Ministério das Comunicações e Correios negam restrições no uso da tecnologia e dizem que localização de equipes do governo que atuam em ação humanitária na região “é dinâmica”
O ministro das Comunicações, Juscelino Filho, enviou mil chips de celular para serem utilizados nas operações humanitárias que acontecem na terra indígena Yanomami, em Roraima, mas que não funcionam dentro da área demarcada. A limitação tecnológica deve-se a um fato simples: não há cobertura da operadora celular na terra indígena, localizada a 230 quilômetros de distância da capital Boa Vista.
A informação foi confirmada à reportagem pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). “A região fica em local isolado sem atendimento das prestadoras móveis, que têm obrigações de atendimento nas sedes municipais, localidades e aglomerados urbanos”, declarou o órgão de fiscalização, por meio de nota. Na prática, o que o ministro deu foi um cartão que, sem aparelho celular ou rede de cobertura, não funciona.
No dia 9, Juscelino pegou um helicóptero e, ao lado do governador de Roraima, Antonio Denarium, saiu de Boa Vista e sobrevoou a terra indígena. Foram três horas de voo e de tentativas de descer no local, mas o mau tempo impediu a aproximação. Nas suas redes sociais, divulgou os atos e afirmou que cumpria uma convocação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que convocou os ministros a ajudar na crise dos Yanomami.
Na sexta-feira, 10, o ministro fez o anúncio sobre o envio dos chips ao lado do presidente dos Correios, Fabiano Silva, com o objetivo de “facilitar a comunicação entre as equipes que prestam assistência nas terras indígenas Yanomami, localizadas entre os Estados de Roraima e Amazonas”.
Em comunicado conjunto, declararam que os dispositivos “dão acesso à internet, fornecendo conexão aos grupos que precisam se comunicar em meio aos trabalhos de assistência aos indígenas”.
Na prática, o uso dos chips se mostra limitado, porque, dentro da terra indígena Yanomami, a única forma de conexão viável se dá por meio de conexão via satélite. Não por acaso, o próprio Ministério das Comunicações formalizou, em parceria com a Eletrobras, a instalação de 17 antenas móveis dentro do território dos indígenas, que permitirão o acesso à internet sem fio por meio de satélite usando qualquer tipo de aparelho, como celulares e computadores. Isso significa, portanto, que os usuários farão uso de aparelhos celulares que já possuem para se conectarem à rede aberta, ou seja, sem ter a necessidade de utilizar um novo chip ou mesmo de ter um dispositivo.
Essenciais. No anúncio da parceria com o ministério, o presidente dos Correios, Fabiano Silva, disse que seus chips seriam “essenciais” para as ações dos grupos. “Nesses momentos de crise, todo apoio possível será feito. Com os chips Correios Celular, garantiremos agilidade na comunicação, o que facilitará a coordenação dos trabalhos de assistência”, disse.
No evento, o ministro reforçou a ideia. “Estamos empenhando todos os esforços para auxiliar no atendimento a essa crise que assolou os Yanomami e chocou o mundo”, disse Filho. “Já enviamos 17 antenas com conexão banda larga via satélite, livre e gratuita, e agora estamos enviando, junto com os Correios, chips para reforçar a comunicação.”
Desde 2017, os Correios atuam como um tipo de “operadora virtual” de telefonia. Na região de Boa Vista, a estatal faz a locação da estrutura que é fornecida pela empresa Surf Telecom, que, por sua vez, aluga a rede de telefonia móvel da operadora TIM. Isso significa que qualquer celular com chip do Correios Celular só vai funcionar se estiver na área em que a TIM tiver cobertura, o que não inclui a terra Yanomami.
Em Boa Vista, é comum a situação de queda dos serviços de telecomunicações, que ficam sobrecarregados e, muitas vezes, passam horas fora do ar, seja para telefonia ou para internet. Essa situação ocorreu, por exemplo, no dia 1º de fevereiro, quando os serviços ficaram completamente paralisados por cerca de três horas.
Ministério diz que chip é ‘para facilitar’
Por meio de nota conjunta, o Ministério das Comunicações e os Correios declararam que “os chips foram enviados para facilitar a comunicação entre as equipes humanitárias e de apoio que estão prestando assistência à população”. O órgão negou que os itens sejam desnecessários. “Naturalmente, a localização dessas equipes é dinâmica, entretanto, suas bases possuem a cobertura do serviço. Portanto, a informação de que os chips não funcionam não é verdadeira”, afirmou.
Questionados a respeito do custo dos itens, a pasta e os Correios declararam que, “nesta ação específica que tem o objetivo de auxiliar na comunicação das equipes que trabalham na ação humanitária coordenada pelo governo federal, os chips não tiveram custo para os Correios” e cada componente recebeu R$ 40,00 de crédito “para serem utilizados pelas equipes que estão prestando apoio na região”. Se os valores forem utilizados, há previsão de que novos créditos sejam lançados, segundo os órgãos do governo federal.
A respeito da escolha especifica de chips da operadora TIM, o ministério e a estatal afirmaram que o Correios Celular é um serviço prestado no modelo de operadora móvel com rede virtual. “Operamos em parceria com a Surf Telecom, que por sua vez utiliza a rede da TIM nas áreas em que ela não possui rede de cobertura própria.”
A reportagem questionou a operadora TIM sobre a sua estrutura local, alugada para a Surf Telecom e sublocada para os Correios, e a capacidade de suportar, em Boa Vista, a eventual demanda de tráfego de dados de 1 mil novos chips oferecidos pela estatal. Por meio de nota, a TIM limitou-se a declarar que “fornece infraestrutura de rede para várias MVNOs nas áreas onde tem cobertura de rede” e que “ainda que não possui relação comercial com Correios Celular”.
A Anatel declarou que o fornecimento dos chips “pretende facilitar a comunicação entre as equipes humanitárias e de apoio que prestam assistência nas terras indígenas Yanomami”, localizadas entre Roraima e Amazonas. “Os dispositivos dão acesso à internet, fornecendo conexão aos grupos que precisam se comunicar em meio aos trabalhos de assistência aos indígenas”.
A estrada do ministro
Conforme o Estadão revelou, o ministro das Comunicações Juscelino Filho usou R$ 5 milhões do orçamento secreto para asfaltar a estrada que passa em frente a oito fazendas dele e da família, no interior do Maranhão. Além disso, amigos do ministro se beneficiaram do esquema, ao vencerem licitações de R$ 36 milhões em Vitorino Freire (MA), cidade governada pela irmã de Juscelino, Luanna Rezende. O ministro também forneceu informações falsas para a Justiça Eleitoral, ao usar R$ 385 mil do fundão eleitoral na contratação de voos de helicóptero durante a campanha de 2022.
Fonte: Estadão (15/02/2023)
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