Veja como o déficit da Previdência deve ficar cada vez pior até 2100
O governo piorou as suas projeções de longo prazo para o déficit do Regime Geral da Previdência Social (RGPS), que atende os trabalhadores do setor privado ou mesmo do setor público, quando não estejam filiados a regimes próprios. A expectativa é que a necessidade de financiamento continue crescendo: saia de 2,45% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano e chegue a 10,30% até 2100.
O percentual equivaleria a um rombo de R$ 25,528 trilhões, valor que, em tese, o governo teria que desembolsar para garantir o pagamento de aposentadorias e pensões do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), se nada for feito até lá para impedir a trajetória explosiva do resultado da Previdência. Já para este ano, o déficit projetado seria de R$ 326,168 bilhões.
Os dados constam do Balanço Geral da União (BGU) de 2023, divulgado na semana passada pelo Tesouro Nacional. O déficit existe porque as despesas previdenciárias superam as receitas. Com isso, o governo precisa se endividar para honrar o pagamento dos benefícios - o que é chamado de necessidade de financiamento.
No ano passado, a projeção era de um déficit de 2,2% do PIB para este ano, ficando estável até 2029 e passando a crescer gradualmente a partir de 2030 até chegar a 10,2% do PIB em 2100. Já as projeções atualizadas mostram que a necessidade de financiamento deve partir de 2,45% do PIB, diminuir um pouco ao longo dos próximos dez anos e crescer até atingir o percentual de 10,3%.
“A piora nas projeções do déficit previdenciário do BGU consideram que o PIB crescerá acima de 2% até 2030, em média, premissa otimista diante do baixo PIB potencial do país (de 1,5%)”, avalia Gabriel Leal de Barros, sócio e economista-chefe da Ryo Asset.
A grade de parâmetros macroeconômicos utilizada é de 12 de janeiro e foi feita pela Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Fazenda. No documento, o governo pondera que “eventuais revisões nas projeções dos parâmetros ou a observação de resultados, no curto prazo, diferentes dos projetados, implicam, necessariamente, revisão das projeções de longo prazo”.
Os dados do BGU mostram, ainda, que o problema para o financiamento da Previdência está tanto pelo lado das receitas quanto das despesas. As projeções trazem uma receita se mantendo estável em 5% do PIB ao longo das próximas décadas, com uma pequena queda na casa decimal. Já as despesas partem de 7,98% do PIB e alcançariam 15,85% até 2100.
Arnaldo Lima, relações institucionais da Polo Capital, explica que a despesa previdenciária cresce acima da arrecadação porque estão sendo incluídas “mais pessoas, por mais tempo e com valores de benefícios maiores”. “Esses três fatores positivos geram desafios para a sustentabilidade financeira dos regimes de repartição públicos, pois o aumento da longevidade e a valorização do salário mínimo tornarão o déficit atuarial crescente ao longo dos anos”, diz o economista, que já atuou como secretário em alguns ministérios.
“Uma conta básica que precisamos ter em mente é que os regimes de repartição precisam de no mínimo três pessoas trabalhando para pagar um benefício. Atualmente, todos os entes têm uma relação de ativo por inativos menor do que essa métrica”, afirma Lima.
Leonardo Rolim, consultor de Orçamento da Câmara dos Deputados e ex-secretário da Previdência Social, afirma que a reforma da Previdência de 2019 teve um impacto relevante para evitar um crescimento maior do déficit em porcentagem do PIB. “Até meados da próxima década, o déficit estará mais ou menos estável. Se não fosse a reforma feita, as projeções que constavam na LDO [Lei de Diretrizes Orçamentárias] de 2019 apontavam que o déficit já estaria em mais de 3% do PIB hoje e acima de 4% em 2030”, disse.
Longevidade e valorização do mínimo tornarão o déficit crescente”
Apesar de ter garantido um crescimento menos explosivo da despesa, Rolim afirma que uma nova reforma será necessária. “A partir da década de 2030, a reforma [de 2019] já não vai mais conseguir controlar o crescimento do déficit em % do PIB. O Brasil está envelhecendo rápido e tem uma das menores taxas de fecundidade. O déficit vai ficar insustentável nas próximas décadas”, afirma o economista, que já foi presidente do INSS.
Leal de Barros pondera que os ganhos da reforma da Previdência foram amenizados em função da retomada da política de valorização do salário mínimo e da derrubada da atualização automática da idade mínima de aposentadoria durante a tramitação da reforma da Previdência no Congresso Nacional. Por isso, ele também vê uma necessidade de nova reforma num futuro “não muito distante”.
“De acordo com as projeções populacionais da ONU, o Brasil terá um dos processos de envelhecimento mais intensos e rápidos do mundo, de modo que em 2030 já será possível considerar o país como idoso”, diz Barros.
Rolim defende uma nova reforma que adicione uma camada de capitalização ao regime previdenciário, que hoje é baseado somente na repartição. Também disse que é importante equiparar as idades de aposentadorias de homem e mulher, acabar com a diferença de idade entre urbano e rural e adotar reajustes automáticos desses parâmetros de acordo com a expectativa de vida da população.
Pelo lado da receita previdenciária, Rolim pontua que o desafio é ainda maior, porque a população economicamente ativa vai diminuir e a economia 4.0 tem feito cada vez mais pessoas trabalharem de forma autônoma. “Governo tem que buscar novas forma de contribuição para esse tipo de trabalhador”, disse. No curto prazo, ele comentou que podem ser feitas melhorias na cobrança da dívida ativa, porque o percentual de recuperação é “baixíssimo”.
Fonte: Valor (11/04/2024)
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