Operadoras regionais estudam recurso ao Cade; opiniões divergem sobre efeitos do negócio
O Acordo em Controle de Concentrações (ACC) assinado entre Telefônica (dona da Vivo), TIM e Claro para comprar e dividir a Oi Móvel ainda parece ser um ‘prato indigesto’ para rivais de menor porte, fornecedores e parceiros de infraestrutura e tecnologia. E isso enquanto começa a contagem regressiva para o juiz Fernando Viana, da 7ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, decidir se aprova a saída da Oi da recuperação judicial, até o fim deste mês.
As operadoras regionais estudam a apresentação de um recurso ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) nesta semana, enquanto outras tentam obter novo julgamento e condição favorável para competir sob regras da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). As opiniões divergem sobre o futuro da competição em telecomunicações no país.
Se equipamentos físicos, como estações radiobase (ERBs), e frequência são os principais motivos de disputa pelos concorrentes regionais, a carteira com mais de 40 milhões de clientes é o foco de entidades de defesa dos consumidores - Procon-SP e Idec.
Prazos para recursos vão se encerrando, bem como a data para a operadora sair da recuperação judicial
O Procon exigiu explicações do trio de operadoras que comprou o ativo móvel da Oi. Já recebeu as respostas e as está analisando desde o dia 17 de fevereiro, conforme informou ao Valor. O órgão pediu informações sobre as implicações práticas para o consumidor; se haverá alteração nos canais de atendimento; como será o procedimento em relação aos clientes que não quiserem migrar nesse pacote e pedirem portabilidade, entre outras questões.
O Idec, como terceira parte interessada no processo que tramita do Cade, informou ao Valor que não pretende entrar com recurso em relação ao ACC publicado no dia 21. O objetivo agora é acompanhar as medidas adotadas para o período de transição dos clientes da Oi para Telefônica, TIM e Claro, e o impacto das decisões ao consumidor.
Até chegar ao acordo, o Idec fez estudos e questionamentos. Concluiu que a redução de rivalidade por si só já chama a atenção devido à menor competição por preços. Pesquisa que o órgão realizou no último semestre mostrou que os preços da Oi são até cinco vezes mais baixos que os das outras operadoras. Daí a preocupação com esses milhões de usuários.
Mais de 15% da receita de serviços líquidos da TIM virá de clientes migrados da Oi em 2024, previu o diretor-presidente da subsidiária da Telecom Italia, Alberto Griselli, ao apresentar o balanço de 2021 na semana passada. Em dois anos, a alta no lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) deve ser superior a 20% na tele, decorrente da adição desses usuários.
De acordo com a TIM, o fechamento da operação de venda da Oi Móvel com o trio de teles é esperado para antes de maio, com a migração da rede 30 dias depois e os sistemas de tecnologia da informação no segundo semestre. A migração de clientes (14,5 milhões, segundo fonte) para a base da TIM ocorrerá “em ondas”.
A migração total é estimada para 12 meses após o fechamento da transação. O diretor-presidente da Telefônica, Christian Gebara, disse, no dia 23 de fevereiro, que inicialmente os clientes migrados (10,5 milhões, no caso da Vivo) continuarão a ser tarifados pela Oi. As expectativas na TIM e Vivo são de reter esses usuários com qualidade de rede, 5G e serviços digitais.
Entre o conjunto de empresas que orbita em torno das três grandes teles, os sentimentos são díspares. Há desde os players que temem o estrangulamento de grande parte dos 10 mil provedores de fibra óptica até os mais otimistas, que acham isso um exagero e consideram que suas áreas de atuação serão preservadas.
Para fonte ligada a uma operadora de pequeno porte, as grandes teles não têm condição de competir com os provedores locais de fibra, “que são muito mais ágeis”. Além disso, considera que será muito difícil essas rivais arrancarem dos domicílios a fibra instalada pelo provedor, a não ser que ofereçam proposta muito melhor.
“Todo mundo tem medo das três [Telefônica, TIM e Claro], que estão capitalizadas. Mas elas terão que brigar pelo cliente. Todo mundo depende de todo mundo, é um mercado complexo”, disse a fonte, referindo-se às relações de cooperação e competição entre as empresas. “Em fibra, não vejo estratégia de as teles sufocarem os provedores. Elas têm tanto dinheiro, que se alguém incomodar, elas vão lá e compram, como a Telefônica fez com a GVT.”
Em serviços móveis, o Cade impôs a obrigação de as teles fazerem contratos com quem quiser operar como operadora móvel de rede virtual (MVNO, na sigla em inglês). Nesse caso, o provedor tanto depende do dono da rede quanto compete com ele. É uma relação delicada. Por isso, segundo a fonte, é importante ter “o dedo do regulador”.
Guilherme Ribas, sócio na área de direito da concorrência de TozziniFreire Advogados, opina que não deverá haver grandes mudanças no processo no Cade, talvez alguns ajustes e esclarecimentos. Além disso, considera inviável que seja exigida a venda de ativos antes do fechamento do negócio, quando as compradoras tomam posse. Como exemplo, cita as ERBs. “[As teles] teriam que ver as condições das ERBs para estabelecer preço, ver onde estão localizadas e as que são viáveis.”
Gebara, da Telefônica, disse também que aguarda a transferência dos ativos, após o fechamento da operação, para analisá-los. “No momento, não temos ciência do tipo de equipamentos que vamos encontrar, nem qualidade, nem estado.”
Segundo dados da Anatel, compilados pela consultoria Teleco, a Oi possui 14.320 ERBs com tecnologia 2G; 10.511 (3G) e 11.166 (4G). Mas cada ERB pode estar habilitada para mais de uma tecnologia, o que faz com que o número de estações por tecnologia (35.997) seja maior que o total de equipamentos.
Segundo a Anatel, há 18.713 ERBs da Oi licenciadas. Mas na venda da Oi Móvel, fonte ligada ao processo disse que o trio vai receber 14.900 unidades. Outras fontes opinam que grande quantidade dessas ERBs não vai interessar às teles, por serem antigas, e que as empresas iriam se desfazer delas de qualquer jeito. Para essas fontes, as ERBs 4G da Oi são boas, mas estão na frequência de 1.800 megahertz (MHz), que nenhum dos novos operadores possui.
Telefônica e TIM, por exemplo, já compartilham espectro de 2G, utilizando uma só rede para as duas companhias prestarem serviço com essa tecnologia. O CEO da Telefônica prevê o desligamento de sua rede 2G em poucos anos.
Sobre a obrigação de Telefônica e TIM venderem, individualmente, 50% das estações recebidas da Oi, e a Claro, 40%, o que se tem questionado é quem seriam os potenciais compradores. Se forem as operadoras entrantes, a questão é o que elas fariam com esses equipamentos sem ter frequência associada para usá-los. No leilão de 5G, essas competidoras compraram frequência de 5G, que a Oi não possui.
“Quem vai comprar essas ERBs vai ter que alugar espectro das teles”, destaca uma fonte, ao lembrar que em seu voto no julgamento do Cade, a conselheira Lenisa Prado defendia a venda de parte das frequências, o que no fim foi convertido como obrigação de aluguel no ACC assinado.
Para essa fonte, o trio de teles está agindo com rigor para que os “remédios” (medidas condicionantes para mitigar os efeitos do ato de concentração) impostos pelo Cade não sejam muito amargos, porque há cinco anos essas empresas se “distraíram”, permitindo o avanço dos provedores regionais que agora dominam quase 50% da banda larga por fibra no país.
Fonte: Valor (02/03/2022)
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