quarta-feira, 29 de janeiro de 2025

Previdência Privada: Uma visão sobre a judicialização do Direito Previdenciário em 2024



O aumento da judicialização impacta a previdência privada, exigindo maior foco em soluções consensuais e gestão eficiente dos planos.

Em retrospecto ao ano de 2024, voltamos o nosso olhar para verificar as razões para o aumento da judicialização e seus reflexos para determinadas áreas do Direito. Há segmentos que trazem maior impacto no dia a dia do brasileiro, notadamente o direito previdenciário, mais especificamente a previdência privada.

O Relatório Justiça em Números (Relatório) do CNJ1 indica o aumento de 9,4% de ajuizamento de demandas, organizado em grandes temas de direito, nas seguintes áreas: (i) previdenciário; (ii) tributário; (iii) trabalhista; e (iv) saúde.

O Relatório também indica que triplicou a quantidade de CEJUSC - Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania desde a implementação dos NUPEMEC - Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos, que buscam o encerramento das ações em sua fase inicial ou mesmo preparatória.

Contudo, sobre este aspecto, o Relatório conclui que "a conciliação, política permanente do CNJ desde 2006, não apresenta evolução. Em 2022, foram 12,3% de processos solucionados por conciliação, valor similar ao medido nos anos anteriores. Registra-se crescimento, contudo, na conciliação em fase de execução, que passou ao longo dos 7 últimos anos de 3,5% para 9,1%. Por segmento de justiça, os melhores índices de conciliação estão na fase de conhecimento da Justiça Trabalhista (37%), na execução dos JEF - Juizados Especiais Federais (44%), e na fase de conhecimento dos juizados especiais na Justiça Estadual (16%)".

Igualmente relevante, o Relatório detalha o aumento de produtividade de 7% do Poder Judiciário, o que demonstra a melhoria dos procedimentos judiciais de maneira geral. Isto decorre da digitalização do processo judicial, como bem exposto: "Os dados mostram que o conjunto de iniciativas voltadas ao atendimento em formato virtual e à melhoria dos sistemas processuais, tais como o juízo 100% digital, os Núcleos de Justiça 4.0 e o balcão virtual foram ampliadas. A proporção de casos novos eletrônicos atingiu quase 100% e a tramitação eletrônica já é uma realidade em 85,8% das ações em andamento, sendo que apenas quatro tribunais do país possuem 20% ou mais de autos físicos pendentes de solução definitiva".

Em que pese o fomento de métodos consensuais de resolução de disputas, o Relatório aponta o prolongamento do sentenciamento das ações judiciais para 2 anos e 3 meses. Em igual sentido, o processo comum teve aumento de duração média de três anos e um mês. O tempo médio de duração das ações de forma geral foi indicado como quatro anos e três meses.

Assim, é constatado tanto o aumento no número geral de ações judiciais, quanto na duração média do processo judicial, indicando um cenário de incremento de despesas administrativas e contingenciamento de valores para tratamento dessas demandas.

Especificamente sobre as ações de direito previdenciário, o Relatório destaca que "(...) na Justiça Federal, o elevado quantitativo de processos de direito previdenciário, entre os quais o auxílio por incapacidade temporária é o subtema mais recorrente, seguido pela aposentadoria por incapacidade permanente, por idade ou por tempo de contribuição, que aparecem na listagem dos cinco maiores assuntos do segmento".

Considerando a semelhança das situações de fato que ensejam o ajuizamento de demandas no regime oficial (acima indicadas) e do regime de previdência complementar, pode-se estimar o incremento na judicialização destas relações, em que pese o Relatório não apresentar o detalhamento de ajuizamento de ações relacionadas à previdência privada.

Igualmente relevante, o aumento de oferta de planos de benefícios e o incremento de adesões de participantes também levam a crer no potencial de judicialização do contrato previdenciário.

Esse aumento pode ser compreendido pelo cenário legislativo que promoveu fomento no setor, com especial destaque à emenda constitucional 103, de 12 de novembro de 2019 (EC 103/19), que determinou a obrigatoriedade de instituição de regime de previdência complementar para os entes estaduais e municipais, bem como à resolução do CNPC - Conselho Nacional de Previdência Complementar 60, 7 de fevereiro de 2024, que autoriza a inscrição (adesão) automática de participantes.

A ordem de grandeza de pagamento de benefícios pelas entidades fechadas de previdência complementar (EFPC) denota a relevância do sistema para sociedade, seja no viés previdenciário ou na qualidade de investidor institucional.

É válido lembrar que o Relatório 2023 da Previdência Complementar Fechada, publicado pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC)2, aponta como volume de ativo do sistema o total de 1,28 trilhão, correspondente à 12% do PIB do Brasil. Os indicadores apresentam o volume de R$ 100 bilhões referentes a pagamentos de benefícios em prol de participantes, assistidos e pensionistas.

Pela leitura do Relatório do CNJ, entendemos que existem potenciais reflexos para previdência privada, em que pese a ausência de individualização desse segmento como tema de análise.

Em um primeiro momento, o aumento da judicialização e prolongamento das demandas parece ir contra o movimento de aprimoramento dos procedimentos cartorários e ampliação dos métodos de resolução consensuais de conflitos. A digitalização dos procedimentos do Poder Judiciário gerou a expectativa de incremento na celeridade e efetividade nos procedimentos cartorários com consequente redução da duração e diminuição dos processos judiciais, o que não ocorreu de fato.

De um lado, temos a continuidade de uma cultura altamente judicante por parte da sociedade, de outro, temos o fomento ao incentivo de soluções por meios consensuais de resolução de conflitos e aumento da produtividade do Poder Judiciário.

Há um evidente espaço para aprimoramento da cultura de soluções consensuais de conflitos perante os patrocinadores de planos de previdência privada e fundos de pensão, tendo em vista a modesta melhora no Poder Judiciário apresentada pelos dados do Relatório. Em paralelo, não se pode descuidar do tratamento adequado das demandas judiciais por parte do setor jurídicos dos patrocinadores e EFPC, agora integralmente apresentadas em juízo digital, o que demanda uma atuação cautelosa para o tratamento de fluxo de informação, principalmente diante da celeridade imposta pelos procedimentos cartorários aprimorados por avanços tecnológicos.

Recomenda-se fomentar a cultura de soluções consensuais de conflitos antes mesmo do ajuizamento de demandas judiciais. O aprimoramento da comunicação com participantes, assistidos e beneficiário é essencial. A necessidade de aperfeiçoamento técnico dos responsáveis pelo contencioso judicial das EFPC e seus patrocinadores é também relevante, esses profissionais devem se manter atualizados com os avanços da tecnologia para implementação de soluções eficientes, acompanhados da utilização de ferramentas modernas de trabalho adequadas à melhor prestação de serviço.

O objetivo final é a preservação do patrimônio coletivo dos participantes e assistidos dos planos de benefícios complementares, que, ao fim e ao cabo, pode ser impactado por eventuais perdas em razão do aumento da judicialização desta relação contratual.

Sem pretensão de empreender uma análise final dos dados apresentados pelo Relatório do CNJ e mesmo diante da ausência de tratamento específico da previdência privada, é certo que os números representam indicadores para reflexão dos gestores das EFPC e seus patrocinadores.

Fonte: Migalhas e Pedro Diniz Oliveira (28/01/2025)

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