os valores do fundo administrativo do plano retirado devem ser destinados ao fundo administrativo do novo plano, de acordo com o artigo 11 da Resolução. Participantes que optarem pelas opções indicadas acima não terão acesso aos recursos do Fundo Previdencial de Proteção da Longevidade conforme § 2º do artigo 13 da Resolução.
A nosso ver, as novas regras visam garantir mais proteção a participantes e assistidos, bem como o equilíbrio no estabelecimento de compromissos e obrigações de cada parte contratual na retirada de patrocínio.
Porém, quase 1 ano depois da entrada em vigor da Resolução CNPC n° 59/2023, em 15.10.2024 a Associação dos Profissionais dos Correios (“ADCAP”) ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 7735 (“ADI 7735”) ao STF contra a referida Resolução. O processo conta com a relatoria do Ministro Edson Fachin e ainda não tem data para julgamento.
A ação questiona a constitucionalidade da Resolução CNPC nº 59/2023 sob dois aspectos fundamentais. Primeiro, a Associação defende que a retirada de patrocínio deveria ser regulada apenas por lei complementar, de tal forma que as previsões da Resolução n° 59/2023 seriam inconstitucionais.
Segundo, a Associação argumenta que a referida Resolução estabeleceu dinâmica de operação em que deve ser realizada avaliação atuarial do plano para definição da reserva matemática individual do participante, ocasião em que ocorrerá a transferência compulsória dessa quantia para o Plano Instituído de Preservação da Proteção Previdenciária. De acordo com a Associação, essa transferência compulsória retiraria o caráter voluntário e facultativo intrínseco ao regime de previdência complementar previsto no referido artigo 202 da Constituição Federal.
Importante notar que a Resolução n° 59/2023 representa um importante avanço no que diz respeito a um dos temas mais sensíveis do setor e é imperativo que o STF análise com urgência e profundida a referida ADI n° 7735 de modo a não deixar dúvidas quanto à constitucionalidade da Resolução n° 59/2023. Afinal, o pior cenário é aquele em que as EFPC e as patrocinadoras, mesmo incertas quanto à validade das regras atuais, são obrigadas a tomar decisões relevantes no contexto de uma retirada de patrocínio.
Portanto, uma análise célere e precisa pelo STF impedirá que paire um dos grandes males da justiça brasileira sobre a retirada de patrocínio em planos de previdência complementar, qual seja, a insegurança jurídica.
Fonte: Ed. Roncarati e Advocacia Pinheiro Neto (05/11/2024)
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