sábado, 25 de janeiro de 2025

Idosos: Já pensou em trocar o tempo dedicado a idosos na juventude por créditos na sua velhice? Isso já existe

 


Criado nos anos 1970 no Japão, projeto do banco de tempo se expandiu em iniciativas locais por diferentes países e agora, com o envelhecimento da população, tenta ganhar escala em gigantes como a China

E se todo serviço que você fizer na juventude para ajudar os outros voltar para você como créditos na velhice? Principalmente os trabalhos voluntários realizados com idosos?

O que parecia um projeto utópico demais para ganhar escala tem começado a receber mais atenção até de governos com o envelhecimento da população.

Chamada de banco de tempo, a ideia foi apresentada ainda em 1973 no Japão por Shoko Mizushima. Seu plano era montar um banco cujas moedas seriam obtidas por meio do serviço prestado pelo titular da conta a outras pessoas, sobretudo idosos. O conceito se espalhou e, em 1980, o americano Edgar Cahn cunhou o termo “Time Dollars”. Quinze anos depois, em 1995, o chamado TimeBank USA seguia o mesmo princípio: trocar uma hora de serviço a alguém por um crédito de serviço a ser obtido anos mais tarde em benefício próprio ou de um terceiro.

Com o tempo, o projeto se expandiu. Artigo publicado em 2024 no Journal of Sociology and Ethnology pelo estudioso chinês Yingzi Hu mostra que até 2011 mais de mil bancos de tempo - focados principalmente em apoio mútuo a idosos, serviços médicos, assistência social e integração comunitária - haviam sido estabelecidos em mais de 30 países. A maioria nos Estados Unidos e no Reino Unido.

Por essa época a ideia já havia chegado também à China, o gigante asiático que tem visto sua população envelhecer rapidamente nos últimos anos. No fim de 2023, o número de pessoas com 60 anos ou mais no país atingiu 297 milhões, ou 21,1% da população total.

Yingzi Hu conta no artigo que o primeiro banco chinês foi estabelecido em 1998 num distrito de Xangai e fornecia principalmente serviços de ajuda mútua a idosos. Mas durou apenas cinco anos porque a conta não fechava: havia uma grande demanda e um pequeno número de prestadores de serviço.

As coisas começaram a mudar com os Jogos Olímpicos de Pequim, em 2008, quando a população do país percebeu a importância do serviço voluntário. “Uma onda de projetos pilotos de “banco de tempo”, “banco de amor”, “banco moral” e “banco de previdência pública” surgiu então em várias regiões”, lembra Hu. “Não só o número e a escala foram gradualmente ampliados como a estrutura organizacional e as normas de gestão foram aprimoradas.”

Entre 2008 e 2016, ao menos 31 “bancos de tempo” foram estabelecidos na China de acordo com o autor. Com estratégias como dar aos voluntários prêmios de bronze, prata e ouro. Quando precisassem de ajuda, eles poderiam sacar horas de seu próprio banco e receber serviços voluntários de outros voluntários em casa ou num hospital, por exemplo, mediante solicitação.

Mas, apesar do registro do serviço voluntário em nível nacional, ainda havia dificuldades para a partilha de recursos e a troca de informações entre bancos de tempo de diferentes regiões.

Nos últimos anos, porém, com o envelhecimento populacional mostrando os dentes, a coisa começou a deslanchar. Em 2017, órgãos estatais chineses passaram a criar regras para registro e armazenamento das horas do serviço voluntário e, em 2019, o Ministério da Assuntos Civis incluiu o “banco de horas” num piloto de reforma do serviço previdenciário. O projeto também entrou em planos de desenvolvimento de cidades chinesas com o objetivo de “expandir equipe de voluntários, construir mais plataformas de serviço voluntário e melhorar o sistema”. Com isso, mais de 200 instituições, segundo Hu, aderiram à ideia, incluindo organizações sociais e empresas, e se avançou na criação de uma blockchain que permite depositar e sacar créditos. Pessoas com dificuldades, que vivem sozinhas e não conseguem cuidar bem de si mesmas são o grupo prioritário. No primeiro semestre de 2024, a província de Jiangsu, no leste da China, incluiu 236.000 idosos com necessidades especiais em seu mecanismo regular de visitação e cuidados.

Ainda há problemas. “Embora muitos governos locais tenham emitido planos de implementação para banco de horas, eles carecem de um forte apoio do governo central, além de proteção governamental e legal. Não existem lei e regulamentação específicas para o desenvolvimento do tempo bancário, o que, em certa medida, reduz a confiança dos voluntários no banco de tempo e reduz ainda mais sua participação”, esclarece Hu.

O artigo conta que, no fim de 2022, criminosos também utilizaram documentos falsos do Ministério dos Assuntos Civis para recrutar voluntários para bancos de tempo num APP, cobrarem taxas para ativação de contas e trocarem recursos em nome de serviços de pensão. A fraude fez o Ministério da Indústria e Tecnologia da Informação chinês restringir o uso da palavra “banco” a instituições financeiras e acabou dando uma esfriada no projeto em várias regiões da China.

Enquanto discutem a mudança do nome para “casa do tesouro” ou “economia de tempo”, organizadores chineses tentam agora aumentar a participação de voluntários jovens e profissionais, ampliar recursos operacionais e incrementar a interligação entre plataformas de diferentes regiões do país. Com a sociedade cada vez mais envelhecida, as estatísticas demográficas não permitem retroceder. E não se espantem se essa discussão crescer por aqui também em breve. Com o crescimento da parcela da população brasileira idosa, aumenta também a pressão sobre gastos de saúde e previdência social.

Fonte: Estadão (22/01/2025)

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