Dorian Mintzer ama seu trabalho. Psicóloga, coach e autora, aos 74 anos, ela ainda não tem planos para se aposentar e continuou trabalhando durante a pandemia, fazendo teleterapia direto de sua casa, na região de Boston. Agora, como milhões de outros trabalhadores mais velhos, Mintzer está insegura quanto ao futuro de seu trabalho: muitas coisas dependerão de os planos de saúde continuarem a cobrir a teleterapia após a pandemia.
“Vou continuar trabalhando virtualmente – a ideia de entrar num prédio de escritórios, sem saber quem entra e sai – não fico muito confortável com isso”, disse ela. “E ficar numa sala com os clientes, nós dois usando máscaras – eu não conseguiria ver suas expressões faciais. Então, pela primeira vez, agora estou me sentindo numa encruzilhada”.
Mintzer está fazendo as mesmas perguntas que milhões de trabalhadores mais velhos. Ainda é cedo para dizer, mas os especialistas acreditam que a pandemia deve acelerar o cronograma dos planos de aposentadoria de muitos trabalhadores de mais idade. Em alguns casos, as decisões serão voluntárias; em outros casos, a aposentadoria pode ser imposta pela eliminação do emprego ou por riscos inevitáveis à saúde.
Um dos fatores mais importantes da aposentadoria é quanto tempo você trabalha. Anos adicionais proporcionam um aumento dos benefícios anuais da Previdência Social. Trabalhar por mais tempo também pode significar economizar mais, depender dessas economias por menos tempo e contar com mais anos de seguro de saúde subsidiado pelo empregador.
Muitos trabalhadores mais velhos, geralmente aqueles com mais de 40 anos, dizem que precisarão trabalhar mais por causa da crise econômica. Por exemplo, entre os entrevistados, 37% dos baby boomers e 39% da geração X disseram ter adiado a aposentadoria ou estar pensando em fazê-lo, de acordo com uma pesquisa recente da TD Ameritrade.
Mas será mais fácil falar do que fazer: entre 2014 e 2016, pouco mais da metade dos trabalhadores que se aposentaram entre 55 e 64 anos o fizeram contra sua própria vontade, devido a problemas de saúde, responsabilidades familiares, demissões e fechamento de negócios, de acordo com pesquisa do Schwartz Center para Análise de Política Econômica na New School for Social Research.
Aqui estão algumas das principais questões que os trabalhadores mais velhos vêm enfrentando na última parte de suas carreiras durante a pandemia.
Sua linha do tempo da aposentadoria
Em uma recessão típica, a taxa de desemprego dos trabalhadores mais velhos permanece abaixo da de seus colegas mais jovens, mas não é o que vem acontecendo desta vez, observou Richard W. Johnson, diretor do programa de política de aposentadoria do Urban Institute.
A taxa combinada de desemprego e subemprego para trabalhadores acima de 65 anos foi de 26% em maio, cerca de 5 pontos percentuais a mais do que a taxa de trabalhadores entre 25 e 54 anos. É a maior diferença desde que se iniciou a série histórica, em 1948, disse Johnson. E as taxas combinadas estão especialmente altas entre os trabalhadores mais velhos que têm menos escolaridade, são negros ou latinos, ou trabalham em determinados setores, como lazer, serviços, transporte e educação.
O que está acontecendo? “Pode ser que estejamos vendo a continuação de uma tendência de longo prazo, na qual as vantagens baseadas na idade estão diminuindo gradualmente devido ao declínio dos sindicatos e ao encolhimento do poder de barganha dos trabalhadores mais velhos”, disse Johnson. “Mas é provável que os riscos de saúde relacionados ao vírus também sejam um fator muito importante”.
Os riscos do retorno
As orientações dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês) afirmam que os adultos acima de 65 anos correm maior risco de doenças graves por causa do coronavírus.
Mas os dados subjacentes do CDC sobre doenças e mortalidade são mais nuançados. Os riscos de doenças graves ou morte para pessoas na faixa dos 50 ou 60 anos que não têm comorbidades – tais como doenças cardíacas ou diabetes – são semelhantes ou até mais baixos do que para os trabalhadores na faixa dos 20, 30 ou 40 anos que têm problemas de saúde.
“Ainda existe um risco adicional de consequências ruins à medida que você avança em cada década de idade até os 70 anos, mesmo sem condições subjacentes, mas não é algo tão pronunciado quanto os riscos para trabalhadores de todas as idades que já tenham problemas de saúde”, disse Daniel Kim, epidemiologista e professor da Northeastern University em Boston.
A maioria dos trabalhadores em risco não pode ficar longe do trabalho por longos períodos. Uma análise da Kaiser Family Foundation mostra que o salário médio dos trabalhadores com mais de 65 anos em 2018 foi de US $ 49.100.
“Quando as empresas reabrem, é um risco duplo para os trabalhadores mais velhos”, disse Tricia Neuman, diretora do programa de políticas do Medicare da Kaiser. “Se eles voltam ao trabalho, correm o risco de ficar gravemente doentes devido à covid, mas, se ficam em casa, podem perder seus rendimentos. Para os trabalhadores mais velhos que esperavam trabalhar o tempo suficiente para receber todos os benefícios da Previdência Social, a decisão de ficar em casa pode ter consequências financeiras para toda a vida”.
Seu empregador vai deixar você voltar?
A recessão em si provavelmente é o maior obstáculo. As melhores chances de os trabalhadores mais velhos conseguirem ou manterem um emprego geralmente acontecem quando a economia está forte, observou Peter Cappelli, professor de administração da Wharton School da Universidade da Pensilvânia.
“Indivíduos mais velhos têm melhores chances de continuar trabalhando quando o empregador os mantém, especialmente quando lhes proporciona aposentadorias em fases ou funções menos exigentes”, disse ele.
Você quer voltar ao trabalho, mas não quer voltar ao local de trabalho? Os empregadores não são obrigados a acomodá-lo por causa da sua idade, de acordo com a Lei Federal sobre Discriminação Etária no Emprego, disse Dan O’Meara, advogado do escritório de Filadélfia da Ogletree Deakins, uma firma global de advocacia trabalhista. No entanto, eles teriam o dever de acomodar qualquer trabalhador com deficiência, segundo as disposições da Lei dos Americanos com Deficiência, acrescentou.
“Isso pode incluir um acordo para trabalho de casa, se não representar uma dificuldade indevida para o empregador”, disse O’Meara.
Grupos de empregadores e senadores republicanos estão fazendo pressão para que, na próxima rodada de legislação sobre alívios durante a pandemia, sejam adicionados dispositivos para proteção contra a responsabilidade legal no caso de funcionários que venham a ser infectados.
Alguns especialistas temem que a pandemia aumente a discriminação por idade no local de trabalho.
“Os trabalhadores mais velhos já enfrentaram períodos de desemprego muito mais duradouros do que os mais jovens”, disse Laurie McCann, advogada da Fundação AARP, especializada em discriminação por idade e questões de emprego. “Acho que, desta vez, as coisas estarão potencializadas: os empregadores ficarão mais reticentes em contratar trabalhadores mais velhos, que podem ser mais vulneráveis a doenças”.
Conversa entre casais
A maioria dos casais não se aposenta ao mesmo tempo. Um estudo da RAND Corp. de 2017 revelou um padrão mais fluido, que geralmente envolve aposentadoria em fases, empregos de curto prazo e períodos de não-emprego e retorno ao trabalho. Para a maioria dos casais, existe uma fase “discordante”, quando um dos cônjuges trabalha mais do que o outro, disse Katherine Carman, economista da RAND e principal autora do estudo.
Esse padrão beneficia os casais do ponto de vista financeiro. Os salários contínuos de um dos cônjuges podem estabilizar as finanças domésticas e permitir que ambos fiquem com um seguro de saúde subsidiado pelo empregador, o que é especialmente útil para pessoas que ainda não são elegíveis para o Medicare.
A covid-19 provavelmente mudará esses padrões, pensa Carman, já que a decisão de retornar ao local de trabalho pode trazer o risco de infecção não apenas para o trabalhador, mas também para o cônjuge.
“Para muitas pessoas, parte da identidade pessoal é quem você é quando sai para o trabalho”, disse Carman. “E, quando chegamos em casa, começamos a mudar a forma como pensamos sobre nós mesmos, mesmo se ainda estamos trabalhando”.
“Essas decisões podem se dar de várias maneiras”, acrescentou, “mas acho que isso levará as pessoas a reconsiderar seus planos de aposentadoria”.
Mintzer, que escreveu extensivamente sobre como os casais se aproximam da aposentadoria, já está ouvindo conversas sobre esses assuntos entre os casais que aconselha. “Ainda é cedo, em termos da nova realidade que está se instalando”, disse ela, “mas estou vendo que é uma coisa que está se infiltrando agora”.
Fonte: The New York Times e Estadão (12/07/2020)
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