A guerra pode fazer com que a taxa básica de juros seja elevada ainda mais e por mais tempo para conter a inflação, o que muda o cenário de investimentos. Veja onde estão as melhores oportunidades
Nesta quarta-feira (16), o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) aumentou a Selic pela nona vez consecutiva, de 10,75% para 11,75% ao ano, para conter a inflação. No encontro anterior, a expectativa era que essa fosse uma das últimas altas, mas há uma pedra no meio do caminho, ou pior, uma guerra, que pode fazer com que a taxa básica de juros seja elevada ainda mais e por mais tempo, o que muda o cenário de investimentos.
A previsão média dos economistas na última segunda-feira (14) era que a Selic acelerasse para 12,75% até o final de 2022, conforme o Boletim Focus do Banco Central. Mas as projeções mudam a cada semana. Se a estimativa se concretizar, a renda fixa ficará cada vez mais atrativa em comparação à renda variável.
“Além da guerra bélica entre a Rússia e a Ucrânia, de proporções humanitárias horrorosas, temos a guerra contra a inflação, com as mudanças nas cadeias de produção e de consumo. Os bancos centrais estão atentos à alta de preços e isso pode provocar um aumento de juros, talvez acima do que o mercado espera”, afirma Wilson Barcellos, presidente da gestora de patrimônio Azimut Brasil.
Até títulos atrelados à Selic, do Tesouro Direto, fundos simples (os fundos DI, por exemplo) e Certificados de Depósitos Bancários (CDBs) com rendimento a partir de 100% do CDI, antes aconselhados apenas para reserva de emergência, darão bons retornos para aqueles que deixarem o dinheiro aplicado por até um ano, conforme especialistas. Eles darão rendimento real, ou seja, acima da inflação.
Aqueles que abrirem mão de liquidez diária, ou seja, de conseguir resgatar o dinheiro a qualquer hora, conseguem achar CDBs com rendimento acima de 115% do CDI, emitidos por bancos médios e pequenos e acessíveis em plataformas de investimento. Contudo, especialistas desaconselham deixar o dinheiro preso nesses títulos por mais de um ano, porque o cenário pode mudar, a Selic pode cair e o investidor corre o risco de ficar preso em papéis que não pagam tão bem.
“Gosto de ter uma parcela de capital atrelada ao CDI porque traz uma previsibilidade de caixa muito alta. Mas deixar o dinheiro nesses títulos por mais de um ano deixa de ser proteção e passa a ser especulação”, aconselha Barcellos.
Quem puder deixar a grana investida por acima de um ano e tiver mais apetite ao risco pode ganhar ainda mais com títulos prefixados e atrelados à inflação, cujo rendimento é uma taxa prefixada mais o IPCA. Entretanto, é necessário estar disposto a resgatar o dinheiro apenas na data de vencimento para receber o retorno combinado nesses títulos.
Além disso, o conselho dos especialistas é comprar esses títulos de curto prazo agora, porque o cenário está incerto demais e esses papéis podem sofrer com a volatilidade do mercado acima do comum antes da data de vencimento, o que pode assustar pequenos investidores.
Títulos prefixados
Quatro dos cinco especialistas ouvidos pelo Valor Investe acham que agora é uma boa hora para comprar títulos prefixados. Dá para encontrar títulos no Tesouro Direto com juros de 12,5% ao ano e CDBs com taxas de até 15% ao ano.
Marco Caruso, economista-chefe do Banco Original, explica que o Tesouro Nacional e os bancos já subiram os juros oferecidos, baseados na projeção de alta maior da Selic, que está na boca do mercado financeiro. Assim, quando a taxa básica de juros chegar no pico, já terá passado da hora de comprar esses papéis.
“A não ser que o Banco Central surpreenda, o aumento da Selic já está embutido nas taxas. Há risco delas subirem mais, mas já são retornos razoáveis. Esperar muito pode ser perder a oportunidade”, indica.
Francisco Levy, estrategista-chefe da Vitreo, acredita que o Banco Central pode não aumentar tanto a Selic quanto o mercado espera agora. Ele avalia que os cortes podem começar em outubro e que talvez sejam feitos de forma mais acelerada do que o previsto. “Acho que a elevação de juros futuros está exagerada e que há oportunidade para comprar títulos prefixados”, recomenda.
Contudo, os especialistas aconselham comprar títulos prefixados de até três anos, porque há muitas incertezas do que vem pela frente. Alguns sugerem períodos ainda mais curtos, enquanto outros gostam mais de papéis atrelados ao CDI para prazos menores. Se o Brasil entrar em uma espiral de inflação e a Selic subir acima do estimado, o investidor corre o risco de ficar preso por muito tempo em papéis com juros abaixo da Selic.
Fabrizio Gueratto, especialista em investimentos do banco digital Modalmais, pensa diferente sobre os prefixados. Ele acha que é bom negócio esperar para comprá-los. “Devem ter taxas melhores acompanhando a alta da Selic e o investidor pode perder oportunidades melhores daqui alguns meses se investir agora”, sugere.
Papéis atrelados à inflação
Já os títulos atrelados à inflação são uma unanimidade entre os conselhos de melhores investimentos atualmente. É possível achar títulos do Tesouro Direto com retorno perto de 6% ao ano mais IPCA e CDBs com rendimento acima de 6% ao ano mais inflação. A parte prefixada do retorno está alta, e a outra, indexada ao IPCA, protege os investidores do aumento generalizado dos preços.
“Sempre é bom ter uma porção razoável desses papéis, mas agora, principalmente, com o objetivo de manter o poder de compra”, aconselha Caruso, do Banco Original. Apesar de afirmar que é momento de ter esses papéis, ele diz que a hora de aumentar a parcela deles na carteira já passou. “Eu não aumentaria, porque em algum momento a inflação vai esfriar”, indica.
Barcellos, da Azimut Brasil, recomenda comprar os títulos atrelados à inflação com data de vencimento até 2030, no máximo. “O risco de comprar papéis com prazos mais longos é altíssimo para o pequeno investidor, que em geral não tem previsão de fluxo de caixa por muito tempo”, alerta.
Cuidado com os títulos de bancos menores
Os títulos de renda fixa de todas as modalidades emitidos por bancos médios e pequenos dão retornos mais altos, mas são mais arriscados, porque as instituições financeiras têm mais chance de dar calote do que o governo ou os bancos grandes. Os papéis que têm os melhores rendimentos geralmente não têm liquidez diária.
“A primeira pergunta que a pessoa deve se fazer antes de decidir o título é quando precisará do dinheiro. Caso tenha dúvida, liquidez diária é mais importante do que rentabilidade”, aconselha Caruso, do Banco Original. “Já, se não precisar de liquidez diária, a segunda pergunta que a pessoa deve se fazer é se a taxa oferecida vale a pena para deixar o dinheiro preso”, indica. Quanto maior o prazo, maior o risco.
Até o limite de R$ 250 mil por CPF por banco, o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) devolve o dinheiro caso a instituição financeira tenha problemas. Contudo, Levy, da Vitreo, recomenda que o investidor dê preferência para CDBs de bancos mais conhecidos, com nota de crédito AAA (triple A).
“Pode ter um pouquinho dos seus investimentos de bancos com notas de crédito mais baixas, aproveitando o FGC, mas não muito”, sugere.
Bolsa perde atratividade, mas continua aconselhada
Apesar da bolsa perder atratividade em comparação à renda fixa, os especialistas afirmam que a dinheirama dos estrangeiros entrando na B3 aponta que há oportunidades entre as ações brasileiras. Os estrangeiros entraram com R$ 72 bilhões na bolsa neste ano, descontando as saídas, enquanto as pessoas físicas resgataram R$ 16 bilhões, descontando os aportes, até 14 de março.
“A entrada de estrangeiros pressupõe que há bons ativos a preços atrativos. O Ibovespa é um conjunto de mais de 70 empresas e, como sempre, há ações caras e outras descontadas. Cabe comprar os papéis certos”, afirma Gueratto, do Modalmais.
Ele aconselha que os investidores tomem cuidado com o comportamento de manada. “As pessoas se apaixonam e desapaixonam por ativos e acham que vão resolver a vida. Substituem a bolsa pelas criptomoedas. Isso mostra que temos um trabalho árduo de educação financeira pela frente”, diz.
Caruso adverte que momentos extraordinários de incerteza, como guerras, são os piores para abandonar investimentos. “Cada um tem que respeitar o próprio sono, mas é preciso lembrar com quais objetivos você fez o investimento e pensando em qual horizonte de tempo, e manter o plano, em vez de ficar mudando a carteira nas horas de alto ruído”, indica. “No longo prazo, a bolsa é a que tem maior potenciam de trazer ganhos acima da inflação”, recomenda.
É hora de contar com bons gestores
As grandes oscilações de preços das ações e outros ativos abrem oportunidades de achar descontos, mas é necessário contar com especialistas para isso, destaca Arley Júnior, especialista em Investimentos do Santander. Ele afirma que, em momentos de alta volatilidade, como agora, é aconselhado que os investidores deleguem o seu dinheiro para os gestores identificarem os melhores ativos, inclusive no exterior.
“Temos sinalizado cautela para investir no exterior. Não sabemos quanto a guerra vai durar e o tamanho do impacto sobre a economia. Agora, o investidor precisa de alguém para ajudar a avaliar os melhores ativos”, afirma.
Os especialistas dizem que há muitos motivos para o mercado seguir volátil neste ano, entre eles guerra, inflação e alta de juros e eleições. Eles ressaltam também que especialmente os bons gestores de fundos multimercados, que compram diferentes ativos, conseguem achar oportunidades e entregar resultados nos momentos de alto risco. Esses profissionais conseguem ter sangue frio e tirar proveito das oscilações dos ativos, acertando onde tomar risco e o quanto.
Fonte: Valor Investe (16/03/2022)
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