Livro conta como bilionários e cientistas se uniram numa corrida para driblar a morte
O imortalismo acredita na imortalidade da alma e é o alicerce de inúmeras religiões. Já os imortalistas a que me refiro têm outra meta, nada espiritual: expandir, quase indefinidamente, os limites da longevidade através da ciência. O tema, tão fascinante quanto polêmico, é o objeto de estudo do jornalista Peter Ward, que acaba de lançar o livro “The price of immortality – the race to live forever” (“O preço da imortalidade – a corrida para viver para sempre”), ainda sem tradução para o português.
Cientistas, bilionários do setor de tecnologia e grupos que cultuam a ideia compartilham a certeza de que a humanidade tem a chance de chegar a algo perto da imortalidade. Ward mapeou essa rede de “devotos”, começando pela Church of Perpetual Life (Igreja da Vida Perpétua), na Flórida, cujos fieis são adeptos entusiastas da criogenia humana. Conhecida cientificamente como criônica, trata-se da técnica que permite refrigerar o corpo a uma temperatura de até menos 196 graus Celsius, suspendendo o processo de deterioração durante anos. Isso tornaria possível sua reanimação no futuro, isto é, se a pessoa morre hoje vítima de uma doença incurável, poderá ser reanimada quando for possível salvá-la.
A tese defendida pelos imortalistas é a seguinte: se a ciência conseguir estender a expectativa de vida em 20 ou 30 anos, ou seja, para algo entre 110 ou 120 anos, os avanços que se darão nesse campo darão um salto exponencial que vai mudar a História da humanidade. Um dos pioneiros na área foi o cientista britânico Aubrey de Grey, que trabalha com a proposta de uma medicina regenerativa, capaz de “derrotar” o curso do envelhecimento. Prevê que, em menos de duas décadas, haverá tratamentos capazes de reparar os danos causados pelo passar dos anos antes que se transformem em patologias. A teoria soou como música para os bilionários do Vale do Silício. Sergey Brin e Larry Page (Google) e Jeff Bezos (Amazon) têm despejado muito dinheiro em pesquisas relacionadas à longevidade.
Na mitologia grega, como Ward escreve, o mito de Orfeu foi criado para ensinar aos homens as consequências nefastas de desafiar a morte. Quando sua amada Eurídice morre, ele desce ao submundo para onde vão as almas dos mortos, disposto a trazê-la de volta. Sua dor comove o deus Hades, senhor desse domínio, que permite que Eurídice volte com uma condição: o casal não deve, em hipótese alguma, olhar para trás. Já perto da superfície, Orfeu quer ter certeza de que a mulher o acompanha e se vira – é o bastante para que ela desapareça. Felizmente, a ciência prefere explorar seus limites. Numa de suas últimas edições, a revista “MIT Technology Review” mostrou que drogas antienvelhecimento estão sendo testadas para combater a Covid-19.
A enfermidade é mais letal à medida que se envelhece e uma das razões é o enfraquecimento do sistema imunológico para combater infecções. Portanto, por que não utilizar drogas que rejuvenescem o organismo para deter sua progressão? Os cientistas preferem não usar a expressão antienvelhecimento por causa da carga negativa que traz em relação à velhice, mas sabemos que este é um fator de risco concreto. A degradação do sistema imunológico também pode afetar indivíduos mais jovens cuja idade biológica está acima da idade cronológica, devido a doenças crônicas como, por exemplo, diabetes ou hipertensão. O que só comprova a beleza da ciência em sua eterna luta para se superar.
Fonte: G1 (22/05/2022)
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