terça-feira, 25 de abril de 2023

Planos de Saúde: Crise une laboratório, hospital e operadora de plano e seguro saúde

  


Com parcerias, grupos reduzem custos e dividem riscos

Diante da crise no setor, operadoras de planos de saúde, hospitais e laboratórios, que sempre estiveram em lados opostos, agora estão se unindo para garantir receita e compartilhar riscos. A estratégia vem sendo adotada em diferentes formatos e por vários grupos. Rede D’Or e SulAmérica fecharam uma fusão; Oncoclínicas e Unimed Nacional se juntaram para construir um hospital de câncer em São Paulo; Fleury e Sabin criaram um fundo para investir em “healthtechs”; e o Hcor negocia com convênios médicos para colocar de pé seu novo hospital de cardiologia. “No atual cenário, só imagino uma expansão com parcerias”, disse Fernando Torelly, presidente do Hcor.  O executivo explica que só vai levar adiante o projeto do novo hospital, cujo terreno já está adquirido, se tiver a garantia que essa unidade, orçada em R$ 400 milhões, estará credenciada pelos planos de saúde quando abrir as portas. Torelly defende que as parcerias são o caminho para o futuro no setor.  

Os acordos entre concorrentes eram inimagináveis até então. Isso porque o modus operandi tradicional na área da saúde se baseia numa dinâmica em que quanto menor o volume de procedimentos realizados em hospitais, laboratórios ou clínicas médicas, mais as operadoras ganham, porque é menor seu desembolso para pagar os estabelecimentos de saúde. E vice-versa. Essa lógica provoca uma relação complexa na cadeia, com cada lado podendo exagerar, seja fazendo procedimentos desnecessários ou negando atendimentos para melhorar seus ganhos.   

Segundo Leandro Bastos, analista do Citi, há pelo menos dez anos se fala em novos modelos de remuneração com compartilhamento de risco, mas o formato em que um ganha e outro perde ainda continua predominante. “Talvez, agora, com a crise, essas parcerias de compartilhamento de riscos representem uma mudança efetiva no setor”, disse.  

A Oncoclínicas e a Unimed Nacional se juntaram para construir um “cancer center”, em São Paulo, previsto para ficar pronto em 2025. O projeto total é orçado em R$ 300 milhões. A cooperativa médica entrará com R$ 75 milhões a serem pagos em forma de geração de receita, ou seja, a Unimed Nacional se compromete a encaminhar pacientes para essa unidade. O prazo para alcançar essa receita ainda não foi estabelecido. A rede oncológica e a cooperativa compartilham os ganhos na mesma proporção do investimento.  

Em outras praças como Brasília e Salvador, a Unimed Nacional acordou direcionar 90% dos atendimentos ambulatoriais de pacientes com câncer para as unidades da Oncoclínicas. “Não é uma verticalização, porque as unidades continuam atendendo outras operadoras. Esse tipo de parceria nos permite centralizar e acompanhar todo o tratamento, o que proporciona melhores resultados médicos”, disse Luiz Paulo Tostes Coimbra, presidente da Unimed Nacional.  

A preocupação dos prestadores de serviço de saúde em negociar o credenciamento com os planos de forma tão antecipada se deve a dois fatores principais. De um lado, a taxa de juros elevada dificulta a contratação de financiamentos para bancar novos empreendimentos e, de outro, as altas taxas de sinistralidade - indicador que mede o percentual da receita dos convênios médicos que é revertido para pagar os procedimentos feitos por seus usuários - faz as operadoras evitarem credenciar novos estabelecimentos de saúde. Os últimos dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) mostram que a utilização do plano de saúde é crescente desde a deflagração da pandemia. Em setembro, a taxa de sinistralidade atingiu o patamar recorde de 93%, alta de 8,6 pontos percentuais quando comparado a 2019.   

A rede mineira Mater Dei, que no ano passado inaugurou um hospital em Salvador com investimento de R$ 500 milhões, fez um trabalho intenso com operadoras para conseguir o atual patamar de 400 mil usuários de convênio médico autorizados a usar sua estrutura.  

As operadoras também saem beneficiadas por esses acordos, uma vez que negociam uma tabela de preços diferenciada e podem criar planos de saúde com uma rede mais restrita. Essa é uma tendência no setor, que começou com um contra-ataque às operadoras verticalizadas e agora é adotada para reduzir custos. Startups como Alice, Qsaúde e Sami atuam com esse modelo.  

O Fleury, que acaba de se juntar ao Hermes Pardini e ganhou maior robustez, é uma das companhias que negociam acordos para se credenciar a esses convênios médicos com rede menor.  

O Fleury acaba de assumir a área de exames laboratoriais do Hcor, cujos exames dos pacientes eram processados internamente por uma equipe própria do hospital. O acordo pode se estender para a nova unidade de cardiologia. “Com a contratação do Fleury, vamos liberar a área do laboratório, que fica no prédio principal, para colocar novos leitos e atender o aumento de demanda. Esse endereço é o que está credenciado pelas operadoras. Mesmo que eu faça um puxadinho do lado, tenho que pedir novo credenciamento e isso leva tempo”, disse o presidente do Hcor.  

“Há uma pressão da inflação e margens apertadas no setor todo, temos que buscar soluções. Temos joint venture com o Einstein e uma outra com a BP - Beneficência Portuguesa e a Atlântica [Bradesco Saúde]”, disse Jeane Tsutsui, presidente do Fleury. A rede de medicina diagnóstica e o Einstein são sócios numa empresa de testes genéticos. A outra parceria é na área de oncologia e reúne Fleury, BP e Atlântica. As três empresas têm fatias semelhantes e juntas vão colocar R$ 678 milhões num negócio de clínicas e hospitais para tratamento de câncer - compartilhando os aportes e os riscos.   

A operação mais emblemática no setor é a fusão entre Rede D’Or e SulAmérica. A seguradora já tem há alguns anos planos de saúde em que a rede credenciada é basicamente formada pelos estabelecimentos da D’Or. Com a união dos negócios, os novos hospitais do grupo já tem a SulAmérica como seguradora credenciada, o que representa receita garantida. Atualmente, a Bradesco Saúde e a SulAmérica são as duas maiores fontes pagadoras da D’Or.  

Outras parcerias unindo concorrentes são dos laboratórios Fleury e Sabin, que criaram um fundo de venture capital de R$ 200 milhões para investir em startups. O Einstein e Hcor uniram suas equipes médicas para pesquisas científicas na área de oncologia.  

A Bradesco Seguros - dona da seguradora de saúde e principal acionista de Fleury e Odontoprev - também aposta nesse modelo. A empresa vai investir R$ 600 milhões na construção de um novo hospital em São Paulo e chamou o Albert Einstein para tocar a gestão médica do negócio. Já houve, há cerca de dez anos, uma iniciativa semelhante. O Sírio-Libanês assumiu a gestão médica do hospital de oncologia do Santa Paula, que pertence à Dasa. Mas, desde então, esse tipo de acordo não foi replicado de forma expressiva.  

A companhia controlada pela família Bueno foi o primeiro grande grupo a questionar de forma mais incisiva o modelo vigente no setor de saúde. A Dasa, que só tinha negócio de medicina diagnóstica, entrou na área hospitalar em 2019 para controlar melhor os custos da cadeia.  

A Dasa fechou um contrato de dez anos para processar exames da Unimed-Rio. O acordo prevê que a companhia receberá um pagamento anual de R$ 308 milhões ou 70% dos gastos que a cooperativa médica carioca tem com exames dos seus usuários (vale o maior valor). Nessa operação, também foi feito um acordo do passivo que a Unimed-Rio tem com a Dasa.

Fonte: Valor (24/04/2023)

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