Os efeitos econômicos da pandemia serão usados para reforçar os argumentos do ministro da Economia, Paulo Guedes, a favor da criação de um imposto sobre transações. Essa é, nas discussões da área econômica, a principal opção para bancar o combate aos dois maiores problemas gerados pela crise: desemprego e aumento da pobreza. As receitas do tributo serviriam para financiar a desoneração da folha e reforçar o Renda Brasil, programa de assistência social que deverá substituir o auxílio emergencial.
O novo tributo não deverá ser sugerido ao Legislativo de imediato. O governo pretende apresentar primeiro sua sugestão para a reforma do PIS-Cofins. Na tarde de ontem, o texto estava prestes a ser enviado pelo Ministério da Economia para o Palácio do Planalto, antes de seguir para o Congresso.
Será a primeira etapa da reforma tributária a ser proposta pelo governo federal. Outras “fatias” que seguirão posteriormente envolvem mudanças no Imposto de Renda e no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Alterações no IR entram em vigor no ano seguinte à sua aprovação.
O imposto sobre transações só seguirá após um debate que o Ministério da Economia pretende abrir com a sociedade para determinar se vale a pena criar o novo tributo e qual seu tamanho, em termos de base tributada e alíquota. Quanto maior a receita a ser gerada com ele, mais ampla poderá ser a desoneração da folha.
Fonte que participa das discussões avaliou que o presidente Jair Bolsonaro não deverá interditar esse debate. Argumenta que o presidente é contra criar um imposto novo, mas admite substituição. E esse seria o plano para a desoneração da folha. Essa lógica não foi capaz de poupar o emprego do ex-secretário da Receita Marcos Cintra. Mas a pandemia muda todo o cenário.
A desoneração da folha pode aumentar as chances de aprovação da reforma do PIS-Cofins, avalia a fonte. Essa mudança é discutida há anos pelos técnicos, mas não avançou até hoje porque eleva fortemente a carga sobre o setor de serviços, maior empregador do país. A redução das contribuições sobre a folha pode ajudar a reduzir resistências das empresas do setor.
Em relação ao PIS-Cofins, a ideia do governo é unificar os dois tributos, formando a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). A sistemática de apuração passará ao sistema não-cumulativo. O cálculo dos créditos será feito pelo critério financeiro, e não mais o físico como é hoje. Pretende também que seja aplicada uma alíquota única, na casa dos 11%.
O governo busca fontes de financiamento para bancar um programa amplo de formalização no pós-pandemia, cujas linhas gerais foram apresentadas por Guedes em entrevista à rádio Jovem Pan, na quarta-feira. Estão em pauta ideias como a criação de um Imposto de Renda negativo e capitalização da Previdência.
Segundo Guedes, o Renda Brasil deve substituir o auxílio emergencial, com cerca de R$ 300 de benefício. Para a faixa de renda imediatamente acima está em formulação a carteira verde-amarela, na qual prestadores de serviço serão pagos por hora trabalhada. Essas pessoas poderão receber complementação, ou Imposto de Renda negativo, até valor próximo de R$ 1 mil.
Guedes informou ainda que pretende desonerar de tributos o primeiro salário mínimo.
A discussão do tributo sobre transações recebeu ontem apoio do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Ele defendeu, sem se aprofundar, que é importante discutir novas formas de tributação diante de uma economia cada dia mais “digitalizada”, durante seminário no Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) sobre federalismo fiscal.
A pandemia deixou evidente que há concentração de recursos na esfera federal, embora responsabilidades de Estados e municípios sejam crescentes, disse o presidente do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados (Comsefaz), Rafael Fonteles. Para ele, se o quadro não for alterado, os entes subnacionais estarão permanentemente com problemas financeiros a serem resolvidos pelo Congresso, governo ou Justiça.
Fonte: Valor (17/07/2020)
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