segunda-feira, 3 de julho de 2023

Planos de Saúde para Idosos: Operadoras focadas em pessoas idosas mostram que é possível ser sustentável em meio à crise nos planos de saúde

 


Planos de saúde para idosos atuam na atenção primária e coordenação do cuidado, além de rede verticalizada e suporte de tecnologias

Futuro da Saúde conversou com 3 operadoras focadas em pessoas idosas.

A estimativa do Brasil de ter a quinta população mais idosa do mundo em 2030 tem feito hospitais e operadoras de saúde se movimentarem para conseguir atuar na saúde preventiva, buscando um envelhecimento mais saudável dos beneficiários. A ideia também é trazer economia e sustentabilidade, já que a atenção primária pode trazer menos custos a longo prazo. Atualmente, 33 milhões de pessoas idosas vivem no país, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

No entanto, se os planos de saúde dependem do mutualismo e do pacto intergeracional para manter as contas em dia, como sobreviverá uma operadora com um grande percentual de pessoas idosas? Em um momento de crise financeira no setor, atuar no atendimento do público que é considerado uma “pedra no sapato” dos planos é um grande desafio.

Mas esse cenário não é só possível como já existe, criando um modelo de assistência que consegue não só atender a população, mas ter uma sinistralidade abaixo do mercado, que em média é de cerca de 90%. Uma rede própria verticalizada, com coordenação do cuidado, atenção primária, gestão contínua da saúde dos pacientes e apoio das tecnologias são apontados como essenciais.

Para Luiz Fernando Figueiredo, administrador hospitalar e de sistemas de saúde pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), e que atuou na criação e implantação de diversos planos de saúde, essas iniciativas são consideradas corajosas:

“É gerenciar um risco que cresce em uma proporção aritmética maior, enquanto outras podem trazer um público jovem. Pensando no longo prazo, é uma questão de todas, você tem uma população que está envelhecendo. Então, as operadoras pegaram essa responsabilidade e irão tratar de uma maneira gerenciada”.

Características de pessoas idosas em planos de saúde

De acordo com dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a média de beneficiários idosos em planos de saúde é de 14,4% da carteira das operadoras de assistência médica. Considerados os maiores utilizadores dos serviços, são preteridos frente às faixas etárias mais jovens, que são vistas como mais rentáveis.

Apesar de a agência estabelecer o reajuste por faixa etária, ou seja, conforme as pessoas vão envelhecendo os planos podem aplicar acréscimos nas mensalidades, isso só pode ser feito até a última faixa, acima de 59 anos. Contudo, o valor total só pode ser seis vezes a mensalidade da primeira faixa, entre 0 e 18 anos, o que gera, de acordo com as operadoras, uma discrepância entre receitas e despesas com a população idosa.

Outro ponto a ser levado em consideração é que os beneficiários idosos comumente estão ligados aos planos individuais e familiares, escassos no setor. Isso se deve a esse público estar fora do mercado de trabalho, não recebendo o plano de saúde como beneficiário de empresas, e também às regras mais rígidas de contratos, que trazem segurança ao consumidor. 

A exceção são os planos de autogestão. As regras da ANS permitem que funcionários aposentados de empresas possam continuar associados à operadora após a aposentadoria, o que faz com que elas tenham uma faixa etária mais elevada predominante em sua carteira. A modalidade possui uma média de 27,2% de beneficiários acima dos 60 anos.

Seja no plano individual, familiar ou de autogestão, a característica do público leva a uma maior permanência. Em média, os beneficiários em geral permanecem em uma mesma operadora por 12 meses, seja por escolha ou por uma mudança da empresa em que trabalha. Já as pessoas mais velhas tendem a permanecer mais tempo. 

“Esse paciente idoso só deixa o plano se vir a falecer, porque não acha no mercado algo parecido. Então, a operadora tem que fazer uma atenção gerenciada, que começa com a medicina preventiva. Na consulta não interessa ao plano apenas a reclamação do paciente, mas a saúde de modo geral, para eventualmente colocar o beneficiário em um grupo de acompanhamento de algo que possa ser um risco lá na frente. É o único modo de fazer essas operadoras para pessoas idosas”, afirma Figueiredo.

Novo concorrente

Encarando de frente os desafios para se consolidar como operadora da população idosa, a MedSênior tem trabalhado um projeto de expansão pelo Brasil. Nascida no Espírito Santo e atuando desde 2010, desembarcou neste ano em São Paulo e quer chegar a 1 milhão de beneficiários em 2030. 

Atualmente a operadora possui 103 mil vidas, com 80% da carteira composta por pessoas idosas, sendo que o restante está na faixa entre 49 e 59 anos. Nos últimos 12 meses, cresceu 25% o número de associados atuando no Distrito Federal, Rio Grande do Sul, Paraná, Rio de Janeiro e Minas Gerais, além dos estados já citados.

“Talvez o nosso grande diferencial e que faz termos um controle mais apropriado dos custos é que conseguimos ter uma inteligência na entrega da assistência. Diminuímos o desperdício da aplicação dos recursos para prover assistência adequada”, defende Thiago Maia, líder de Tecnologia e Operação em Saúde da MedSênior.

A previsão é que tenha um faturamento de R$ 1,3 bilhão em 2023 e haja um investimento de R$ 35 milhões para a construção de novas unidades para a operadora, que já com 23 hospitais e clínicas próprias espalhados pelos estados de atuação. Já a sinistralidade, de acordo com dados da ANS do 1º trimestre deste ano, era de 56%. Maia afirma que houve uma variação desse número, a ser atualizado conforme a agência divulgar os dados do segundo trimestre que está se encerrando, mas que segue muito abaixo da média de mercado, que está em 90%.

Para chegar à meta de 1 milhão de vidas, a MedSênior pretende seguir com o que tem sido feito, já que está mostrando resultados positivos de assistência e economia. O desafio é manter a qualidade conforme o crescimento, mas para Maia é um caminho natural e possível. Com o envelhecimento da população, a tendência é que haja mais procura pelos planos dedicados a pessoas idosas com o passar dos anos:

“O crescimento no número de vidas na operadora é orgânico. Todo novo cliente entra no nosso conceito de cuidado, é confortável absorver. Apesar de a gente ter tido um salto importante no número de vidas nos últimos 5 anos, é um aumento constante, aceleramos continuamente”.

Atuação com os pacientes

A operadora tem focado na atuação de prevenção e acompanhamento dos pacientes, para que eles ganhem em saúde. De acordo com Maia, com as equipes gerenciando o cuidado e realizando consultas e exames necessários, tem se refletido em uma baixa procura dos beneficiários pela utilização dos serviços e, consequentemente, uma economia com procedimentos de altos custos, decorrentes de agravamentos de doenças.

“São pessoas com tendência de ter polifarmácia, polipatologias, graus de complicação acima que uma média da população mais jovem. Não porque elas tenham isso por natureza, mas porque não são assistidas corretamente. Se você tem um paciente com diabetes assistido, adequado e equilibrado, condicionando saúde a ele, vai ter um custo assistencial baixíssimo”, reforça o líder.

Em sua análise, as operadoras em geral veem esse público com receio porque não sabem cuidar adequadamente da promoção à saúde, e sim de tratar doenças. Para isso, é preciso ter estrutura e metodologias embasadas, além de não pensar nos beneficiários apenas com um viés econômico, já que o investimento na saúde da pessoa irá se refletir ao longo dos anos.

O uso da tecnologia e inteligência artificial podem colaborar com o gerenciamento da carteira, análise de risco e comunicação entre os envolvidos. A MedSênior tem uma modelo que estabelece critérios mínimos de cuidado, assim como a clusterização dos pacientes para entender em quais programas de cuidados eles podem ser incluídos. Mas Maia reforça que todo cuidado deve ser individualizado.

Para ele, “quanto mais estruturada for a metodologia e processos de gestão do cuidado, quanto maior for a capacidade de prover ferramentas que apoiem a aplicação e escalem isso na operação, menos depende de ter um recurso verticalizado ou terceirizado. Porque, independentemente, vai ter alcance e entregar da mesma forma. Talvez o sucesso não esteja na ponta da assistência, mas na gestão”.

Healthtech na corrida das operadoras

Chegando no mercado de operadoras em 2020, a Leve Saúde observou o setor e viu que a Prevent Senior dominava o público acima dos 60 anos em São Paulo, enquanto a MedSênior prevalecia no Espírito Santo. Por isso, os fundadores escolheram o Rio de Janeiro para ser a praça de atuação da healthtech, que já conta com 30 mil beneficiários. 

Fundada por Claudio Borges, CMO e diretor comercial, e Ulisses Silva, CEO da empresa, a Leve Saúde tem conquistado um público que nunca teve plano de saúde antes, representado por cerca de 70% dos beneficiários. Nos últimos 12 meses mais que dobrou a sua carteira de tamanho, perspectiva que deve se repetir de acordo com as análises dos executivos.

Apesar de focar na população acima dos 45 anos, pensando na prevenção das faixas que serão pessoas idosas em breve, a operadora possui beneficiários de todas as idades. O público idoso representa 43%, e apesar de ser uma taxa menor que os concorrentes, segue acima da média de mercado. A sinistralidade do plano estava estabilizada em 66% no 1º trimestre, mas Claudio e Ulisses afirmam que já possuem uma estratégia para diminuir para a faixa dos 50% até dezembro.

Ulisses defende o uso da tecnologia para trazer ganhos na gestão do cuidado: “Vamos fazer uma integração de prontuário eletrônico e onde o paciente estiver nosso time de dados vai enxergar, e, mais do que isso, ter as informações em todos os lugares de saúde que ele estiver, inclusive no hospital. Isso salva vidas”.

Fugindo um pouco da regra dos planos para pessoas idosas, possuem além das modalidades individual e familiar, produtos para pequenos e médios empreendedores, de 2 a 29 vidas, o que tem colaborado com o crescimento no número de beneficiários. As projeções para 2023 é faturar 230 milhões de reais.

O plano atual da healthtech é fortalecer a imagem no Rio de Janeiro e ser reconhecida como um produto carioca. Não há planos de expansão para outros estados no momento, mas o interior fluminense está no radar da operadora. A perspectiva é que com o avanço da idade da população, invertendo a pirâmide demográfica do país, haverá espaço para todos os players, inclusive novas operadoras de planos de saúde para pessoas idosas.

“Haverá espaços para empresas tradicionais, empresas novas e novas operadoras que poderão vir. A Leve entrou nesse mercado com outras 3 empresas, mas somos a de melhor performance. O mercado para pessoas com mais de 60 anos, pessoas físicas, tem algumas barreiras. Só fica nesse mercado os mais competentes”, avalia Ulisses.

Modelo de sucesso

A experiência de Claudio e Ulisses ao longo da vida, com passagens por Golden Cross, Athena Saúde e Assim Saúde, trouxe bagagem para entender os prós e contras da gestão de planos de saúde, assim como os gaps de negócios que existiam no mercado das operadoras. Do mesmo modo, o que é possível e necessário do ponto de vista assistencial para cuidar dos beneficiários e reduzir a demanda por média e alta complexidade.

“Médico de família, atenção primária de saúde e coordenação do cuidado. O associado no centro e um time multidisciplinar fazendo essa gestão. Para cada duas mil pessoas você tem uma equipe, e a gente buscando com a tecnologia para que esse índice seja melhorado. Essa prevenção que conseguimos dar nos ajuda muito a ter um custo mais controlado”, explica Ulisses.

A Leve Saúde também analisou o comportamento das pessoas idosas para entender de que forma a tecnologia poderia contribuir. Para que haja uma melhor adesão da telemedicina, por exemplo, a operadora inicia o atendimento pelo Whatsapp, considerado o caminho com maior afinidade pela população acima dos 60 anos. A partir daí, o beneficiário é redirecionado a uma plataforma para a consulta.

A operadora atua com rede própria e parceiros credenciados limitados, com modelos de remuneração pré-definidos para o atendimento, o que também colabora com o controle de custos. Pensando na mobilidade e nos riscos da população idosa durante o deslocamento até o pronto-socorro em caso de urgência, oferece serviços à domicílio, como exame e atendimento emergencial, em um plano de saúde que deve ser o carro-chefe da Leve Saúde.

“Alguns planos de saúde faziam isso no passado, o atendimento pré-hospitalar. O beneficiário entra em contato com o pronto-atendimento digital. Se ele não estiver bem, a equipe manda uma ambulância para a casa dele, faz o atendimento médico em casa, e se não resolver leva para o hospital”, destaca Claudio. 

Prevent Senior

Reconhecida como o grande case de sucesso para os planos de saúde, a Prevent Senior se manteve até o início da pandemia como um dos principais nomes do setor. Tendo como foco a população idosa do país, conseguiu não só chegar a mais de 550 mil beneficiários, mas ter uma receita de R$ 4,3 bilhões em 2020. Em 2021, apesar do faturamento de R$ 5,1 bilhões, fechou o ano com um prejuízo de 70 milhões de reais. Entretanto, entre as três operadoras para pessoas mais velhas, é a que está com a maior sinistralidade, cerca de 75% de acordo com dados da ANS do 1º trimestre do ano, número ainda abaixo da média do mercado.

“A Prevent mostrou que tem espaço para outras operadoras focadas em pessoas idosas, mas mostrou que não adianta assumir esse público com livre escolha. Tem que trabalhar com rede hierarquizada, diretrizes técnicas, padronização de materiais e qualificação de profissionais. Ela mostrou que esse caminho tem resultados, mas ao mesmo tempo que você vê o rol exemplificativo e a judicialização, tem outros desafios pela frente”, analisa Luiz Fernando Figueiredo, do HC-FMUSP.

Criada em 1997, era vista como um plano dedicado às pessoas com mais de 60 anos e que tinha um atendimento diferenciado, sendo considerado o principal player para esse público. Contudo, as polêmicas recentes durante a pandemia de Covid-19 parecem ter freado o crescimento. Dados da ANS apontam que entre maio de 2022 e abril de 2023 a Prevent aumentou pouco mais de 1% no número de beneficiários.

Com ampla atuação em São Paulo, a Prevent se consagrou com um modelo assistencial atuando na saúde preventiva, construindo uma grande rede própria para o atendimento dos beneficiários. São mais de 45 unidades, tendo destaque os 10 hospitais na capital paulista, além de ter começado a construir uma rede no Rio de Janeiro.

Por muito tempo foi considerada a única opção para as pessoas idosas, mas com o surgimento de novas operadoras dedicadas a esse público e as questões ao longo da pandemia, passa a ter concorrentes que prometem mexer com o mercado. Procurada, a assessoria de imprensa da Prevent Senior informou que a operadora de planos de saúde não tem fornecido entrevistas por questões estratégicas.

Fonte: Futuro da Saúde (29/06/2023)

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