Minuta revela que agência avalia permitir socorro extraordinário a empresas em dificuldades; medida divide setor
A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) cogita permitir que empresas de planos de saúde peçam reajustes extraordinários caso registrem desequilíbrios financeiros em seus balanços por fatores adversos. A medida inclui as empresas que operam com planos individuais e familiares, imunes a esse tipo de repactuação por força de uma decisão do Supremo Tribunal Federal.
Uma vez por ano, a agência autoriza o reajuste com base nas altas de custos provocadas pela inflação. Neste ano, o aumento foi de 6,91%.
A área técnica da ANS já alertou a diretoria que o Supremo barrou a chamada "revisão técnica" para planos mais antigos, anteriores à Lei Geral dos Planos de Saúde de 1998. No entanto, eles devem ser incluídos.
A intenção da agência consta em uma minuta, ainda mantida em sigilo e obtida pelo Painel S.A. Ela deve ser votada, segundo técnicos, em reunião da diretoria nesta segunda (16).
Quórum
Ainda segundo relatos, a minuta será votada porque, com a saída do atual presidente da ANS, Paulo Rebello Filho, a diretoria deixará de ter maioria. Hoje, com ele no posto, é possível ter maioria (3 votos contra 2, por exemplo). Uma medida dessa envergadura ficaria fragilizada com um placar de 2 a 1.
Empresas saudáveis de planos reclamam da medida, que beneficia companhias que, com a aprovação, ingressarão com o pedido de reequilíbrio.
Para elas, os reequilíbrios devem gerar um aumento médio de 20% nos planos, algo que terá dois efeitos colaterais: judicialização do aumento e cancelamento de planos.
Essas companhias consideram que o custo disso é ainda pior para um mercado que tem dificuldade de expansão diante dos benefícios dos planos coletivos —que são reajustados por negociação entre as partes.
Afirmam ainda haver questões legais a serem superadas porque, embora a ANS tenha poderes para fazer a revisão financeira, a Lei Geral dos Planos impede que esse reequilíbrio seja feito pela agência.
Impacto para o consumidor
Na prática, a ANS poderá abrir a possibilidade de conceder reajustes aos planos individuais ou familiares anteriores à nova lei do setor por meio desses acertos de reequilíbrio financeiro. Hoje, esses reajustes só ocorrem pela forma prevista nos contratos.
Em 2017, o STF considerou serem inconstitucionais os reajustes impostos a contratos individuais ou familiares anteriores à Lei Geral dos Planos de Saúde de 1998.
Se, no entanto, a resolução normativa pretendida pela ANS for aprovada, tais contratos podem vir a sofrer reajustes porque não tratam de custos, mas da saúde financeira da operadora.
O chamado reequilíbrio-financeiro já é algo comum em contratos de concessão de serviços como rodovias, ferrovias, empresas de energia e de telecomunicações.
Três anos
Para pleitear a revisão, as empresas terão de demonstrar desequilíbrios contratuais há pelo menos três anos.
Entretanto, haverá contrapartidas: fazer a venda e a portabilidade de planos individuais ou familiares de forma online; e manter a venda desses planos por, pelo menos, mais três anos.
A ANS afirma que existe previsão legal para a revisão técnica e informa que ela nunca foi regulamentada —algo que está em curso neste momento.
As empresas discordam e dizem que até mesmo a Lei Geral dos Planos de Saúde não prevê o reequilíbrio.
Segundo o Ministério da Saúde, a decisão para que tal revisão ocorra é tomada em conjunto entre operadora e ANS e se destina a eliminar ou corrigir desequilíbrios que, eventualmente, comprometam a prestação dos serviços aos beneficiários.
Prerrogativa legal
Por meio de sua assessoria, a ANS informa que a revisão técnica de um plano de saúde é um ajuste excepcional, que pode ser aplicado em situação de desequilíbrio econômico e ameaça à continuidade dos serviços.
"É uma medida que, quando for o caso, será autorizada", diz a agência em nota.
A ANS diz que a decisão do STF envolveu somente planos individuais contratados até dezembro de 1998, antes da lei que regulamenta a existência da própria agência.
Por isso, a norma que tratava do assunto foi suspensa pela diretoria da ANS em 2003 e está revogada, em razão da decisão liminar concedida pelo Supremo.
"Não cabia à ANS a regulamentação dos contratos anteriores por extrapolar o ato jurídico perfeito", disse.
"Desde então, a ANS vem respeitando a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal que foi julgada em definitivo em 2018."
No entanto, a lei que criou a ANS concedeu a ela poderes para "definir o conceito de revisão técnica, aprovar normas de referência para revisões técnicas, auditoria, perícia médica e auditoria contábil relativas às operações de empresas prestadoras de serviços de saúde".
"Ou seja, a ANS tem total respaldo legal para conduzir discussões e normatizar revisões técnicas e definir normas relacionadas aos planos de saúde, conforme regulamentado por lei."
Por isso, diz a agência, a diretoria aprovou a realização de um projeto de reformulação da política de preços e reajustes dos planos de saúde privados.
Esse assunto foi levado à consulta pública e tomada de subsídios. Um dos temas, diz a agência, foi a revisão técnica de preços de planos individuais/familiares.
A ANS diz que deverá tornar públicos os documentos dessas contribuições, que serão analisadas pela diretoria.
Fonte: Folha de SP (12/12/2024)
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