Como as expectativas para a taxa básica de juros contemplam cada vez menos cortes, assessores de investimentos e gestores de patrimônio recomendam olhar com mais carinho para títulos atrelados à inflação, enquanto divergem sobre os prefixados.
Depois do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central manter a Selic onde estava pela quarta vez seguida nesta quarta-feira (1º), assessores de investimentos e gestores de patrimônio sugerem ser mais conservador ao tomar decisões de investimentos. Como as expectativas para a taxa básica de juros da economia contemplam cada vez menos cortes, eles recomendam olhar com mais carinho para títulos atrelados à inflação, enquanto divergem sobre os prefixados.
O Copom aumentou bastante a Selic desde abril de 2021, de 2% para os atuais 13,75% ao ano. O objetivo era combater a inflação, elevando o custo do crédito e diminuindo o consumo. Agora, apesar de a alta dos preços estar mais controlada, os economistas estão enxergando o recuo da taxa de juros cada vez mais distante, devido às críticas feitas pelo governo às metas de inflação e às incertezas em relação aos gastos públicos.
A previsão mediana para a Selic no fim deste ano subiu de 12% em dezembro para 12,50% agora, conforme um levantamento do Valor com 106 instituições financeiras divulgado na última segunda-feira. O mercado também aumentou a projeção de inflação, de 5,2% para 5,7% no mesmo intervalo.
“Os ruídos elevaram a chance de alta dos preços e as previsões do mercado estão mais dispersas”, afirma Marco Caruso, economista-chefe do banco Original. “A oscilação das taxas de juros dos títulos atrelados à inflação de longo prazo foi maior do que a da bolsa brasileira em janeiro, o que mostra como a incerteza está alta”, diz.
Nesse ambiente, os títulos atrelados à inflação são consenso entre os assessores de investimentos, economistas e gestores de patrimônio, como uma boa forma de se proteger da alta dos preços. A estimativa de inflação maior apareceu nas taxas de juros oferecidas nesses papéis, que subiram. No Tesouro Direto, dá para achá-los oferecendo IPCA mais até de 6,5% ao ano, com datas de vencimento entre 2029 e 2055.
É bom lembrar que os títulos atrelados à inflação podem dar rendimento negativo antes da data de vencimento. Assim, é necessário estar disposto a resgatar o dinheiro apenas no fim do prazo para ganhar o combinado. É por isso que esses papéis são aconselhados apenas para realizar objetivos de médio e longo prazo.
Prefixados são causa de discórdia
Já os títulos prefixados são causa de discórdia no cenário atual. A expectativa de inflação maior foi refletida nas taxas de juros oferecidas nesses papéis também. No Tesouro Direto, é possível encontrá-los oferecendo acima de 13% ao ano, com datas de vencimento entre 2026 e 2033.
Porém, boa parte dos especialistas contraindica comprar títulos prefixados agora, porque se a taxa de juros demorar mais do que o esperado para cair ou até aumentar, o comprador ficaria preso em papéis com rendimento abaixo da taxa básica de juros.
“O conselho de alguns meses atrás de que era uma boa hora para comprar prefixados porque o corte da Selic não estaria distante é discutível. Com o risco da meta de inflação ser elevada pelo governo, é momento de ficar desconfortável com os prefixados”, afirma Caruso.
Sigrid Guimarães, sócia e presidente da Alocc Gestão Patrimonial, também vai por esse caminho conservador. “Quando a Selic estava em 2%, muitos entraram em prefixados e agora estão abarrotadas com títulos com rendimento muito inferior ao que o mercado está pagando”, afirma.
Ela é fã de carteirinha dos títulos atrelados à Selic: indica guardar o equivalente a entre três e cinco anos de custo de vida e investir 80% desse valor nesses papéis, que permitem sacar o recurso com rendimento positivo a qualquer hora. Os outros 20% podem ficar em papéis indexados à inflação, recomenda. “Sugiro investir com foco na sua vida. É muito difícil adivinhar o que acontecerá com o mercado e é pouco eficiente correr atrás dele”, diz.
Já Ricardo Aragon, educador financeiro, sócio-fundador e diretor de produtos e estratégia da assessoria de investimentos Matriz Capital, pensa diferente. Ele acha que os títulos atrelados à Selic são bons apenas para a reserva de emergência, que exige liquidez diária, e que o dinheiro para realizar objetivos de médio e longo prazo deve estar em papéis atrelados à inflação e prefixados agora.
“Estar exposto apenas a títulos atrelados à Selic é correr o risco de ganhar pouco rendimento daqui alguns anos e perder a oportunidade de ficar travado em taxas extremamente atrativas”, afirma. “O investidor deve se precaver para caso o governo faça um trabalho fiscal bom e a Selic comece a cair ainda neste ano”, diz.
Ele acrescenta que, ao analisar histórico longo, os títulos prefixados que pagam 12% ao ano renderam mais que os títulos atrelados à inflação oferecendo IPCA mais 6% e que os papéis oferecendo 120% do CDI, uma taxa parecida com a Selic.
No entanto, Aragon aconselha escolher títulos prefixados com data de vencimento mais curta, pensando que, se acontecer um descontrole inflacionário, o investidor não fica travado nos papéis por tanto tempo.
Fora do Tesouro Direto, títulos bancários como Certificado de Depósito Bancário (CDBs) e Letras de Crédito Imobiliário e do Agronegócio (LCIs e LCAs) podem render mais. O risco de calote desses papéis é maior, mas até o limite de R$ 250 mil por CPF por instituição financeira, o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) devolve o dinheiro em caso de calote.
Já títulos emitidos por companhias, como as debêntures, podem dar retorno maior ainda, mas não são cobertos pelo FGC. “Os títulos emitidos por empresas ainda estão interessantes, mas indico escolher os com avaliação “AAA” pelas agências de classificação de risco e dos setores de energia, saneamento, siderurgia e petróleo, por exemplo, mais resilientes”, recomenda Aragon.
Renda variável é só para os fortes
Em meio a esse cenário difícil de ler, os economistas aconselham evitar começar a comprar ações agora ou a diminuir a fatia da carteira com bolsa. “Acho importante o investidor respeitar o risco que tolera. Muitos entraram na onda e não tinham perfil para ações quando a Selic estava baixa”, afirma Apolo Duarte, planejador financeiro certificado, sócio e chefe da mesa de renda variável da assessoria de investimentos AVG Capital.
Ele indica que até os investidores arrojados diminuam a parcela de ações para 10% e diversifiquem e selecionem bem os papéis. Duarte recomenda buscar ações de setores menos sensíveis aos juros altos, como geradoras e transmissoras de energia e produtoras de commodities, que podem se beneficiar com a reabertura da economia da China. Em contrapartida, o planejador financeiro sugere evitar papéis de varejistas, mais endividadas.
“Não dá para botar os ovos todos na mesma cesta em um ambiente tão volátil, mas existem oportunidades, a ponto de os estrangeiros estarem colocando bastante dinheiro na bolsa brasileira”, afirma. “Investidores com uma carteira diversificada e seletivos terão boas chances de bater o Ibovespa. Foi o que aconteceu no ano passado e este ano não deve ser diferente”, diz.
Atualmente, os fundos multimercados são investimentos de renda variável melhores, porque conseguem explorar as oscilações de diferentes mercados. “Eles cumprem bem o objetivo de superar a renda fixa no longo prazo até para os investidores conservadores”, afirma Duarte.
Gabriela Mosmann, gestora de planejamento patrimonial da Suno Wealth, acrescenta que uma boa forma de buscar segurança neste momento é investindo no exterior uma fatia da carteira. “Quando a economia do mundo está em dificuldade como agora, o dólar, a moeda mais forte, se valoriza. É por isso que eu aconselho ter no mínimo 10% da carteira investida no exterior até para os investidores conservadores”, indica.
Para quem tem menos dinheiro, ela recomenda comprar BDRs, recibos de ações de companhias estrangeiras negociados na bolsa brasileira. Já para quem tem mais dinheiro, Mosmann sugere contratar um serviço de carteira administrada no exterior.
Fonte: Valor Investe (01/02/2023)
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