quarta-feira, 30 de março de 2022

Direito Previdenciário: Direito Adquirido em Direito Previdenciário no INSS e o Entendimento do STF

 


Aprenda o que é direito adquirido, em quais situações ele existe, como é tratado na EC 103/2019 e o entendimento do STF e STJ sobre o tema.

1) O que é Direito Adquirido?

Mesmo sendo um conceito básico na nossa área, não é tarefa fácil entender o que é direito adquirido.  

Explicando de maneira simples, direito adquirido é um termo jurídico usado para se referir a um direito que foi definitivamente incorporado ao patrimônio jurídico de uma pessoa depois de cumprir integralmente determinados requisitos exigidos pela lei. 

O direito adquirido tem previsão constitucional expressa, lá no art. 5º, inciso XXXVI, da CF: 

Constituição Federal, Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…)

XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;” (g.n.)

Desse modo, quando alguém tem direito adquirido, nem mesmo as leis ou decisões judiciais posteriores podem retirar este direito. 

“Então é só isso que eu preciso saber sobre direito adquirido, Alê?” 

Não, o direito adquirido acaba sendo muito mais complexo na área previdenciária. O advogado previdenciarista precisa se atentar a vários pontos na hora de analisar se o cliente possui ou não direito adquirido à aposentadoria.

Isso acontece porque o Direito Previdenciário, bode expiatório favorito do Governo para todas as mazelas econômicas, muda o tempo todo!

Eu mesma já perdi as contas de quantas alterações normativas, legais e constitucionais eu presenciei desde que comecei a atuar em Direito Previdenciário. Por isso, é tão importante dominar este conceito!

Para ajudar nossos leitores nessa missão, resolvi escrever o artigo de hoje!

2) Direito Adquirido Previdenciário

Primeiramente, você precisa entender a diferença entre direito adquirido, expectativa de direito e direito expectado. 

Para ficar mais didático, vou explicar separadamente cada uma dessas classificações! 

2.1) Direito Adquirido

Como disse lá no início, direito adquirido é quando o direito definitivamente foi incorporado ao patrimônio jurídico da pessoa depois de cumprir integralmente determinados requisitos exigidos pela lei.

Quem tem direito adquirido, pode exercê-lo a qualquer momento. 

Por isso, não importa se a pessoa requereu ou não o benefício em uma determinada data, porque, se ela já cumpriu os requisitos, ela tem direito adquirido ao benefício. 

2.2) Expectativa de Direito

Por outro lado, quando falamos em expectativa de direito, estamos nos referindo à situação de alguém que apresenta um direito que está próximo de se concretizar, mas só não se concretizou porque ainda não foram cumpridos todos os requisitos exigidos pela lei. 

O segurado que se enquadra nessa situação tem só uma expectativa de que vai cumprir os requisitos no futuro e que aí sim este direito será adquirido. 

É o caso de quem já começou a contribuir com o INSS ou quem está “quase para se aposentar”. 

Como a expectativa de direito não é protegida pela Constituição Federal (sendo inclusive o entendimento adotado pelo STF, como vou explicar adiante), pessoas nessa situação não podem aproveitar as regras antigas de cálculo do benefício e têm direito de usufruir apenas das chamadas “regras de transição” (se forem mais vantajosas). 

2.3) Direito Expectado

Por fim, existe ainda uma terceira classificação, que é o direito expectado. Neste caso, o segurado já preencheu todos os requisitos exigidos pela lei, mas, por qualquer motivo, ainda não exerceu este direito. 

É o caso de alguém que já preencheu todos os requisitos para a aposentadoria, mas ainda não fez o pedido ao INSS.

É muito parecido com o direito adquirido, né? 

Aliás, em minha opinião, não faz muito sentido diferenciar “direito expectado” de “direito adquirido”, visto que a única diferença, ao meu entender, é que um foi consumado e o outro ainda não. 

Porém, é importante que você também conheça essa nomenclatura e saiba da diferença!

3) Regras de Transição e Melhor Benefício

Agora, vamos falar sobre três temas que são super recorrentes na rotina de trabalho dos advogados previdenciaristas: regras de transição, direito adquirido e direito ao melhor benefício. 

3.1) E se a nova regra for melhor?

Sempre que há previsão de mudança nas regras previdenciárias, muitos segurados tendem a se precipitar e já dar entrada no pedido de aposentadoria no INSS, visando aproveitar as regras antigas. 

Mas, a realidade é que não é possível saber, antes de fazer um cálculo muito bem estudado, se vale a pena se aposentar em um determinado momento ou esperar mais um pouco. 

Isso porque o cálculo do valor de um benefício é algo complexo, que leva em conta muitas variáveis.

Então, o melhor conselho que posso dar a estas pessoas é: faça um bom planejamento previdenciário (serviço oferecido por advogados especialistas em direito previdenciário que busca determinar qual o melhor cenário para a aposentadoria do cliente).

Em muitos casos, um pedido de aposentadoria feito fora de hora pode diminuir, e muito, o valor do benefício! 

Além disso, caso a pessoa já tenha direito adquirido, não há motivo para se desesperar para se aposentar antes da entrada em vigência da nova norma.

Isso porque o direito adquirido ao melhor benefício previdenciário dá a liberdade para a pessoa que já cumpriu os requisitos para a aposentadoria continuar trabalhando, sem se preocupar se isso eventualmente pode piorar o seu benefício.

Imagine a seguinte situação: um segurado que completou os requisitos necessários para aposentadoria, mas não fez o pedido na época e optou por continuar trabalhando. 

Se forem alteradas as normas da Previdência, ele vai se aposentar pelas regras antigas (da época em que ele completou os requisitos) ou pelas regras novas (do momento do pedido da aposentadoria)? 

Pois é, graças à garantia do direito adquirido, o segurado pode se aposentar de acordo com as regras vigentes ao tempo da implementação de todos os requisitos (regras antigas). 

Mas, se a regra nova for melhor, é possível também renunciar ao direito adquirido. 

Olha só esses exemplos de casos em que as regras novas costumam ser mais vantajosas:

Em certas situações, a regra nova para o professor é mais benéfica, pois o fator previdenciário aplicado é terrível (chegando a diminuir pela metade);

Segurados com muito tempo de contribuição (homens com mais de 40 anos, mulheres com mais de 35 anos) podem passar da média de 100%, de modo que a regra nova geralmente é mais vantajosa.

Porém, fique atento: jamais deixe de fazer os cálculos e comparar, pois os valores podem ser diferentes de acordo com cada caso!

3.2) Direito adquirido e as Regras de transição

Sempre que surge uma nova regra previdenciária, vão existir três grupos de pessoas (que chamarei de A, B e C, para ficar mais fácil a explicação):

Grupo “A”: Pessoas que já estão filiadas ao RGPS e que já cumpriram todos os requisitos para obter o benefício previdenciário de acordo com as normas antigas (ou seja, pessoas que já têm direito adquirido ou direito expectado);

Grupo “B”: Pessoas que já estão filiadas ao RGPS, mas ainda não cumpriram todos os requisitos para obter o benefício previdenciário de acordo com as regras antigas (ou seja, pessoas que têm só expectativa de direito);

Grupo “C”: Pessoas que se filiaram ao RGPS só depois do surgimento da nova regra.

Pessoas do grupo “A” podem optar pelas regras que forem mais vantajosas, que normalmente são as regras antigas. Pessoas do grupo “C” não têm opção e deverão seguir as regras novas. 

Já as pessoas do grupo “B” são “pegas de surpresa”, visto que em um momento precisam cumprir um requisito menos rigoroso e, no seguinte (após a nova norma) passam a precisar cumprir um requisito mais rigoroso. 

E isso é juridicamente possível porque essas pessoas não têm direito adquirido, mas apenas expectativa de direito.

Como vocês sabem, não é admitido o “direito adquirido ao regime jurídico”. Mas, para evitar um choque muito grande, as leis previdenciárias quase sempre trazem o que chamamos de “regras de transição”. 

As regras de transição são um conjunto de regras aplicáveis às pessoas com expectativa de direito e servem para amenizar um pouco o rigor da regra nova. É algo intermediário entre a regra antiga e a regra nova.

Se quiser se aprofundar no assunto e entender cada uma das regras de transição, é só ler esse outro artigo que também publiquei: O que são Regras de Transição em direito previdenciário e porque você precisa dominá-las.

4) Direito Adquirido Previdenciário e o STF

Como vocês provavelmente sabem, o STF tem várias decisões que tratam sobre direito adquirido em matéria previdenciária. 

Mas, no artigo de hoje, quero destacar três posicionamentos do STF que considero essenciais para quem quer entender o direito adquirido previdenciário!

4.1) Súmula 359 STF

Começando pela Súmula n. 359 do STF, que foi publicada lá no ano de 1963 e, posteriormente, alterada no ano de 1973 (em razão do julgamento dos Embargos de Declaração no RExt n. 72.509). 

Através dela, o STF firmou entendimento no sentido de que, em matéria previdenciária, a lei aplicável é a vigente ao tempo da reunião dos requisitos para a concessão do benefício, em atenção ao princípio tempus regit actum.

Olha só o que diz o enunciado:

Súmula 359, STF. Ressalvada a revisão prevista em lei, os proventos da inatividade regulam-se pela lei vigente ao tempo em que o militar, ou o servidor civil, reuniu os requisitos necessários”. (g.n.)

Por isso, se uma pessoa já cumpriu TODOS os requisitos para se aposentar, ela tem direito adquirido a esta aposentadoria e isso não mudará, ainda que venham novas leis.

4.2) Hibridização de normas

Damos o nome de hibridização de normas à situação em que se “mescla” aspectos de mais de uma lei, com o objetivo de criar de um novo regime híbrido (decorrente da fusão dessas leis). 

Mas, em 2013, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário n. 630.501/RS (com repercussão geral reconhecida), de relatoria da Ministra Ellen Gracie, o STF decidiu pela impossibilidade do segurado se beneficiar dos aspectos mais benéficos de cada lei com vista à criação de regimes híbridos.

Confira um trecho do acórdão:

“O que este Supremo Tribunal Federal não reconhece é o direito adquirido a regime jurídico, ou seja, não considera abrangido pela garantia constitucional a proteção de simples expectativas de direito.

Também não admite a combinação dos aspectos mais benéficos de cada lei com vista à criação de regimes híbridos.” (g.n.)

(STF, RExt n. 630.501/RS, Rel. Min. Ellen Gracie, Julgamento: 21/02/2013, Publicação: 26/08/2013)

Desse modo, ao se aposentar, o segurado não pode usar dos aspectos mais benéficos das regras antigas (que possui direito adquirido) combinados com os aspectos mais benéficos das novas regras. Nesse caso, ele terá que optar por qual regra quer adotar.

Além disso, o segurado não pode se aproveitar das regras antigas e utilizar tempo de contribuição posterior à regra nova. 

Por exemplo: cumpriu os requisitos para aposentadoria antes da EC n. 103/2019, mas quer aproveitar o tempo posterior para aumentar o tempo de contribuição.

Este artigo aqui é um bom exemplo disso: Regra 85/95: Como ficou após a Reforma da Previdência? 

4.3) Direito Adquirido a Regime Jurídico

Por fim, vale a pena saber que, no mesmo julgado que citei no tópico anterior (RExt n. 630.501/RS), o STF não reconheceu o direito adquirido a regime jurídico, ou seja, não considerou abrangido pela garantia constitucional a proteção de simples expectativas de direito. 

Portanto, quem já está filiado ao sistema previdenciário, trabalhando e recolhendo contribuições, ou mesmo quem está “quase para se aposentar”, não possui direito adquirido  e sim expectativa de direito.

Nesses casos, serão aplicáveis as normas novas (em se tratando de segurados que se filiaram ao Sistema só depois do surgimento da nova regra) ou as regras de transição (em se tratando de segurados com expectativa de direito). 

5) Direito Adquirido na Reforma da Previdência

Mesmo passados mais de dois anos da publicação da EC n. 103/2019, o tema ainda lidera o ranking de dúvidas dos nossos leitores. 

Por isso, resolvi dedicar uma parte deste artigo a explicar os impactos da Reforma da Previdência no direito adquirido!

5.1) Data da Reforma da Previdência

“Nossa Alê, é sério que existe gente que ainda tem essa dúvida?”

Sim, muitas pessoas ainda me fazem essa pergunta! 

Portanto, vou responder: a EC n. 103/2019 (responsável pela Reforma da Previdência) foi promulgada em 12/11/2019 e publicada em 13/11/2019.

Além disso, o art. 36 da Reforma da Previdência define quando as normas entraram em vigor:

“EC 103/2019, Art. 36. Esta Emenda Constitucional entra em vigor:

I – no primeiro dia do quarto mês subsequente ao da data de publicação desta Emenda Constitucional, quanto ao disposto nos arts. 11, 28 e 32;

II – para os regimes próprios de previdência social dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, quanto à alteração promovida pelo art. 1º desta Emenda Constitucional no art. 149 da Constituição Federal e às revogações previstas na alínea “a” do inciso I e nos incisos III e IV do art. 35, na data de publicação de lei de iniciativa privativa do respectivo Poder Executivo que as referende integralmente;

III – nos demais casos, na data de sua publicação.

Parágrafo único. A lei de que trata o inciso II do caput não produzirá efeitos anteriores à data de sua publicação.” (g.n.)

5.2) Promulgação e vigência da EC 103/2019 e respeito ao Direito Adquirido

O art. 3º, caput e §2º da Reforma da Previdência fala expressamente que o direito adquirido dos segurados e dependentes será respeitado, desde que tenham sido cumpridos os requisitos para obtenção desses benefícios até a data de entrada em vigor da EC n. 103/2019.

Olha só o que diz a norma:

“EC n. 103/2019, Art. 3º. A concessão de aposentadoria ao servidor público federal vinculado a regime próprio de previdência social e ao segurado do Regime Geral de Previdência Social e de pensão por morte aos respectivos dependentes será assegurada, a qualquer tempo, desde que tenham sido cumpridos os requisitos para obtenção desses benefícios até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, observados os critérios da legislação vigente na data em que foram atendidos os requisitos para a concessão da aposentadoria ou da pensão por morte. (…)

§ 2º Os proventos de aposentadoria devidos ao segurado a que se refere o caput e as pensões por morte devidas aos seus dependentes serão apurados de acordo com a legislação em vigor à época em que foram atendidos os requisitos nela estabelecidos para a concessão desses benefícios. (…)” (g.n.)

Perceba que não importa a data da entrada do requerimento (DER) ou quando se provou que o direito existe, o que importa é o dia do implemento de todas as condições do benefício previdenciário (ou o dia do óbito, no caso de pensão por morte).


Como expliquei, a EC n. 103/2019 foi promulgada em 12/11/2019 e passou a ter vigência em 13/11/2019 (data da publicação no DOU). 

Desse modo, quem tinha direito adquirido até 13/11/2019 (inclusive) poderá usar as regras que forem mais vantajosas, que normalmente são as regras antigas (anteriores à Reforma).

5.3) Aplicação da Regra 86/96 após a Reforma da Previdência

A Regra 85/95 (art. 29-C da Lei n. 8.213/1991) NÃO pode ser utilizada após a Reforma da Previdência para afastar o fator previdenciário dos cálculos de aposentadoria, exceto em casos de direito adquirido até a data de publicação da EC n. 103/2019 (13/11/2019).

Isso quer dizer que, se a pessoa atingiu a pontuação até 13/11/2019, então ela tem direito adquirido à Regra 85/95. 

Mas, se ela não atingiu a pontuação até 13/11/2019, mesmo que já apresentasse o tempo de contribuição necessário, não poderá atingir a pontuação após esta data. No máximo, tem direito adquirido à aposentadoria por tempo de contribuição com aplicação do fator previdenciário.

Lembrando que cada caso é um caso, e precisa ser estudado detalhadamente pelo advogado. 

Para entender melhor o assunto, recomendo a leitura do artigo: Como fica a Regra 85/95 (86/96) com a Reforma da Previdência (EC 103/2019)?.

5.4) Aposentadoria Especial e o Direito Adquirido

Antes da Reforma da Previdência, era possível a conversão do tempo especial em comum. 

Ou seja, há direito adquirido à conversão do período trabalhado em atividades insalubres até 13/11/2019 (data de entrada em vigor da Reforma), mesmo que a aposentadoria seja requerida vários anos após.

Mas, depois da Reforma da Previdência, não é mais possível converter o tempo especial (trabalhado sob condições insalubres) em comum.

Confira o que diz o art. 25, §2º, da EC n. 103/2019:

“EC 103/2019, Art. 25. Será assegurada a contagem de tempo de contribuição fictício no Regime Geral de Previdência Social decorrente de hipóteses descritas na legislação vigente até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional para fins de concessão de aposentadoria, observando-se, a partir da sua entrada em vigor, o disposto no § 14 do art. 201 da Constituição Federal.

(…)

§ 2º Será reconhecida a conversão de tempo especial em comum, na forma prevista na Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, ao segurado do Regime Geral de Previdência Social que comprovar tempo de efetivo exercício de atividade sujeita a condições especiais que efetivamente prejudiquem a saúde, cumprido até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, vedada a conversão para o tempo cumprido após esta data.” (g.n.)

Com a mudança trazida pela Reforma, também houve a adição do §14 ao art. 201 da Constituição Federal:

“Constituição Federal, Art. 201, § 14. É vedada a contagem de tempo de contribuição fictício para efeito de concessão dos benefícios previdenciários e de contagem recíproca. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)” (g.n.)

Além disso, de acordo com o entendimento firmado pelo STJ no julgamento do Tema Repetitivo n. 546 (REsp n. 1.310.034/PR), de relatoria do Ministro Herman Benjamin:

“A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço”. (g.n.)

Veja bem: o tempo trabalhado em atividades insalubres até a data da Reforma da Previdência poderá ser convertido em comum, independente da data da aposentadoria (ainda que esta seja posterior à Reforma). Trata-se de direito adquirido.

Vale a pena dizer que alguns doutrinadores de renome afirmam que a conversão de tempo especial em tempo comum não seria tempo de contribuição fictício, mas um simples ajuste matemático (e eu concordo com este posicionamento). 

No entanto, na aposentadoria especial, é vedada expressamente a conversão, como se representasse tempo ficto.

6) Exemplos de Direito Adquirido

Como sei que vocês adoram quando explico a matéria através de exemplos, cá estou eu trazendo alguns exemplos práticos de direito adquirido previdenciário! 

6.1) Direito Adquirido na Reforma da Previdência

Exemplo 1: João requereu seu benefício em 09/07/2019 (DER) mas teve seu pedido analisado pelo INSS somente em 14/11/2019, ocasião em que foi constatado que ele já havia cumprido todos os requisitos para o benefício na DER.

Ele tem direito adquirido ao cálculo pelas regras anteriores?

Resposta: Sim, pois a DER é anterior à entrada em vigor da EC n. 103/2019.

Exemplo 2: Rodolfo requereu seu benefício em 14/11/2019 (DER) e foi constatado que ele já havia cumprido os requisitos para a concessão do benefício em 13/11/2019.

Ele tem direito adquirido ao cálculo pelas regras antigas?

Resposta: Sim, pois ele cumpriu os requisitos na data da entrada em vigor da EC n. 103/2019.

6.2) Direito Adquirido para Aposentadoria Proporcional

Antes de mais nada, esclareço que a aposentadoria proporcional deixou de existir com a EC n. 20/1998 (ou seja, bem antes da Reforma da Previdência de 2019).

Depois desta data, só quem tinha direito adquirido à lei antiga ou então à regra de transição podia requerer a aposentadoria proporcional.

Para entender melhor, recomendo a leitura do meu artigo Aposentadoria proporcional: antecipação de aposentadoria.

Dito isso, vamos ao exemplo: Luísa requereu sua aposentadoria em 15/05/2001 (DER), mas já havia cumprido todos os requisitos (30 anos de contribuição e toda a carência) para a aposentadoria proporcional antes de 16/12/1998.

Ela tem direito adquirido à aposentadoria proporcional pelas regras antigas ou pelas regras de transição?

Resposta: Sim, ela tem direito adquirido às regras antigas, pois os requisitos foram preenchidos antes da EC n. 20/1998.

6.3) Pensão por Morte: Direito Adquirido antes da Reforma da Previdência

Exemplo: Sr. Esteves faleceu em 13/11/2019, sendo que tinha qualidade de segurado nessa data. 

Desse modo, seus dependentes entraram com pedido de pensão por morte em 05/12/2019 (DER). 

Os dependentes têm direito adquirido ao cálculo da pensão por morte pelas regras antigas?

Resposta: Sim, pois a data do óbito ocorreu na data da entrada em vigor da EC n. 103/2019.

Aliás, você sabia que o valor da pensão por morte é bem mais vantajoso pelas regras anteriores à EC n. 103/2019?

Se quiserem, posso escrever um artigo sobre como calcular o valor da pensão por morte após a Reforma. É só me falar nos comentários! 

6.4) Direito Adquirido à Aposentadoria por Invalidez

Exemplo: Júlia deu entrada no pedido de aposentadoria por invalidez previdenciária (não acidentária) no INSS em 14/11/2019 (DER).

Porém, através de exames e laudos médicos, foi comprovado que a incapacidade teve início em 10/10/2019 (DII – data de início da incapacidade), mesmo que a perícia tenha sido realizada apenas em 15/01/2020.

Há direito adquirido ao cálculo do valor do benefício de acordo com as regras antigas?

Resposta: Sim, pois a incapacidade teve início antes da entrada em vigor da EC n. 103/2019.

Inclusive, assim como na pensão por morte, o valor da aposentadoria por invalidez previdenciária também é bem mais vantajoso pelas regras anteriores à EC n. 103/2019. 

É o que explico no artigo: Valor da aposentadoria por incapacidade permanente (aposentadoria por invalidez) após a Reforma da Previdência.

Outra situação interessante, é que as regras de cálculo trazidas pela Reforma podem fazer com que a aposentadoria por invalidez previdenciária seja menor que o auxílio-doença, como comentei nesse outro artigo: Valor do auxílio-doença pode ser maior que o da aposentadoria por invalidez?.

6.5) Fator Previdenciário e o Direito Adquirido

Exemplo: Em 12/11/2019, Ana já tinha tempo para se aposentar, mas apenas iria atingir a somatória para afastar o fator previdenciário em 15/03/2020. 

Ela tem direito adquirido à se aposentar pela Regra 85/95, sem fator previdenciário?

Resposta: Não, ela tem direito adquirido somente à aposentadoria com a aplicação do fator previdenciário, pois não somou a pontuação até a data de entrada em vigor da EC n. 103/2019.

7) Dúvidas comuns sobre direito adquirido à aposentadoria

A seguir, selecionei para responder sete das principais dúvidas que chegam até mim sobre direito adquirido à aposentadoria.

Caso você tenha qualquer outro questionamento ou até mesmo informação para complementar, compartilhe comigo nos comentários! 

7.1) Quem pode se aposentar pela lei antiga?

Bom, isso depende de qual lei estamos falando.

Se a pergunta for em relação à Reforma da Previdência, a pessoa só terá direito de se aposentar pelas regras antigas se estiver filiada ao sistema e cumprido os requisitos de concessão do benefício até 13/11/2019 (data da Reforma). 

Nesse caso, por se tratar de direito adquirido, o segurado pode optar pelas regras que forem mais vantajosas, que normalmente são as regras antigas. 

7.2) O que é direito adquirido na aposentadoria?

O direito adquirido na aposentadoria ocorre quando a pessoa cumpre integralmente os requisitos para a concessão do benefício exigidos pela lei e o direito de aposentar-se definitivamente se incorpora ao seu patrimônio jurídico.

Quem tem direito adquirido, pode exercê-lo a qualquer momento.

Por isso, não importa se a pessoa requereu ou não o benefício em uma determinada data, porque, se ela já cumpriu os requisitos, ela tem direito adquirido. 

7.3) Insalubridade é direito adquirido?

Como expliquei no tópico 5.4, depois da Reforma da Previdência, não é mais possível converter o tempo especial (trabalhado sob condições insalubres) em comum, nos termos do art. 25, §2º, da EC n. 103/2019 e art. 201, §14 da Constituição Federal.

Portanto, podemos dizer que existe direito adquirido à conversão do período trabalhado em atividades insalubres até 13/11/2019 (data de entrada em vigor da Reforma), mesmo que a aposentadoria seja requerida vários anos depois.

Nos demais casos, a insalubridade não é direito adquirido. 

7.4) Existe direito adquirido a regime jurídico?

Infelizmente, o STF não reconhece o direito adquirido ao regime jurídico, conforme expliquei lá no tópico 4.2. 

Ou seja, a Corte não considera abrangido pela garantia constitucional a proteção de simples expectativas de direito.

7.5) Quem tem direito adquirido?

Via de regra, têm direito adquirido quem já era filiado ao RGPS e que já havia cumprido todos os requisitos para obter o benefício previdenciário de acordo com as normas antigas até 13/11/2019, no caso da EC n. 103/2019 (Reforma da Previdência).

Lembrando que, em casos de pensão por morte, os dependentes têm direito adquirido quando o óbito ocorreu até 13/11/2019. 

Mas, se estivermos analisando outra norma, as datas serão diferentes. O importante é analisar se houve cumprimento dos requisitos da norma antiga antes do advento da norma nova.

8) Como é feito o pagamento do benefício em caso de Direito Adquirido?

Por fim, vale a pena explicar quando começam a valer os efeitos financeiros em casos de direito adquirido.

Para isso, vou diferenciar rapidamente o que é a data do direito adquirido, a data de entrada do requerimento e a data de início do pagamento!

8.1) Direito adquirido x DER x DIP

A data do direito adquirido se refere ao dia em que foram preenchidos os requisitos para a concessão do benefício, enquanto a data de entrada do requerimento (DER) se refere ao dia em que a pessoa entrou com pedido do benefício no INSS. 

Já a data de início do pagamento (DIP), se trata do dia a partir da qual os valores mensais efetivamente começaram a ser pagos pelo INSS ao segurado ou beneficiário.

Os efeitos financeiros previdenciários são determinados pela data de entrada do requerimento (DER), independente da data do direito adquirido.

Portanto, por exemplo, se a pessoa tinha direito adquirido em 13/11/2019, mas só requereu o benefício (DER) em 13/03/2020, os valores serão pagos pelo INSS a partir de 13/03/2020.

9) Conclusão

Como expliquei, direito adquirido é um termo jurídico usado para se referir a um direito que foi definitivamente incorporado ao patrimônio jurídico de uma pessoa depois de cumprir integralmente determinados requisitos exigidos pela lei.

Ele tem previsão constitucional expressa lá no art. 5º, inciso XXXVI, da CF. Mas, é importante também acompanhar as decisões do STF a respeito do assunto, principalmente nesse período pós a Reforma da Previdência. 

Fonte: JusBrasil e Alessandra Strazzi (28/03/2022)

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